CHUMBO GROSSO - PARTE 1
"Por Um Triz"
Fui um policial de renome. Trabalhei com grandes autoridades, fiz segurança de pessoas famosas. Mas o tempo, inimigo de qualquer ser vivente, restringiu-me à condição de guarda noturno, e ainda no condicional: "Se aprontar... NA RUA!"
Para quem está no fundo do poço, e mortadela é caviar, aceitei. Tranqueiras que no passado não serviam para engraxar meus sapatos, agora me davam ordens.
Armas cheguei a ter duas quarenta e cinco banhadas a ouro. Hoje minha arma é um "oitão" velho que comprei nas bocas, o famoso cabrito ou P4.
Sempre esperei a grande oportunidade que nunca aconteceu.
Tive várias mulheres, todas lindas, que ensinei o vício, primeiro em cerveja, depois em uísque e por fim a pinga. Todas me juraram de morte e fariam se tivessem chance.
Tomo conta de alguns armazéns na zona cerealista, bem perto da boca das boates.
Durmo de dia em um pequeno apartamento, e trabalho todas as noites.
Minha farda é um capote velho de lã, uma garrafa de café misturada com conhaque, três maços de cigarros e o oitão com cinco balas velhas.
Nos áureos tempos, eu presenteava amigos com caixas de balas de meu estoque particular.
Bem, neste dia, digo, nesta noite, estava muito frio e garoava.
Eu parecia um morto-vivo, um zumbi, cheio de trapos, touca, tudo pra diminuir o frio. Dizem que gordo não sente frio, mentira...
Aquele carro bacana parou à uns oito metros de mim. Desceram dois brutamontes, arrancaram à tapas uma linda mulher que se negava a obedecer. Estava com um lindo vestido longo de baile, gritava palavrões e o couro comia. Um deles me viu e falou:
- Você aí ow BOSTA! Dá linha!
Se tem uma coisa que ainda não perdi foi a raiva, e o cavalo doido em mim acordou.
- Por que vocês não batem na mãezinha que deve estar na esquina?
Não esperavam isto, largaram a moça e viraram pra mim. Ela virou um palito desaparecendo, pensei: "Agora é comigo..." Como quem tem cuida, lasquei uma bica no joelho do primeiro que com certeza só vai andar depois de muita fisioterapia. O outro meteu a mão na culatra, dei um pulo pra frente e soquei a cara dele sem dó. Este caiu dormindo, o primeiro do joelho, tentou sacar a arma, mas com uma barra de ferro dei-lhe uma no cocuruto que acho não acordou mais. O terceiro que estava ao volante pisou tão forte que subiu na calçada, mas depois acertou o carro na rua e sumiu na noite.
Limpei os safados, tirando tudo dos bolsos, bem como as armas novinhas que coloquei na cintura.
Entrei em um beco pra ver o que tinha conseguido e ouvi um choramingo atrás de umas caixas:
- Quem está aí? - Clareei o canto e vi a moça que havia tomado a surra chorando que começou a gritar.
- Grite e eles voltam pra terminar o serviço, é isso que quer?
Ela calou a boca, fui até a esquina e vi o carro outra vez, só que haviam dois, os homens pegaram os feridos embarcaram e vieram em nossa direção. Tapei a boca da moça e me joguei atrás das caixas.
Pararam com o farol alto ligado e após alguns minutos uma ouvi uma voz:
- Vamos embora.
Ouvi os carros se afastando, ela quis se levantar, disse pra ficar quieta e esperar alguns minutos. Ela falou:
- Acho que está se aproveitando, tem algo me incomodando...
Tirei a automática da cintura e disse:
- Fique sossegada, você não tá com essa bola toda...
- Hã... Então por que me defendeu?
- Porque estavam fazendo uma covardia.
Caminhamos até a saída do beco, ainda vi os carros passando na avenida devagar.
- Moça, eu vou pra casa. Ficar aqui é querer comer capim pelo lado de baixo.
- Posso ir com você?
- Poder pode. Só não me arruma pra cabeça.
- Esquentadinho hein....
Continua...
Ôripe Machado