ESCLARECIMENTO VIII: A MORTE DO CORONEL.

A HISTORIA DO CAPITÃO AMERICA...

O telefone tocou, atendi e fiquei estupefato, estarrecido e paralisado: Um amigo pessoal de infância (moramos e crescemos juntos no subúrbio), fizemos a mesma faculdade e formamos juntos, eu na Policia Civil e ele na Militar. Mesma idade e o mesmo tempo de policia, ambos já com tempo de aposentadoria. Ele estava encostado com depressão, havia sido promovido a Comandante Geral há poucos anos. Uma carreira brilhante com atos de heroísmo, bravura, honra e perseguição dos direitos humanos por torturas e mortes. Uma época difícil, tempos de chumbo, poucos conseguiram se sair bem. A Justiça Militar é severa, mas justa. Ele fez o que tinha de ser feito e foi absolvido, reconhecido, homenageado e condecorado.

Ele tinha acabado de suicidar!

- Quando foi isto? Como foi isto?

- Foi agora doutor. Ele entrou no gabinete sentou-se e deu um tiro na boca! Não falou nada com ninguém, nem tomou café, apenas atirou.

Seu Ajudante-de-ordem, um Tenente da Tropa de Elite prestando serviços internos em função dos inquéritos por violência, quem me relatou.

Após o susto pedi ao Cidão um motorista para ir ao quartel.

- Doutor, sinto muito! Sei o quanto eram amigos. Eu mesmo o levarei, tem apenas uma Barca no pátio, então vamos no meu carro?

- Vamos na Barca, temos providencias a tomar.

- Doutor! Só lembrando, lá é outra área...

- Sei, sei Cidão, mas ele já sofreu muito na vida, e é um Herói. Vou facilitar pra ele.

No caminho fui contando a historia dele:

- Desde crianças tínhamos o sonho de sermos policiais, servimos o Exercito juntos, ele gostou da carreira militar, eu não tinha jeito pra milico. Ao sairmos entrei na Civil e ele na militar. Fizemos cursinho juntos e entramos na faculdade de direito, ele foi pra academia e eu estudando pro concurso de delegado.

Nos formamos no mesmo ano, ele já era Tenente e eu já tinha passado no concurso, mas tive que esperar a formatura para poder assumir. Depois de formado ele foi pro choque e na primeira semana de comando houve uma rebelião de presos na minha delegacia. Ele me apareceu lá fardado, de capacete, escudo, tonfa, gás, granada de efeito moral e uma doze punheteira. Parecia o CAPITÃO AMERICA, começamos a rir e fomos pro dialogo.

- Aqui é o CAPITÃO AMERICA vim dar uma opção para vocês: Ou voltem pra cela ou vou invadir esta merda! Vocês têm 5 segundos e já se passaram quatro. Ouvimos um rebelado gritar:

- Quem ta por cima é nois! Ou ceis saem daí e deixa nois passar ou nois vai passar...

- Tem refém? Me perguntou com ar de preocupado. Tava com tanto tesão que esqueceu o protocolo.

- Tem não CAPITÃO! Vi seus olhos brilharem de alivio.

- Todos prontos? Eu vou na frente! Abram esta merda e arriem o pau! Quero todos no PS.

Foi um corre - corre danado! Nunca tinha dado tanta pancada na minha vida e ele gostou do trem, e o apelido pegou, CAPITÃO AMERICA! Foi sua primeira medalha! Depois desta rebelião, coincidência ou não, CAPITÃO AMERICA de serviço não tinha rebelião em lugar nenhum.

- Eu lembro Doutor! Poucos meses depois fui transferido pra tua delegacia e esta historia virou lenda: CRIS e CAPITÃO AMERICA, os reis da porrada em presos indefesos...

- Vá te fuder Cidão! Presos indefesos o caralho! Já entrei muitas vezes sozinho nas jaulas cheias pra tirar armas dos malacos...

- Era o que corria na época doutor.

- Porra tu já foi comigo nas brabezas, alguma vez eu pedi arrego?

- Não doutor!

- Então Cidão! Qualé meu? Ta me estranhando?

- Não doutor, respondeu, rindo que dava gosto...

- Que que virou este inquérito?

- Nada, fizemos o que era preciso ali na hora com o que tínhamos e tivemos paz por alguns anos. Fomos absolvidos.

- O senhor merece, é justo e honesto...

- Cê sabia? Nós nos casamos no mesmo dia na mesma igreja. Os pais dele foram meus padrinhos e os meus foram padrinhos dele. Ele ficou casado a vida toda!

Era muito certinho, eu era porra louca, já casei quatro vezes e to sozinho novamente...

- Casei uma vez só também, casei bem casado. Ele teve apenas um filho doutor?

- Só Cidão! O desgosto da vida dele! Mexia com drogas era um vagabundo! Estava com mais de quarenta, batia na mãe pra pegar dinheiro pras drogas. Deu muito trabalho pra eles...

Ano retrasado chegou em casa drogado e querendo dinheiro ameaçou bater na mãe que estava de cama gripada. Ela telefonou e ele estava chegando em casa, o filho estava em um quarto que era do lado de fora da casa. Quando o pai chegou chamou, ninguém respondeu. Entrou e subiu as escadas correndo esperando pelo pior...

A mãe estava deitada chorando e dizendo que não agüentava mais, quando o filho sobe as escadas gritando feito um louco que queria dinheiro ou ia bater nela. Ele foi ate a porta do quarto. Assustado ao vê-lo com um faca sacou o revolver e deu um tiro, sem fazer pontaria, nada, apenas atirou. Acho que pelo treinamento ou extinto, sei lá, acertou em cheio o coração. Morreu na hora. A mãe nunca mais se levantou da cama. Morreu de desgosto oito meses depois.

Nos que já matamos sabemos que nunca vamos esquecer os rostos dos nossos mortos! Imagine esquecer o rosto de quem amamos e matamos... No lugar dele, eu também me mataria...

- Realmente Doutor! É muito difícil, eu também me mataria...

Chegamos...

Cesão
Enviado por Cesão em 31/12/2013
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