02/07/92 - 04:20hs

O serviço de emergência - 190 registrou uma chamada, originada de um telefone público, localizado na rua das flores - Cabo verde.
Uma senhora que não quis se identificar, afirmava ter ouvido gritos histéricos vindos de uma residência a poucos metros dali.

De posse do endereço, uma viatura foi deslocada.
Um homem mulato, aproximadamente 1.90 de altura, 25 anos, vestindo um jeans surrado, descalço e sem camisa, é visto deixando a residência apressado.

Os policiais o algemaram e fizeram perguntas,mas ele, só balbuciava a palavra "socorro."

Um dos PMS ficou com ele na patamo, informou a central o ocorrido, e pediu reforço,o outro foi até a porta que estava aberta... Uma mulher de aproximadamente trinta anos, sentada no chão, quase despida com uma camisola branca; puxava os longos e desgrenhados cabelos negros, gritando palavras desconhecidas, completamente alterada.

Na sala ampla, garrafas de whisky e copos quebrados espalhados pelo chão; um edredon azul, aparentemente molhado, estava enrrolado no canto do sofá, próximo ao bar que tinha seus espelhos trincados. A casa ostentava um padrão de classe média alta, a própria senhora, mesmo descompensada, mantinha sua notável boa aparência.

Observando a cena, o policial teve certeza que se tratava de um crime, e poderiam haver outros meliantes no local, achou prudente aguardar o reforço, que chegou em menos de dez minutos.

A casa foi cercada, a senhora atendida por uma oficial, e com cautela adentraram a residência.

Ninguém na cozinha, retornaram ao corredor, seguindo até a porta entre aberta de um dos quartos... A cena chocou até mesmo os mais experientes!

No quarto simples, havia apenas uma cama, um criado-mudo virado de ponta cabeça, e cacos de vidro pelo chão; aos pés da cama uma menina aparentemente sem vida, com um corte profundo no pescoço, e muito sangue em seu pijama rosa; mantinha os olhos abertos, e um filete de sangue escorria pelo canto da boca que sustentava um sorriso duro.
Os braços abertos e as penas unidas, formavam no chão o sinal de uma cruz. Nas paredes e no teto, versos escritos com sangue...

"Tantos invernos sombrios...
Presa em um quarto escuro,
Como a presa de um vulto..."



O suspeito foi levado para a delegacia, a mãe internada em uma clínica e assistida por familiares, que localizaram o pai da pequena Malu, em Boston; viajava a trabalho e ficou desesperado com a notícia.

O caso chocou a pequena cidade de Cabo verde.

Em seu depoimento, Carlos assumiu que mantinha um caso à cerca de quatro anos com Marluce, desde que, fora chamado por Rogério(o marido traído) para fazer a limpeza da piscina, tendo o serviço aprovado, passou a cuidar da manutenção com duas visitas semanais.

Com a ausência de Rogério e carência da esposa, se envolveram; os primeiros encontros amorosos se davam na casa do casal, no horário de serviço.

Nos últimos meses, Marluce dispensou os serviços da empregada e babá da filha, desta forma, os encontros tornaram-se diários.

Conta que sentia pena da menina Malu, de doze anos, que era privada de usufruir do quarto repleto de brinquedos e muitos livros, presentes do pai que incentivava o gosto da menina pela leitura. A mãe considerava bobagem e não tinha paciência. Comprou uma cama, pôs naquele quarto vazio, junto a um criado-mudo, onde punha a garrafa com água e um copo; e trancava Malu todas as noites em que o pai não estava presente, para ficar livre com o amante.

Cabia a ele, retirar a lâmpada antes de trancá-la; Marluce afirmava que, no escuro ela dormia mais rápido.

Na noite do crime, cumpriram a rotina, a menina gritou, chorou, bateu na porta, e quando se acalmou recitou uns versos.

"Sempre achei estranho o fato da menina falar sozinha no escuro, dizia ter um amigo que a visitava toda noite.
Me causava arrepios, mas a mãe dizia que era bobagem! Ligamos o som, e nos amamos no sofá da sala, por longas horas, bebemos um pouco também; num dado momento, o cd parou de tocar e ouvimos um barulho estranho, mas não havia ninguém na casa, fomos conferir se a menina durmia, e quando pus a lâmpada vimos a cena!

"...Perseguidora presença...
Peço-te PAZ!"

Em choque, voltamos para a sala e tentava conter Marluce que surtou, quebrando tudo que via pela frente, sai para pedir ajuda e encontrei os policiais."

Assim, Carlos relatou os fatos, e foi mantida a prisão preventiva, para não atrapalhar as investigações.

Marluce recebeu alta, e seu depoimento confirma tudo que o amante relatou a polícia.

Não foram encontradas outras digitais na casa, sinais de arrombamento, nada foi furtado; o que confirma, a versão do casal.
No quarto, onde a menina foi trancada não haviam janelas.

No corpo da menina não foram encontrados sinais de abuso ou agressão; somente o corte na garganta.

Pela estatura da menina não haviam possibilidades de escrever no teto, não tinha nada no quarto que lhe servisse de apoio.

A quantidade de sangue usada na escrita, também intriga, a perícia atesta que após o corte, a morte se deu em poucos minutos.

Ninguém soube, o que de fato aconteceu com Maria Luíza.

Marluce cometeu suicídio após prestar depoimento, e Carlos aguarda julgamento na cadeia.

A casa passou por inúmeras reformas, mas inexplicavelmente, os escritos tornam a aparecer sombreados, nas paredes e teto do quarto onde ocorreu o crime.
Quando anoitece, o perfume de Malu e o odor de sangue se misturam pelo cômodo; o que impede a venda.


"Tocou-me as mãos o negro anjo,
A eternidade abriu-me as portas..."
Christinny Olivier
Enviado por Christinny Olivier em 26/06/2013
Reeditado em 09/03/2015
Código do texto: T4359856
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