A TESTMUNHA

A rua estava como sempre calma,crianças não brincavam(a essa hora da tarde a sua maioria estava no colégio) o silêncio era o maior barulho naquele momento.

Como que por impulso então,Sérgio pula da cama ao som do despertador,do despertador da morte.O tiro o pega de surpresa mas não o deixa nervoso.Sem pensar duas vezes ele abre a persiana(com alguma dificuldade.ela já esta enferrujada) e vê Leandro caído próximo a uma valeta,na qual seu sangue se misturava com a água podre,transformando certamente o esgoto em uma réplica tropical do famoso mar vermelho.Como sempre vestido com calças rasgadas e camisas já desbotadas.(não abrindo mão é claro de suas luvas de couro grosso.Podia fazer o maior calor do mundo mas ele sempre as usava) Jazia sozinho,parecendo algum tipo de trombadinha de filme dos anos sessenta.

A primeira coisa que ele fez então,foi pegar o telefone,discava rapidamente os números,faltava somente um e então foi como se sua mão tivesse sido estapeada por outra fazendo-o colocar o aparelho de volta no gancho."Eu devia avisar a polícia"pensava conflitante "Mas eu não posso,se eu falar o o que via ser da minha família?A minha mulher,o meu filho,o meu filho..."

Sérgio tinha aproximadamente uns quarenta e poucos anos,sua aparência era desgastada,mas existia sim alguma juventude em seus traços,talvez nos olhos? ,trabalhara muito tempo como soldador em uma metalúrgica quando se viu...cansado.Seguindo o exemplo de alguns amigos decidiu que era a hora de parar,além disso seu filho acabava de nascer e ele queria passar o maior tempo com o pequeno,mesmo que fosse sem poder enxerga-lo.

Para que possamos voltar o mais rápido possível á nossa história principal,resumo-me em dizer que fora preciso apenas um atestado médico bem pago e um exame bem forjado para que sua cegueira fosse comprovada.Agora pouco ajudava em casa, afinal o que um cego pode fazer?Pode beber,jogar,fazer qualquer coisa,isso quando ele já não é mais cego,(o que seria das oito da manhã ás seis da tarde.O tempo em que sua esposa Estela e seu filho Henrique trabalham).

Esperando esquecer aquela situação,e desejando que ela se resolvesse sozinha,Sérgio tenta dormir novamente sem muito sucesso.

Era sábado,haviam-se passado dois dias desde o acontecido,e mesmo assim,ele não conseguia esquecer.Não conseguiam,e não lhe deixavam.Afinal de contas não era sempre que alguém era assassinado ali.

-Eu nem acredito que isso aconteceu de verdade,bem aqui na frente da nossa casa.Ainda mais com o Leandro que eu vi cresce praticamente...

-È,eu também...

Existia um certo nervosismo na voz de Henrique,um nervosismo duplo.O primeiro,e o segundo.O segundo era justamente pelo medo de que descobrissem o primeiro.

-Eu não to com muita fome,eu vou pro meu quarto.

-Mas você nem almoçou direito meu filho...

-Eu não to mesmo com fome mãe.

Em seu quarto,Henrique fecha a porta,a tranca com a chave e sentado em sua cama fala com sigo mesmo em desespero:

-O que foi que eu fiz...Eles vão ver que a arma,eu to perdido... Agora chorava também chorava como se fosse realmente adiantar alguma coisa.-Eu não podia ter sido tão idiota,eu não podia...

Como se os seus pensamentos tivessem sido ouvidos,ou os desejos de um inimigo seu atendidos,batem á porta do pequeno sobrado,dois policiais civis com um pequeno saco transparente nas mãos:

-Bom dia,nós somos da polícia,e estamos aqui devido ao assassinato de Leandro Martins.

A comida descia amarga na garganta de Sérgio.Ele sabia por que os policiais estavam ali.A sua família estava acabada,seria dissolvida em poucos instantes.Sua mulher,seu filho,seu filho...

-Deve ser engano moço,ele morava na casa da frente,aquela pintada de verde..-Apontava Estela pela porta da frente que ainda estava aberta.

-Não foi engano não senhora.Nós estamos procurando um rapaz chamado Henrique Ferreira,é o seu filho,não é?

-É sim,mas o que tem ele policial?Estela também estava nervosa agora,mas a diferença entre ela,Sérgio e Henrique que chegava agora á sala,é que ela não sabia que de nada adiantaria o nervosismo,tudo já estava perdido.

-Nós encontramos esta arma na cena do crime.(mostrava o pequeno saco transparente com a arma dentro)-Nós vimos que o registro é daqui,e encontramos as digitais do seu filho nela.Essa arma esteve com você não esteve Henrique?

-Teve sim...

Henrique resmungou alguma coisa,tentou se justificar,quem não tentaria."Eu não matei o Leandro,eu juro que não matei.É um engano..."Assim,através de seus óculos de "cego" Sérgio viu sua profecia dramática se concretizar,sua família estava destruída.

MESES se passaram,e no dia do julgamento,um populoso juro gritava por justiça.

"com juri popular é mais fácil a condenação de um assassino.."Esclarecia um advogado em um grupo de três juristas.

"Eles são muito mais sentimentais.qualquer historinha dramática convence"Completava outro.

Drama maior,maior até mesmo do que o de Estela que chorava copiosamente,vivia Sérgio sentado na "plateia" do tribunal ao lado da esposa.Aquilo parecia um pesadelo.Quem lhe dera ser realmente cego para não ver aquilo tudo...

O julgamento já ia pelo final,a condenação era iminente, quando por um acesso de caráter,ou um impulso indireto,ele se levanta,retira os óculos cor-de-chumbo e olha entre lagrimas para o juri surpreso.

-Eu posso ser preso,eu devo ser preso...Mas o meu filho não,ele não é um assassino,eu sim sou um mentiroso.Eu nunca fui cego,e se disse isso foi pra enganar todo mundo e me aposentar mais rápido.O que interessa,é que eu vi como o Leandro morreu,e eu sei que não foi o meu filho quem matou ele,não foi ninguém.O Leandro se matou,eu vi,ele acabou com a própria vida.

-Ordem,Ordem!-Batia incessante o juiz em uma sineta em sua bancada.-E o senhor pode me explicar como a sua arma,com as digitais de seu filho foram parar nas mãos da vítima senhor?

-isso eu posso explicar meritíssimo.-Agora se levantava Henrique.Se levantava em sua própria defesa.-A arma tava com ele,porque eu...eu tinha emprestado pra ele.Ele me disse que tava sendo seguido por alguém,eu bem achei que fosse coisa da cabeça dele,porque todo mundo sabe que ele tinha problema,mas a gente era muito amigo e ele me pediu tanto que...que eu deixei ela com ele.

-O senhor promotor disse que a vitima usava luvas de couro na hora do assassinato,essa informação procede?-Quem falava agora era o advogado de defesa.Quem sabe não viraria o jogo agora?

-Procede!

-Simples caros jurados; A vitima usava essa luva na hora do crime,e segundo informações da própria família ele quase nunca as tirava,por ser presente de seu falecido pai.Também é informação da família que o jovem sofria de prolemas psicológicos e que a muito se recusava a tomar sua medicação...Será possível,que pelo erro de um pai,que por ser um tanto quanto egoísta é verdade,embora não seja o caráter dele que está em pauta,um jovem com a vida inteira pela frente,um jovem a quem todos conhecem como educado,que estuda e trabalha pelo progresso,ser jogado em uma cadeia para o resto de sua vida,sera possível?Eu me adianto em dizer que possível,isso é,agora justo...E não seria a justiça que buscamos nós neste momento?

Com apenas um voto contra,Henrique se vê livre da prisão,mas não de um conflito interno e massacrante.Seria possível perdoar seu pai que com uma mentira de anos,o colocara e o tirara daquela situação?Seria possível? Possível seria,e justo?

Diogo Machado
Enviado por Diogo Machado em 17/06/2012
Código do texto: T3729658
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