A TRAVESSIA DA PISTA
A TRAVESSIA DA PISTA
Atravessar a pista de pouso de aeronaves consiste em uma transgressão de caráter grave.
Certa vez no ano de 1969, quando eu cursava o curso de cabos em Recife um grupo de soldados alunos resolveu atravessar a pista para irem fazer refeições no Parque de Aeronáutica, por motivo da comida de lá ser melhor do que a da Base local onde estávamos arranchados.
Esta travessia arriscada era costumeira nos finais de semana e feriados, porém certa vez fomos surpreendidos pelo oficial de dia, um japonês muito rígido, conhecido na gíria da caserna como carne de te-téu ave muito conhecida e que tem sua carne bastante dura.
Há certa distância percebemos o jipe próximo da cabeceira da pista, ficamos logo apavorados, porque sabíamos que como punição poderia até mesmo ser desligado do curso, haja vista a rigorosidade da época, governo militar e após revolução.
Voz alta e muito autoritária o japonês ordenou parem onde estão. Instintivamente todos desobedeceram à ordem e num ato conjunto sem pensar bateram em retirada, pernas pra quem te queira e embrenhamos mata a dentro.
Após certo tempo de caminhada num lagar supostamente seguro paramos para pensar. Conhecendo a fama severa do japonês começamos a estudar uma maneira de retornar a salvo ao alojamento do curso de cabos que ficava no Esquadrão de Polícia de Aeronáutica, local muito vigiado por abrigar naquela época presos políticos.
Como uma luz divina que surge do céu repentinamente clareando nossas mentes aparece à idéia de não retornar mais naquele dia para o alojamento, porque supostamente seríamos anotados e entraríamos na lista de suspeitos para as investigações.
A tarde caía, o sol já declinava seus últimos raios quando um iluminado pensa em voz alta vamos pedir guarita ao sargento de dia a Companhia de Infantaria de Guardas que é gente muito boa e de confiança. A idéia foi aprovada por unanimidade, aí então, um dos soldados que tinha mais intimidade com o sargento deslocou-se até a Companhia para levar êxito o nosso plano, que contou toda a verdade do ocorrido ao sargento, que resolveu nos acolher.
No dia seguinte, uma segunda feira retornou um por um para o alojamento no Esquadrão de Polícia, que não se comentava outra coisa a não ser sobre um grupo de soldados que haviam desobedecido as ordens do oficial de dia.
Silêncio foi à arma usada, não comentamos com ninguém, ficamos todos de bicos calados e até hoje não foi descoberto quem eram os soldados da fatídica travessia.