NA MESA DO CANTO ESQUERDO

Natan chegou ao trabalho depois enfrentar uma enorme fila por causa da greve dos motoristas e cobradores de ônibus da cidade de Cruz das Almas. Estava atrasado e precisou justificar para somente assim bater o ponto. Foi ao vestiário, trocou a roupa pelo uniforme de trabalho e calçou as botas, pegou as luvas, os óculos de segurança, o fone de ouvido e o capacete. Desceu para a linha de produção e tomou o seu lugar. Como sempre, estava quieto, por comportamento próprio e um pouco por exigência de sua função na indústria, pois era um dos operadores de máquinas mais capacitados e por isso mesmo muito exigido em seu trabalho e comportamento laboral na empresa. Trabalhou o restante da manhã, quando deu sua hora de almoço dirigiu-se ao refeitório, serviu seu prato com feijão, massa, carne, salada verde, ovos e pão. Pegou os talheres e sentou-se na mesa do canto esquerdo do salão. Alguns segundos depois chegaram e se juntaram a ele, Mariana e Afonso.Era sempre assim. Cumprimentaram-no e falaram coisas sem importância. Mariana , Afonso e Natan eram apenas colegas de serviço. Isso era o que todos imaginavam. Natan continuou calado. Os colegas se olharam e trocaram de assunto. Natan comeu, recolheu o prato e os talheres e saiu sem dizer nada. Encostou-se num dos bancos estrategicamente colocados sob frondosas árvores e ali ficou. As pessoas passavam e lhe davam oi, ele não respondia. No final da tarde desligou seus equipamentos, foi ao vestiário masculino e trocou de roupa. Bateu o ponto e saiu. Nesse momento Mariana e Afonso já haviam saído e o esperavam do lado de fora. Ninguém sabe afirmar o que houve, apenas que repentinamente Natan abriu a mochila, tirou uma faca e passou a agredir Afonso e Mariana que, atônitos e apavorados se defendiam com os braços. Atingido no ventre, Afonso caiu encharcado de sangue, Mariana tentou fugir, mas o assassino a atingiu com forte golpe forte, a moça caiu e ele, o assassino lhe desferiu vários golpes no rosto, gerando cicatrizes profundas. Alguém finalmente reagiu àquilo e com um pedaço de madeira atingiu o agressor duas vezes. Chegaram outras pessoas e logo os guardas da empresa. Dominado, Natan foi preso. Mariana sobreviveu, Afonso, ao chegar o socorro, já estava morto. Embora a sobrevivência, antes tivesse morrido, Mariana ficou com sequelas tão profundas, principalmente na face, que de bela tornou-se feia e muito amarga, nunca falou nada que pudesse levar ao nexo causal do crime. Natan foi torturado pela polícia, consta que nada disse, mas foi condenado e preso por muitos anos. Passado o momento trágico, falavam a boca pequena que eles formavam um triângulo amoroso e urdiam suas orgias na mesa do canto esquerdo, onde sempre almoçavam. A mesa do canto esquerdo daquele refeitório nunca mais foi ocupada por ninguém.