ESPIONAGEM
ESPIONAGEM
I
Álvaro Gusmão Flecha Nascimento. Diplomata brasileiro. Servindo em New York, representante do Brasil junto a ONU. Muito competente, mais de vinte anos na carreira. Presta serviço na famosa metrópole há já uns dez anos.
Homem sério, muito ligado à família, casado com Eliana, milionária, herdeira dos Medeiros Calmon, proprietários de banco, de origem mineira. Possuem dois filhos, um casal, o rapaz seguindo a carreira diplomática, como o pai, e a moça, jovem consagrada pianista, com apresentações na Europa, Estados Unidos, inclusive no Carnegie Hall, famosa sala de concertos sediada em Manhattan. E, em outros países de grande representatividade cultural no mundo.
O único aspecto que altera o bom andamento da vida de Flecha Nascimento, como é conhecido, trata-se do domicílio da família. Eliana, apesar de sua posição social, vive com simplicidade, não muito dada a participar de eventos da alta sociedade, mantendo uma linha de conduta reservada. Raras as sua aparições em público. Participativa, somente em relação à benemerência. Tem sob sua direção, uma casa de repouso de idosos, onde abriga mais de cem velhinhos. Portanto, muito raramente permanece em New York, apesar da insistência do marido. Gosta, mesmo, de Belo Horizonte. Mais viaja, para assistir exibições de sua filha.
Flecha Nascimento também é um homem recatado. Não gosta de grandes aparições, frequentando apenas solenidades, e outros eventos sociais, quando alguma autoridade do governo brasileiro está em missão na “Big Apple”. Raramente, nas horas de folga, abandona o hotel onde mora. Sim, no hotel, pois, diante de sua simplicidade, prefere esse modo de residir, por não haver necessidade de administrar um apartamento, envolvendo criadagem e todos os outros aspectos de manutenção de uma residência. E, principalmente, porque assim pode curtir sua tão desejada privacidade. Nada como poder sair do banho totalmente nu, deitar no sofá da sala, fazer suas leituras (uma das coisas que ele mais gosta), tudo sem ter que se importar com trajes. Além disso, está perto da sede da ONU, podendo ir a pé, com toda segurança, pois fica a dois passos da entidade mundial.
II
Alguns países do Oriente Médio andavam preocupados com a possibilidade de o Brasil conquistar a cadeira permanente no Conselho de Segurança da ONU. Ainda mais agora, quando os EUA dão mostras de apoiar essa entrada de nosso País, no citado órgão.
A política norte-americana desejando causar uma reviravolta em seu relacionamento com o governo brasileiro, muito degradado pelo apoio que foi dado à questão dos direitos humanos pelos governos de Cuba e da Venezuela, bem como ao programa nuclear do governo iraniano, tem acenado com sua aquiescência na entrada do Brasil, no órgão de segurança da entidade que representa todas as nações do planeta.
Esse fato tem causado uma espécie de ciumeira em certos países, a ponto de, em conluio, eles tramarem certas situações que possam denegrir a imagem brasileira, no concerto mundial.
III
Flecha Nascimento está tranquilo em seus aposentos no hotel. Sábado, não há qualquer tipo de compromisso oficial. Recém chegado de sua habitual caminhada pelo Central Park, tomando um suco de laranja, pensa na mulher, em seus filhos, com incômodo sentimento de solidão. Nessas ocasiões, quando se vê descompromissado, batia-lhe a saudade da família, e se sente como o único habitante de uma ilha perdida na imensidão do oceano. O que lhe dá certo reconforto é a paisagem que se descortina, vista da sacada. A beleza do Central Park com sua farta vegetação, os diversos espelhos d’água, os brinquedos para as crianças, a carruagem levando felizes passageiros, a famosa praça em homenagem a John Lennon, bem defronte ao edifício Dakota, onde ele morou, e em frente ao qual foi assassinado. Uma visão bem repousante. Sentiu Flecha Nascimento chegada a hora para o banho. Não foram mais do que quinze minutos.
Ao sair quedou-se estupefato. Uma camareira nova, que jamais a havia visto, negra, bonita, assim que o viu, desabotoou o uniforme, deixando à mostra seu corpo escultural. Insinuante, abraçou o indefeso homem, livrando-o da toalha que encobria seu corpo. Resistiu ele o quanto pode, não conseguindo impedir, todavia, que fossem flagradas diversas cenas, por câmeras fotográficas estrategicamente colocadas.
IV
A repercussão foi geral, e altamente prejudicial tanto para o Brasil, como para o diplomata. Jornais de todo o mundo estamparam em suas páginas principais, as cenas colhidas naquela fatídica manhã de sábado, no apartamento de hotel onde morava o destacado funcionário.
As consequências vieram rápidas, com enérgicas medidas contra o
diplomata, com seu afastamento do cargo. Pior que isso, acusado que foi de estupro pela falsa camareira, teve sua prisão preventiva decretada, somente transformada em domiciliar, através do pagamento de vultosa quantia em dólar, a título de caução. As provas eram irrefutáveis.
Mas, nem tudo estava perdido!
A contra-espionagem funcionou. As residências de embaixadores, e outros diplomatas de alto escalão, que exercem funções de suma importância, principalmente em órgãos como a ONU, por medida de segurança, são munidas de câmeras de grande resolução, muito sofisticadas, colocadas em locais inimagináveis. Minúsculas, jamais são vistas por quem quer que seja, inclusive, em locais desconhecidos pelos seus próprios ocupantes.
Então, tudo o que se passou foi visto nos filmes gravados pelas câmeras escondidas. Com todos os detalhes. Detalhes que as fotos publicadas não mostraram.
V
Nem precisava! Tudo forjado! O serviço de inteligência americano já havia detectado toda ação inimiga. O trabalho de agentes infiltrados nos esquemas funcionou.
Sabedores da trama idealizada, os agentes da CIA pesquisaram e foi encontrado um sósia de Flecha Nascimento.
No dia dos fatos lamentáveis, estava ele no aconchego do lar, com sua esposa Eliana, em Belo Horizonte.
A falsa camareira está presa, confessou sua ligação com o esquema montado pelos países revoltados. Ex miss de um país africano!