~*SENHOR DAS DESCONFIANÇAS*~ cap XXXVI

- Lembra da sua conversa com o xofer na cozinha, numa certa noite, que eu acabei ouvindo? - perguntou Ruan, permanecendo de pé, como Thalia - E que eu perguntei a que se referiam e cada um contou uma versão diferente?

- O que tem? - Thalia questionou, retraindo os ombros.

- Naquela exata noite, minutos atrás, sua mãe diz ter visto uma fantasma de sua avó, a senhora Eloise, na janela do quarto e conta que ele vestia um vestido comprido e branco - Ruan pegou dentro de uma caixinha perto da luminária o pedaço de tecido branco que tinha guardado e mostrou-o - Esse tecido lhe é semelhante?

- Eu não sei de onde veio isso - disse ela, com os músculos tensos.

- É claro que você sabe! É só forçar um pouco mais a memória e se lembrará de que esteve analisando esse tecido em seu quarto e quando entrei, você o guardou depressa. Mas eu o reconheceria em qualquer lugar e roupa.

- Me desculpe, mas você deve estar enganado. Além do mais, para que eu usaria um tecido tão... - tocou no tecido na mão de Ruan e dobrou as sobrancelhas - Tão ruim como esse?

- Não sei... Quem sabe para fazer uma fantasia de fantasma! - ele exclamou, jogando um olhar agressivo à moça e notando como tinha conseguido intimidá-la; mudou a posição dos braços, elevando a mão até o queixo e mirando no alto da parede - Pois é, e digo isso porque coincidentemente, ao procurar na varanda do quarto por alguma pista desse tal "fantasma", encontro esse tecido preso entre as grades de segurança e imediatamente o reconheco de seu quarto. Para ter deixado um pedaço de seu vestido na varanda, esse "fantasma" só podia estar bem vivo, não? Então pensei: "se antes vi Thalia com o tecido e depois o encontrei na varanda... Então ela deve ter algo a ver com o fantasma! Mas, acho que ela não teria motivos tão significantes para cometer tal brincadeira com a própria mãe... Todavia, talvez tivesse feito a fantasia para outra pessoa que tivesse sim um bom motivo para assustá-la. Porém, sua mãe deixou bem claro que o fantasma era da senhora Eloise e essa é falecida; então como poderia assustá-la?

Ruan começou a andar de um lado para o outro, sem tirar a mão do queixo e com o rosto mirando no chão; nesse meio tempo Thalia já havia se sentado novamente e só ouvia-o, em sigilo.

- A não ser que... Não, isso não - Ruan deu uma minúscula risada e seu olhar se perdeu no vão da sala - A não ser que... Ela estivesse...

- Viva - disse Thalia, num tom firme, conseguindo chamar a exclusiva atenção do detetive - Ela está viva.

- Era o que eu imaginava - falou Ruan, sem maquiar a surpresa que teve com a confirmação de suas suspeitas.

- Ela sobreviveu ao acidente de bote, mas perdeu a memória, deve ter batido a cabeça em alguma pedra - contava Thalia, ao passo que Ruan ocupava a cadeira e lhe prestava total atenção - Ela me disse que quando despertou estava na cabana de um velho pescador e ele ajudou-a com os ferimentos. Depois de um tempo, ela voltou aqui para São Paulo e procurou uma casa para morar, no outro lado da cidade, e está lá até hoje.

- E como você a encontrou? - perguntou Ruan, atento à face de Thalia, com demasiado interesse e quase sem piscar os olhos.

- Num dia em que eu saí para comprar alguns materiais, tive a impressão de ter visto minha avó saindo de uma loja. Pensei estar louca - Thalia meneou a cabeça de um lado a outro ao falar -, mas era tão parecida com ela! Até que resolvi me aproximar... Ela até quis fugir, mas não deixei e tive a certeza e ela confirmou: era minha avó Eloise. Então ela ensinou ao xofer onde ficava a casa em que estava morando...

- Então o xofer também sabe? - ele a interrompeu, fitando-a como quem não estava nada surpreso.

- Sim, teve que saber para poder me levar todas essas vezes até a casa da vó Eloise - disse ela, encolhendo os ombros - É isso mesmo, todas as vezes que eu disse que ia visitar minha tia Madalena, na verdade eu ia para a casa de minha avó. Suponho que você deva ter desconfiado da forma que minha tia me recebeu naquela visita à sua casa.

- Certamente. E também da mensagem dela que ouvi na sua secretária eletrô... - Ruan calou-se apressadamente ao reconhecer que devia ter mantido sigilo sobre aquele fato.

- Você... Você entrou no meu quarto? - ralhou Thalia.

- Anh... Isso não tem mais importância. Agora me diga: E por que sua avó foi para outro lugar? Você não contou que ela tinha um filho morando aqui? - Ruan franziu a testa ao indagar e melhorou a postura na cadeira.

- Contei, mas ela não conseguia lembrar-se de nada e ninguém! E por isso não aceitou quando eu pedi para ela vir morar com a gente. Nem sei se ela lembra de mim, ou só sabe que sou sua neta porque eu lhe disse - Thalia deixou o olhar cair sobre o ombro e inspirou um tanto de ar para soltar bem devagar - Então ela me deu a ideia de eu lhe levar alguns de seus antigos pertences para quem sabe assim ela lembrar de algo...

- Então... Foi você quem sumiu com as coisas dela? - a frase soou mais como uma afirmação do que uma interrogação.

- Sim - ela consentiu, um tanto receosa, sem saber como o detetive reagiria ao confirmar, contudo ele não se exaltou, mas continuou ouvindo-a - Levei suas jóias, depois o diário... E então ela me pediu as fotografias, todas as fotografias que estavam no baú dela e eu fui pegando-as do quarto de meus pais. Porém, quando meu pai sentiu falta das fotos, tirou o restante do baú e não consegui achá-las mais... Acho que ele as escondeu.

- Foi por isso que ficou tão interessada na fotografia que te mostrei?

- Ah... Aquela fotografia... O caso foi que certo dia minha avó me perguntou se ela tinha um amor e eu lhe contei de meu avó Wagner, que está no exterior - explicava Thalia - Então ela quis muito saber como ele era e me implorou para achar uma fotografia dele! Mas não encontrei nenhuma. Até que te vi com aquela foto e tive que pegá-la.

- Então mandou sua irmã escondida ao meu escritório - riu Ruan, a menear com negatividade a cabeça.

- Sim - afirmou, desconsertada - E no dia em que fomos à casa de minha tia Madalena, eu na verdade deveria ter ido ver minha avó, para entregar-lhe a fotografia.

- E quanto ao fantasma? - perguntou Ruan, com os cotovelos encima da mesa e as mãos entrelaçadas - Você também tem algo a ver com isso, não é?

- Aquela conversa entre mim e Hudson que você ouviu - dizia Thalia, depois de um prolongado suspiro -, na verdade dizia respeito ao fantasma. Foi tudo ideia de minha avó; ela me disse que ao ler seu velho diário, soube das coisas que mnha mãe a fez por ódio e me pediu para lhe fazer uma fantasia de fantasma para assustar minha mãe como vingança. Nem eu, nem Hudson achamos uma boa ideia! Mas ela insistiu e tivemos que concordar. Então Hudson a ajudou a vir até a mansão, no período da noite e esperou meu sinal; minha mãe já tinha ido dormir, mas meu pai ainda estava na sala conversando com você, todavia me disse que demoraria a ir se deitar, no que achei que era o momento certo para pôr o plano em ação e Hudson pôs a escada para minha avó subir na varanda do quarto de meus pais.

- Eu sabia... Foi o xofer quem pegou a escada - ele mostrou um sorriso orgulhoso no lado dos lábios, ao recordar do dia em que o jardineiro encontrou a escada nos fundos da mansão.

- E enquanto minha mãe gritava na cama assustada, vó Eloise saiu depressa da mansão. E isso é tudo.

~*Continua...

Lyta Santos
Enviado por Lyta Santos em 04/10/2016
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