VIDA DE HERÓI

VIDA DE HERÓI

Paulinho era o único filho de uma família de lavradores que havia se mudado, há pouco tempo, para a pequena Cidade do Sol.

Como toda criança na magia dos seus oito anos, Paulinho era um menino sonhador. Acreditava em super-heróis e na existência das fadas. Colecionava brinquedos e sentia-se orgulhoso em organizar seu exército de soldadinhos de chumbo à cabeceira da cama. Adorava ouvir histórias de bombeiros e só dormia se estivesse abraçado a um dos seus caminhõezinhos vermelhos, com escada e equipamentos de combate a incêndio, que até parecia ser de verdade.

Ele admirava o trabalho dos homens do fogo. Acreditava que eles eram como os anjos, que habitavam outros mundos e que apareciam todas às vezes que alguém estivesse em perigo. Sonhava poder um dia ser como eles, e, às vezes, durante seu sono inocente sonhava que estava sobrevoando as nuvens e, lá do auto, observava a cidade, as pessoas e os animais.

Em suas aventuras usava sempre uma capa e um capacete de soldado, mas o que o deixava mais orgulhoso era um brasão bem grande, em forma de círculo que ostentava em seu peitinho de anjo. Mas logo chegava o sol e com ele a manhã de um novo dia.

Paulinho deixava de ser o salvador da humanidade e voltava à realidade, ao mundo das pessoas grandes. Ia para a escola cantarolando pelo caminho e, se alguma viatura de bombeiro passasse com as sirenes ligadas, ele acenava, pulava e gritava com toda a sua força, enquanto em seu rosto rolava uma lagrima emocionada. Ele desejava falar com eles, poder tocar seus rostos, entrar na viatura e ajudá-los a salvar as pessoas do perigo.

Certo dia, seus pais saíram e tiveram que deixar Paulinho sozinho em casa. De início ficaram preocupados, mas ele era um menino muito obediente, sendo motivo de orgulho para a sua família. Paulinho querendo tranqüilizá-los encheu o seu peitinho de ar, a fim de parecer um pouco maior e disse: “Pode ir papai, eu tomo conta da casa”. A seguir ficou acenando do portão fazendo pose de gente grande, afinal, ele se considerava um super-herói e heróis não têm medo de nada.

Então, sozinho com suas fantasias e imaginações, resolveu brincar de anjo da vida. Amarrou um lençol de cor vermelha nas costas, calçou as botas do pai e, pronto. Lá estava um bombeirinho. Em um dos quartos da pequena casa, colocou fogo num travesseiro e saiu gritando em direção ao jardim, imitando a sirene dos Bombeiros. Pegou a mangueira utilizada para molhar as plantas, mas, na pressa, esqueceu-se de ligar a torneira. Entrou no quarto, que já estava tomado pela fumaça, apontou a mangueira para o fogo. A água não saiu! O seu precioso equipamento de combate a incêndio havia falhado...

Porém Paulinho não se deu por vencido. Tentou tudo que estava ao seu alcance para controlar a situação. Afinal, um herói de verdade não desiste do seu objetivo tão facilmente. Seu esforço, no entanto, fora inútil. As labaredas ficavam cada vez maiores. Ele decidiu fugir, mas já era tarde demais. Tudo queimava a sua volta. O ar ficava cada vez mais irrespirável. A temperatura insuportável. Paulinho agonizava indefeso dentre as chamas ardentes, enquanto seu rostinho avermelhava na proporção daquele vulcão ensandecido.

Desejava estar sonhando... Como era gostoso aquele sonho! Lembrava da visão que tinha lá do alto, da fofura das nuvens e do frescor dos ventos em seus cabelos. Como era gostoso fazer parte daquele corpo de anjos! Anjos que vivem em prol da humanidade. Sabia que, se algum deles estivesse por ali, ele estaria a salvo. Porém os homens do fogo não apareceram. Aquele cenário de horror logo engoliu seus sonhos, juntamente com as suas últimas esperanças e, de joelhos, com as mãozinhas apontadas para o céu, o bombeirinho sucumbiu inconsciente e solitário.

Os bombeiros chegaram. Como que surgindo das nuvens, nas asas de um elegante Tuiuiú. Lá estavam os anjos pantaneiros do Corpo de Bombeiros de Mato Grosso do Sul. Tudo parecia perdido... O comandante ordenou que o local fosse isolado para que as chamas não atingissem outras residências.

Num dado momento, alguém informou aos bombeiros que havia uma criança presa dentro da casa e que há pouco tinha ouvido pedidos de socorro. Diante dessa preciosa informação, imediatamente, um dos bombeiros avança contra aquele inferno de fogo. Sua inconseqüência lhe custaria à vida. Porém, ao contrário do que muitos imaginaram, ele tinha plena consciência do que estava fazendo e decidiu que por uma vida valeria à pena correr o risco.

É comum ver estes homens doarem-se em prol da vida alheia. Vivem sob o nobre lema: “vidas alheias e riquezas salvar”. O pequenino tinha razão por acreditar na dedicação e no amor desses homens em relação à vida.

Num mergulho, aparentemente fatal, aquele homem desapareceu por entre as chamas do inferno em busca do pequenino. E, seguindo o seu instinto e experiência, o bravo soldado do corpo de bombeiros, logo encontrou o pequeno anjo. Envolveu-o em sua capa e, para a alegria de todos, ressurgiu das chamas com a criança nos braços, como um sonho vencendo a névoa de um pesadelo.

Apesar de exausto e com queimaduras por todo o corpo, nosso herói começou a reanimar seu pequeno tesouro. Após várias tentativas sem sucesso, sob o olhar atônito das pessoas que o observava de longe, o bravo bombeiro retirou sua capa e decepcionado soluçou. Havia chegado tarde demais! Inconformado, retirou seu capacete e do seu rosto marcado pelas fuligens daquele horror, correu uma lágrima de dor. Não percebeu que por ter acreditado e dado o máximo de si o pequenino, como que por um milagre, havia voltado a respirar.

O bombeirinho abriu os olhos lentamente e ao ver aquele homem, aquele anjo de joelhos ao seu lado, sorriu apesar da dor. Sorriu, pois tinha certeza de que eles viriam. Eles sempre aparecem quando alguém precisa. Estendeu suas mãozinhas queimadas em direção ao rosto do seu salvador e o tocou com ternura. Então nosso herói, despido da imponência de sua máscara, chorou de alegria.

Durante o resgate de Paulinho a farda daquele bravo bombeiro rasgara-se. Então, o menino percebeu que em seu peito havia sangue, que em seu rosto havia dor. Por um momento, Paulinho ficou decepcionado. Percebeu que o super-herói, que tanto admirara, era feito de carne e osso. Assim como ele! Descobriu que não era indestrutível, que poderia ser ferido e, até mesmo morto, que era vulnerável e que até sentia medo! Mas logo se alegrou. Afinal, quem mais poderia enfrentar a morte para salvar a um desconhecido? Quem mais renunciaria a própria vida para salvar alguém que supostamente já estaria morto? Se não um super-herói de verdade! E o fato de ser uma pessoa comum, assim como ele, é que fazia daquele homem um ser tão especial.

Aprendeu assim, com aquele guerreiro, que as pessoas têm um valor muito maior do que imaginamos e que os homens do corpo de bombeiros compreendem a fundo a essência da vida. Paulinho, que renasceu das chamas, graças à coragem daquele bombeiro, resolveu que à partir desse dia daria asas aos seus sonhos. Aprendeu, ainda, que não se deve brincar com fogo, mas, acima de tudo, descobriu que ser um bombeiro é ser o guardião da humanidade. É ostentar no peito o titulo de anjo da vida.

PAULO TEODORO OLIVEIRA nasceu na cidade de Dourados-MS, em 24/12/1974. É bombeiro militar. Tem como objetivo: elevar através da poesia e da música, a majestosa beleza do Pantanal Sul-Mato-Grossense, assim como, o nobre lema dos Bombeiros “Vidas Alheias e Riquezas Salvar”.

Teodoro Poeta
Enviado por Teodoro Poeta em 01/05/2011
Código do texto: T2942310
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