~*SENHOR DAS DESCONFIANÇAS*~ cap. XXX

Não houveram mais palavras trocadas entre o mordomo e Beatriz dentro daquela sala, ora Ruan, que permanecia do lado de fora com o ouvido grudado na porta, esperando só descobrir se porventura haviam descoberto o cofre, começou a estranhar os gemidos e sussurros que vinham lá de dentro, até que resolveu abrir suavemente a porta, de modo que pudesse espiar apenas por uma brecha. Não acreditou no que viu... A Sra. Beatriz encostada na parede e o mordomo a enchendo de beijos.

- Então é isso? - disse Ruan, atônito, e fechou cuidadosamente a porta.

Ele deu dois passos para o lado, mas não percebeu a pilasta de gesso ali e na volta que deu com o corpo só viu aquele rápido movimento do jarro de flores que havia encima escapando da pilasta! Ele rapidamente estendeu os braços para conseguir evitar o acidente, mas vacilou; quando viu o jarro já tinha batido no chão e o barulho foi inevitável.

- Ai, meu Deus! - a voz de Beatriz soou temorosa do interior da sala, com toda certeza em razão do susto que levara com o barulho.

Ruan não teve mais o que fazer, correu para se esconder na sala dos monitores bem ao lado e pela brecha da porta ficou observando o que se passava lá fora. Alguns instantes e ele viu Beatriz sair da sala muito tensa e reparar no jarro quebrado no chão; de repente alguém passou pela sala dos monitores e Ruan ligeiramente fechou a porta, ficou segurando firme a maçaneta, até perceber que os passos se distanciavam. Então reabriu devagarinho a porta e viu o Sr. Carlos Arantes junto à esposa lá na frente.

- O que aconteceu aqui, Beatriz? - ele perguntava, com o olhar dividido entre o jarro despedaçado no chão e Beatriz.

- É que... - Beatriz parecia demasiada desconsertada ao tentar explicar e seu rosto se transformava com fúria - Eu esbarrei na droga desse vaso quando voltava da cozinha.

- E o que foi fazer lá?

- Fui beber um pouco dágua - ela disse mais exaltada, tentando assim não perder a pose de uma mulher fria e sem temor - E daí?

- Hhm... Então vamos voltar para o quarto - Carlos disse girando os ombros e refazendo o caminho do corredor, no que Ruan voltou a fechar a porta para esperar ele passar. Ouviu passos adiantados e depois outros mais inseguros e quando só restou o silêncio, Ruan abriu mais uma vez a porta e quase cometeu mais uma falha, pois o mordomo ainda ia saindo da outra sala e por pouco não notou o detetive.

~*~

A terça-feira chegou como um espetáculo que prometia muitas surpresas e enchia o detetive de ansiedade para saber o que se passaria. Depois do que ele viu na noite anterior, não descansou mais os pensamentos, se dormiu foi por apenas meia hora, pois dedicou maior parte do tempo para raciocinar. Na manhã ele usou da observação; o mordomo, apesar do vergonhoso encontro às escondidas com a Sra. Beatriz no final da noite que passou, preservava a firme postura e os bons modos diante de todos. Ruan se encontrava sentado no sofá com seu indispensável caderno de notas e sua fiel caneta, mirando os movimentos do mordomo ao ir abrir e fechar a porta para alguém, como era seu dever ali diariamente. E para não prejudicá-lo em cumprir seus deveres, Ruan anulou a ideia de ir com ele ao escritório, no entanto continuou no sofá a fazer suas observações.

- Você é casado? - a pergunta de Ruan foi repentina e fez o mordomo cessar no meio da sala quando pretendia se aproximar da escada.

- Perdão, senhor Gaspar - o mordomo disse ao ver que o detetive tinha o rosto direcionado a ele e pressionou o dedo indicador no próprio peito vestido com seu uniforme singular - É a mim que pergunta?

- Sim.

- Mas, por que o perguntas?

- Considere esta uma rápida entrevista - disse Ruan, ao passo que dobrava uma perna sobre a outra - Então?

- Não - respondeu com as mãos unidas nas costas -, nunca me casei.

- Mas já foi apaixonado?

- E quem nunca foi, não é mesmo? - mostrou no canto da boca um sorriso desinibido que Ruan respondeu com uma pequena risada, embora tivesse preferido ignorar.

Depois dessas e mais algumas perguntas com respostas de certo modo menosprezíveis, Thiago ia e depois voltava do porão sem a misteriosa mala que, embora tivesse visto uma única vez e que dissessem que guardava apenas livros,o detetive desconfiava de que carregava algo mais.

À tarde, Ruan estava sentado à escrivaninha, escrevendo tudo o que chegava a pensar sobre os últimos acontecimentos na mansão. Num instante, sua mão pausou sobre a folha rascunhada, deixou cair sobre a mesma a caneta envolvida entre os dedos, era como se perdesse a força do punho. Então uma incontrolável sonolência pesou em seus olhos; não poderia esperar nada mais justo que o sono, uma vez que não tinha descansado bem à noite; devagar, foi deixando o rosto baixar e pôs os braços cruzados encima do móvel, para apoiar a cabeça sobre eles e quiça tirar um rápido cochilo. Sucedeu que Thalia apareceu na porta e num caminhar cauteloso e tão leve quanto a pluma, entrou no escritório de Ruan e obviamente sem nenhuma intenção de acordá-lo, se agachou e de quatro foi se aproximando da escrivaninha, com o rosto caído ao piso. Ao chegar ao lado do móvel, ela levantou discretamente a cabeça e elevou o pescoço para olhar sobre os papéis acima da escrivaninha, no que deu de frente com Ruan a fitá-la com o rosto só um pouco apartado dos braços e um semblante neutro.

- Algum problema, senhorita Thalia? - perguntou Ruan e sua voz calma acusou-o de cansaço.

- É... Bom - gaguejava Thalia, à medida que se colocava rapidamente de pé; evitou olhar diretamente para o detetive e passou a limpar os joelhos para assim poder manter a vista desviada -, é que minha irmã Celina e eu estávamos brincando de pique-esconde e acho que ela se escondeu aqui.

- Ah... - Ruan elevou as sobrancelas para simular que havia acreditado em Thalia e, curvando-se de um jeito que seu peito ficou pressionado contra o móvel e os ombros para frente, ele aproximou o rosto ao dela para murmurar num tom divertido - Então vamos ser cuidadosos em procurá-la... Até porque, essa sala tem muuuitos esconderijos.

- Pensando bem - dizia ela, após revirar os olhos em razão do modo que Ruan se aproveitava da situação para bancar o engraçado -, acho que ela não deve estar por aqui... Com licença.

Thalia girou o corpo para ligeiramente deixar o escritório, no que Ruan rodeou a escrivaninha e tentou obstruí-la, todavia ela se foi em demasiada pressa.

~*Continua...

Lyta Santos
Enviado por Lyta Santos em 24/09/2016
Reeditado em 24/09/2016
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