NOS BONS TEMPOS DO VELHO OESTE - PARTE 3

Um dos orgulhos de Pinkville era a fábrica de tecidos, grande geradora de empregos e de receitas. Instalada à entrada da cidade, era um marco conhecido e respeitado. Seus quatro pavimentos viviam atulhados de trabalhadores. Duzentas e cinquenta pessoas operavam ali, sendo a maioria mulheres. Longos corredores abrigavam enormes máquinas teares que, com seus giros e roncos ininterruptos, enchiam de atividade o ambiente. As mãos hábeis das funcionárias imprimiam-lhes qualidade e competência. No alto da tecelagem, desenhada à parede lateral, a mensagem “BEM VINDOS A PINKVILLE” saudava os visitantes. À frente de sua enorme entrada, atravessando-se a rua, um amplo espaço livre e arredondado enchia-se de cavalos, charretes e algumas carruagens particulares. Era na verdade um estacionamento com chão de grama onde currais, bebedouros e uma pequena ferraria uniam-s e na assistência aos abandonados. Por trás, uma montanha pedregosa não muito alta e achatada. Nela, tortuosas ruas foram construídas entre as rochas e a partir do trecho em que começa a declivar.

Às seis horas em ponto, quando os últimos rebates da luz solar castigavam as pedras distantes da montanha, anunciando o término de mais um dia útil de trabalho, as sirenas da fábrica, orgulho de Pinkville, começariam a se fazer ouvir por toda a cidade. A mesma cena se repete. Muitos homens e muitíssimas mulheres invadem o grande terreno em busca de suas montarias e dos seus veículos. À saída da fábrica, congestionada, vendedores ambulantes fazem suas ofertas e disputam os interessados. Trazem de tudo os quinquilheiros: Bengalas, chapéus, charutos, luvas, bijuterias, brinquedos, doces, calçados, baralhos, livros, canetas, isqueiros, peças íntimas, enfim, toda uma gama imaginável de utilidades e fugacidade. Ao mesmo tempo, ao longo da rua principal, e nquanto alguns comércios fecham as portas, encerrando suas atividades, outros, como bares e restaurantes, preparam-se com avidez para receberem uma casta especial: a dos jogadores e bebedores. Ferreiros, cowboys, comerciantes e outros, digladiam-se pela melhor jogada, pelo melhor blefe e, não raro, pela melhor dama da noite.

Perto dali, à porta de sua delegacia, Smith O’Brien dá passagem à elegante Virgínia Watson; após a saída do último componente da delegação ele fechou a porta. – Você tem toda razão, isto aqui fica bem mais cheio de vida após às dezoito horas – disse a mulher ao pisar na calçada e apreciar o movimento da rua. O xerife atravessou a rua com eles e penetraram em uma estalagem cujo salão amplo e atapetado denotava o bom gosto dos proprietários.

- Aqui terão conforto e um tratamento recomendado. – Levou-os até à recepção; ali os apresentou ao gerente que confirmou as reservas. Por trás de um balcão de madeira laqueada dois grandes vasos de cerâmica ornamentavam os cantos da recepção. Deles pendiam mudas de acácia de folhagem rendilhada em perfeita simetria. Um senhor meio gordo e simpático, com uma gravata borboleta esverdeada, espetada sobre um paletó marrom de cetim, bateu com o indicador num sininho sobre o balcão e o mesmo garoto de calção até os joelhos e suspensórios apareceu descendo de uma escada em caracol. O gerente, um cavalheiro de terno cinza sem colete e óculos pequenos com uma armação preta e lentes pequenas e redondas pegou das mãos do recepcionista as chaves do apartamento.

- Queiram acompanhar-me – disse, começando a subir as escadas; Virgínia Watson o fez por último após despedir-se de Smith. Este, saindo à rua, ia voltar à delegacia quando se surpreendeu ao olhar na direção do bar William a cinquenta metros na mesma calçada do hotel. Um cavaleiro, com chapéu de mexicano e um manto vermelho rendado, acabava de amarrar o ca valo branco a um tronco. O mesmo fizeram quatro capangas que o acompanhavam. O xerife então mudou de idéia, decidiu tomar uma bebida e olhar o movimento. Caminhou e entrou no recinto.

Quando empurrou as duas portas de vaivém, Juan Carrilo, já encostado ao balcão, tendo a sua frente uma caneca de vidro com cerveja, olhou-o com desprezo. Atrás dele, algumas mesas eram ocupadas por grupos de três ou quatro pessoas que bebiam e conversavam animadamente. Mas, ao verem o temível fora-da-lei e seus homens, o silêncio foi geral. Dois Colts de coronhas prateadas guarneciam a cintura de Carrilo e impunham medo e respeito. Smith aproximou-se do balcão. – Boa tarde, William, um conhaque duplo com gelo, por favor.

- É pra já, xerife. – As mãos albinas de William pousaram sobre o balcão um copo comprido e ao lado deste um cinzeiro oval e bastante pesado para o pequeno tamanho.

- Tudo em ordem, xerife? – perguntou o pistoleiro.

- Por enquanto, sem problemas.

- Por que por enquanto?

- Tudo pode acontecer numa cidade como Pinkville, parece que os bandoleiros andam a solta – respondeu Smith com ironia.

- Se está se referindo a mim, estou em dia com a lei, xerife – replicou Carrilo, ainda mais irônico. – Só queremos nos divertir um pouco, eu e meus companheiros. – Apontou por cima do ombro, seus capangas juntavam-se a outros em duas mesas, participando de uma partida de pôquer.

Súbito, entra pelo ambiente um sujeito todo apavorado e esbaforido. As botas estavam enlameadas e o chapéu torto na cabeça. A camisa branca estava fora das calças, apresentando também marcas de sujeira e desleixo. Dois botões estavam abertos e o crucifixo, pendente de um cordão prateado, havia pulado para fora do peito. Na entrada do bar, encostados à parede, dois barris, um por cima do outro, chegaram a balançar com o impacto das portas que ele empurr ara com violência. – Xerife O’Brien! Xerife O’Brien! – clamou o homem agora ali, bem ao lado de Smith, com o chapéu nas mãos; a pequenez de sua estatura sobressaía-se, atraindo facilmente a atenção.

- Fala, homem! Aconteceu alguma coisa grave? – indagou o xerife. – A visão do mexicano causou uma espécie de comoção no baixote, por pouco não o fazendo perder a voz. Juan Carrilo seguia bebericando sua cerveja sem dar muita importância a ele. Lacaio em uma das diligências, atendeu de pronto a ordem de um cocheiro e pôs-se a galope em busca de comunicar o mais rápido possível o fato à lei. Enquanto desembuchava, olhava de vez em quando para o outro que passou a dar ouvidos à conversa. Os olhos do amedrontado vacilavam entre a contemplação da fisionomia austera de Carrilo e suas armas impiedosas. A uma pergunta de Smith, ele estremeceu.

Professor Edgard Santos
Enviado por Professor Edgard Santos em 10/02/2011
Código do texto: T2783073
Classificação de conteúdo: seguro