NOS BONS TEMPOS DO VELHO OESTE - PARTE 7

Não é preciso muita imaginação para supor-se que este pistoleiro, ao sair dali, iria direto ao encontro do seu chefe a fim de notificá-lo da emboscada e, meia hora depois, quando chegou Carrilo e o resto do bando, já nada encontraram. O que havia era não mais do que as conseqüências de um ato de justiça. Sobre as mesas, marcadas pelas cinzas dos cigarros e dos charutos fedorentos que ainda ofendiam o ambiente com o fantasma da sua poluição, viam-se cartas. Baralhos desfeitos e esquecidos. No meio delas, em uma das mesas, um bilhete. Tommy Brown deixara uma mensagem para o seu inimigo número um. “Já sabe onde estou. Venha se for homem. Minha vingança o aguarda”.

Carrilo largou com fúria o papel que rasou da borda mesa a sua frente e foi se perder atrás de uns sacos embaixo da janela. Antes de sentar-se, chutou um tição de lenha negro e ainda quente para um canto da sala ao lado da lareira. Ajeitou o manto e comentou com o outro, mas, como se falasse consigo mesmo: – Não sabe o que lhe espera, este infeliz; vou dar-lhe uma lição e acabar com isto de uma vez por todas.

O sol ainda brilhava no horizonte sobre os picos distantes de Pinkville quando Carrilo penetrou na cidade, acompanhado de não mais do que três elementos, entre eles Puentes. Uma a uma, as portas dos estabelecimentos comerciais que ainda davam ao local aparência de um centro urbano, foram, aos poucos e timidamente, sendo abaixadas por seus proprietários temerosos e prec avidos. Sabiam, por conhecerem-no -e as conseqüências de sua chegada a qualquer lugar – que era o melhor que tinham a fazer em detrimento do lucro certo: salvar a própria pele da violência e da malvadeza de Juan Carrilo.

Porém, dentro do bar, já esperavam por ele. Ou melhor, as pessoas que, naquela hora bebiam e jogavam, envoltas em suas conversas e trapaças rotineiras, não eram as mesmas que compactuavam com a desavença prestes a desenrolar-se na cidade. O cheiro do conflito, a antecipação do mal, pervagou no ar misturando medo e ansiedade. Então, as mesas, antes em festa, ficaram solitárias e esquecidas; o balcão esvaziou-se e ainda se via alguns bancos recém desocupados apagarem-se de vez na inércia após o último giro de seu assento, causado por quem se levantou dali abrupta e apressadamente. Apenas a notícia de que ele havia chegado foi suficiente para causar todo este rebuliço. Um velho, em roupa de ferreiro, espécie de macacão de gabardi na, todo sujo e empoeirado, que costumava entrar ali todo final de tarde para tomar o seu sagrado gole e conversar com os companheiros, foi quem alertou para a chegada dos meliantes. Ao olhar da calçada em frente ao bar para os cavaleiros que chegaram em alvoroço e ver quem eram, meteu a mão na porta com vigor e empurrou-a para dentro. Segurou-a antes que ela voltasse contra si e gritou a plenos pulmões: – Juan Carrilo e seu bando acabam de entrar na cidade; estão vindo para cá! – O velho, então, esqueceu a bebida e tratou de salvar a própria pele. Sem querer olhar para trás, para não conhecer a distância que o separava do grupo, esgueirou-se pelo canto da calçada que margeava o bar e, vinte metros à frente, desapareceu numa esquina.

Sem se importarem com a azáfama de pessoas que deixavam a casa a se dispersarem na rua para todos os lados, os bandidos se aproximaram, apearam de seus cavalos e, dentro em pouco, passaram a ser os únicos ali dentro. Car rilo andou entre as mesas vazias, a contemplar a ironia de canecos ainda cheios com a cerveja; muitos ainda espumejavam a espera de serem devoradas. Ele agarrou um deles, levando-o à boca. Tornou a pousá-lo ruidosamente enquanto eructava de satisfação e superioridade. Em seguida, olhou em derredor, sentiu o melancólico abandono do ambiente e disse com sarcasmo:

– Acho que nos enganamos de cidade, rapazes. Esperava encontrar por aqui uma verdadeira preparação para o evento do ano, como me disseram que seria. Já que não estão aqui, vamos até à nova casa, deve estar lá aquele covarde. – Dizendo isto, dirigiu-se à saída, mas, o que viu, fê-lo estancar o passo. Já do lado de dentro do recinto, de braços cruzados, a exibir um ar de seriedade e confiança, Tommy Brown o observava.

– Não precisa mais ir a lugar nenhum, Juan Carrilo, já encontrou quem procurava. – Ao ver que, por trás de Tommy, a figura do xerife O’Brien surgia empurrando a po rta e penetrando também no ambiente, Puentes levou a mão à cintura na intenção de sacar o seu revolver, no que foi impedido pelo comparsa.

– Deixa estar, companheiro – falou, sinalizando com uma das mãos para Puentes que se encontrava a uns três metros de distância, no meio do salão. Ninguém vai levá-lo de volta para a prisão enquanto eu estiver por aqui. Sei que o xerife não suporta quando alguém escapa de sua cadeia, especialmente quando solto por mim. Mas, antes de proferir nova voz de prisão, ele terá que presenciar um acerto de contas; vai ver-me acabar com um metido a valente e bonitão. – Olhou zombeteiramente para Tommy Brown. Os outros dois fora-da-lei, um pouco atrás de Puentes, no fundo do bar, trataram de esvaziar cada um a sua caneca de cerveja. Estavam encostados ao balcão e acompanhavam o desenrolar da cena. Tommy Brown, na sua calma característica, deu dois passos para frente. Agora foi Carrilo quem levou a mão ao coldre.

– Não se preocupe, moço – disse Tommy, parando junto a uma mesa. – O valente e bonitão nada tem de covarde e muito menos de traiçoeiro. Pelo menos neste aspecto não me igualo a sua laia.

– Seu moleque atrevido, vai ter o que merece. Ninguém ofende desta maneira a Juan Carrilo. – Dizendo estas palavras, sacou furiosamente a sua arma para alvejar o outro. Porém, um estampido, repentino e certeiro, fez voar para longe o Colt do mexicano, acertando-lhe, de raspão, a mão. Ele ficou espantado com a ação rápida e eficiente de Smith O’Brien. Mesmo assim, porém, demonstrando frieza impressionante, sacou do bolso da calça um lenço escarlate e limpou com ele um filete de sangue que lhe escorria do dorso da mão, resultado do leve ferimento. – Não devia ter feito isto, xerife – ameaçou, guardando o lenço. – Poderá se arrepender tremendamente.

Professor Edgard Santos
Enviado por Professor Edgard Santos em 24/02/2011
Código do texto: T2811747
Classificação de conteúdo: seguro