~*SENHOR DAS DESCONFIANÇAS*~ cap. XLIV
Ainda naquela noite de Sexta-feira, antes de se deitar para dormir, Ruan tomou um banho e vestiu seu pijama; já sentado na beira da cama, ele pegou uma jarra com água que estava encima do criado-mudo e encheu o copo, bocejando prolongadamente antes de beber da água. Mas quando foi pegar o copo, Ruan vacilou e ele acabou virando e derramando a água sobre o móvel e o que havia encima, inclusive a fotografia da Sra. Eloise.
- Ops... - disse Ruan, levantando rapidamente o copo e pegando a fotografia.
Mas ele descobriu algo muito intrigante com aquele pequeno acidente, algo que o deixou estupefato! A água quando molhou o verso da fotografia fez se acender palavras ocultas, como uma mágica! E dizia: "na parede, dois diamantes cheios de mistério." Para Ruan, podia ser um enígma. E de repente lhe veio na memória a cena do Sr. Arantes molhando as fotografias na água de uma vasilha... Seria uma grande coincidência ele ter descoberto isso agora? Então, silenciosamente Ruan saiu do quarto e foi até a sala em que ficava o cofre secreto do Sr. Arantes; entrou e encostou a porta, retirou o quadro da parede e alongou os dedos para começar a tentar descobrir a senha do cofre. Usou o mesmo copo que se serviu da água e que levou com ele para encostá-lo na porta do cofre e grudar o ouvido nele, com o propósito de conseguir saber se estava próximo de destravar a tranca. Girou a fechadura para um lado, depois para o outro, uma volta de 90°, mais uns segundos e conseguiu abrir o cofre! Pegou as fotografias dentro dele e olhou em volta da sala, notando um ramo de flores dentro de um jarro de vidro com água, sobre uma mesinha; retirou as flores do jarro e começou a mergulhar as fotografias na água, descobrindo o inacreditável: cada uma delas tinha uma mensagem oculta no verso.
E chegou o Sábado, manhã fria mas sem sinal de chuva e ainda faltando quinze minutos para as 5:00h da manhã, Ruan já estava de pé, ou melhor, sentado no sofá do grande salão; nem mesmo o mordomo já se encontrava ali. Ruan tinha a fotografia da Sra. Eloise com o músico nas mãos e seus olhos estavam fixos nela, todavia seus pensamentos iam longe, meditando acerca do enígma no verso da fotografia.
- "Na parede, dois diamantes cheios de mistério" - ele relia a frase e refletia.
O que poderia ser? A que se referia a frase? Ruan tirou os olhos da fotografia e passeou-os pelas paredes do salão, começando pela parede da porta de entrada; procurava qualquer coisa que pudesse se encaixar naquele enígma. Mirou nas belíssimas cortinas douradas, nas pilastas e nas decorações... Passou para a parede lateral, mirou na escultura de um anjo de bronze, que poderia estar acima de todas as suspeitas, mas não, não era o anjo... Ora, quando Ruan subiu um pouco mais o olhar e mirou naquele grande quadro com uma pintura turva e esboçada de uma desconhecida mulher e observou seus olhos, então levantou-se imediatamente.
- É isso! - ele disse e caminhou até o quadro.
Chegando de frente ao quadro, Ruan puxou uma poltrona do lado e retirou os sapatos para subí-la e assim poder alcançar o quadro. Feito isso, Ruan observou mais em profundo os olhos daquela mulher na pintura, com muita cautela retirou o quadro da parede, desceu da poltrona e colocou-o sobre o piso; conseguiu retirar a tela de vidro e logo notou que deveras havia coisa incomum naqueles olhos! Era como uma janelinha camuflada que, pressionando o dedo, Ruan conseguiu deslocar e descobriu que por trás daquela peça tinha um pequenino papel enrolado com uma fita.
- Sempre achei esse olhar misterioso - falou Ruan, retirando o papel do interior do quadro e recolocando a peça dos olhos e a tela de vidro, para por fim pregá-lo de volta na parede. Após isso, Ruan voltou para o sofá e com o pequeno papel em mãos, desamarrou a fita e o abriu, se surpreendendo com o que tinha escrito.
~*~
Era no período da tarde daquele Sábado que o detetive Ruan Gaspar e Thalia iriam até a casa da Sra. Eloise, como haviam combinado. Juntos eles procuraram o xofer na frente da mansão.
- Bom dia, Hudson - Thalia saudou o xofer.
- Bom dia, senhorita Thalia - ele disse.
- Pode nos levar à casa de minha avó Eloise? - ela fez referência a ela e a Ruan ao seu lado.
Mas Hudson fitou Thalia estupefato, imaginando como ela se corrigiria agora, ou como voltaria atrás para não ter dito aquelas palavras; também achou esquisita a forma como Thalia foi tão pacífica ao falar.
- Não precisa me olhar assim - disse Thalia e jogou um olhar para Ruan -, ele já sabe de tudo.
- Sabe? - indagou o xofer, com o cenho assustado.
- Sei - respondeu Ruan, tomando a vez de Thalia e batendo no ombro do xofer, ao passo que sorria maliciosamente e lhe apontava o dedo - E você escondendo de mim, não era?
- Perdão, detetive... - encolheu os ombros com vergonha.
- Tudo bem, sei que foi por uma boa causa. Agora, podemos ir?
O xofer consentiu e abriu a porta do carro para eles. E dentro do automóvel eles conversavam a respeito da Sra. Eloise e de como Ruan descobrira sobre ela, enquanto faziam um longo trajeto.
- E você, o que realmente sente por ela? - Ruan perguntou ao xofer, referindo-se à Sra. Eloise - Ficou tão encantado quando a mostrei na foto...
- Não sou apaixonado por ela, não é isso - o xofer dizia, sacudindo a cabeça de um lado ao outro e atento aos caminhos - Só a acho uma mulher muito encantadora.
- Sei - Ruan fitou-o com descrença e resolveu não levar adiante aquele assunto, para não acabarem se desentendendo, como aconteceu com ele e o Sr. Henrique Sanches.
Eles chegaram numa área mais isolada da cidade, onde haviam poucas casas e muitas árvores e de frente para a pista havia uma casa simples, mas boa para se viver. Era ali que a Sra. Eloise morava. O xofer ficou encostado no carro, enquanto Ruan e Thalia foram até a casa. Ao subir dois degraus, Thalia bateu na porta, pois não havia campainha.
- Quem é? - uma voz feminina perguntou lá de dentro.
- Sou eu, vó Eloise, Thalia - respondeu Thalia, aproximando o rosto à porta.
- Entre, minha querida!
Mas antes de entrar, Thalia olhou para Ruan ao lado seu e fez um sinal para ele aguardar um momento ali, pois ela entraria primeiro. Então Thalia entrou, deixando a porta entreaberta e Ruan manteu-se do lado de fora.
- Minha linda neta, por que demorou a vir? - perguntou a Sra. Eloise, que antes estava remexendo numa caixa com objetos e papéis, mas se acercou de Thalia para abraçá-la. Apesar da avançada idade, Eloise preservava uma boa aparência, os cabelos já estavam embranquecidos, curtos na medida da nuca, mas a pele estava bem cuidada e as roupas que vestia a deixava muito elegante.
- Eu... Não tive muito tempo.
- Encoste a porta e se sente aqui - mostrou o sofá, no qual se adiantou em sentar-se.
- É que... Eu não vim sozinha, vovó.
- Claro que não! Você veio com o xofer Hudson - disse, guardando alguns objetos encima do sofá de volta na caixa.
- Além do xofer, eu vim com outra pessoa - Thalia se mostrou hesitante ao falar.
- Quem?
Thalia virou o rosto e mirou na porta, por onde Ruan entrou e se aproximou delas. A Sra. Eloise não se espantou, porquanto não fazia ideia de quem fosse aquele homem, num instante pensou até que fosse namorado de Thalia, no entanto, teve um pouco de receio.
- Então a senhora que é a avó de Thalia? - perguntou Ruan, muito aprazerado em conhecê-la.
- Quem é você? - Eloise indagou com o cenho franzindo, ignorando a pergunta de Ruan.
- Perdão... Prazer, detetive Ruan Gaspar - ele estendeu a mão para cumprimentá-la, todavia não foi correspondido.
- O-oquê?
~*Continua...