O Best Seller

Os olhos Pairavam sobre o papel. A angustia em escrever apenas uma linha, o atormentava há dias.

A pilha de bolinhas de papel amassadas no canto da sala só aumentava ainda mais sua angústia, queria escrever, precisava, para ele era vital, no entanto nada vinha.

Os dedos batiam incessantemente na escrivaninha de madeira escura, ecoando pela casa vazia e silenciosa.

Andava até a janela, esgueirando metade do corpo para fora da sacada para tentar ver algum movimento que o alertasse que movesse seu pensamento em alguma direção, no entanto...nada, vazio apenas!

Tomou um café, fumou um cigarro.

Pensou:

Ingrata!

Exclamou para si mesmo: Ingrata!

Gritou da Sacada: INGRATA!

No bairro de Copacabana, não era difícil ter alguém acordado aquela hora.

O vizinho embriagado do apartamento de baixo gritou:

_Cala boca maluco! _ e assim, ele se sentia, entorpecido e ausente de sanidade.

Andava de um lado pro outro, buscando-a , mas não tinha jeito.

Os olhos estavam vermelhos, sinal que não dormia há dias, seu desespero por algumas horas de sono já lhe causavam até tremores, mas as pálpebras abertas o mantinham firmemente acordado.

Tinha cerca de 45 anos, nem era feio, rodava nas calorosas rodas intelectuais, deixara uma vasta barba crescer e moldar-lhe o rosto maduro nos últimos anos, mas esta, começara a esbranquiçar e ele nem havia dado conta disso , dedicando – se há anos ao seu objetivo em tornar-se um Best seller.

Dedicara-se com tanto afinco que não percebera que sua convivência com Lygia parecia fazer parte de um passado longínquo .

As longas conversas olhando o mar, já não faziam parte de suas vidas.

Foi assim, que ele mal percebeu quando ela simplesmente retirou-se, abandonando-o para sempre, indo morar no outro apartamento do casal que ficava há poucas quadras.

Ela simplesmente se foi. Suave como a brisa.

Arrumou as malas e partiu.

Não disse Adeus. Não o Insultou.

Não teve Pena. Não teve raiva. Não teve nada.

Em seu pensamento tumultuado, acharia melhor que ela o tivesse xingado, seria sinal que lhe restara o ódio.Ela poderia ter chorado, seria sinal que lhe restara pena, ou ter batido a porta com força , isso poderia significar algum remorso ou que estivesse dizendo: _ Hey, eu estou partindo, tome uma atitude! Mas não, ela não olhou para trás, não marejou os olhos , não bateu a porta para não atrapalhar seu momento de escrita , ela simplesmente deslizou porta a fora, quase evaporando silenciosamente.

E desde então, nenhuma frase, nenhuma linha fazia sentido, nada que escrevesse lhe causava paixão, ou dor, ou alegria...nada.

Tomou uma decisão.

Iria procurá-la .

Ela precisava devolver o que ela lhe tirou e levou sem dó nem piedade.

Ela estava há poucas quadras dali, a hora não seria um problema.

Caminhou em direção a rua Santa Clara, atravessando as esquinas inundadas do mar de gente que habitavam as noites da zona Sul Carioca: Prostitutas, pedintes, Mendigos , Infelizes, Depressivos, bêbados, Boemios, trombadinhas, marginais, cafetões, viciados, cães.

O Porteiro do prédio o deixou entrar sem problemas, ele morara ali quando solteiro, conhecia todos os macetes do prédio.

Ele já devia ter tomado esta atitude antes, era o amor que clamava em seu peito.

Entrou as 3:25 no apartamento.

Ás 4 h m cruzava a Santa Clara de Volta a Nossa senhora de Copacabana , sorridente.

Andava apressadamente, tinha fome de papel, de versos, de palavras.

Sentou em sua escrivaninha e os dedos não paravam, a cada linha uma nova mensagem, uma idéia.

A historia formava-se claramente, parecia em transe.

Em sua mente o romance. Em cada toque de Preto no branco a folha branca ganhava vida, digitava rápido demais, tinha pressa, as pontas dos dedos já queimavam como os olhos.

Parecia um turbilhão de pensamentos APRISIONADOS desde o dia do abandono de Lygia.

Cada nova folha era um novo capitulo.

Após 16 horas o novo romance estava terminado.

Há algumas quadras, o corpo de Lygia fora encontrado, brutalmente assassinado e era óbvio quem fora seu assassino.

As 22:25 exatamente a polícia invadiu seu apartamento, encontrou-o adormecido junto a velha máquina de escrever.

Levou-o algemado, sorridente, sem nenhuma resistência.

Ao delegado ele disse:

_ Não preciso de Liberdade, só preciso de inspiração.

Na máquina de escrever, a folha de rosto reluzia com o título em Negrito

“Inspiração, àquela que não se pode deixar levar!

Nas primeiras linhas o delegado leu sua trágica confissão, na história de um homem que sem inspiração, a busca cometendo um crime e descreve em seu livro os detalhes sórdidos.

Preso, sem visitas, abandonado como um cão de rua. Isolado da sociedade.

Acende um cigarro, observando a fina fumaça que se dissipa no ar, enquanto lê no jornal diário, a notícia do seu romance ter sido o mais lido do ano.

Encontrado enforcado com um garrote de lençol em sua Cela no dia seguinte, lia-se em suas paredes:

Inspire-se! Para quem sabe ler um pingo passa a ser letra e um crime, passa a ser castigo!