Tudo começou no hospital.
Naquela sala de espera, sua angústia aumentava cada segundo. Havia feito um barraco violento no intuito de conseguir presenciar o estado de sua mãe que há poucos instantes havia levado uma punhalada profunda em seu abdômen, por ter reagido a um assalto.
Em desespero, agachou-se no chão em frente ao banco da recepção do hospital, com os cotovelos apoiados no banco e com as mãos sobre o rosto, se pos a rezar em prantos.
Paulo assistia toda a cena com extrema serenidade. De repente, levantou-se discretamente e sentou-se ao lado da moça. Ao avistar o diretor do hospital que se aproximava, passou a mão sobre os cabelos dela e sussurrou em seu ouvido.
— Confirme tudo o que eu disser aqui.
Márcia levantou a cabeça e com os olhos já inchados de tanto chorar e se pos a olhá-lo com surpresa.
— Boa tarde Dr. Pedro, vim a sim que pude.
— Boa tarde Paulo. Que bom que você pode me atender, mas escuta. O que está acontecendo?
— Na verdade, ela é uma amiga que encontrei por coincidência aqui e que está tendo certa dificuldade em saber o estado de sua mãe que foi agredida por um marginal.
— E por que você não me avisou antes? Garota, por favor, me acompanhe até a minha sala.
— Paulo. Peço-lhe a gentileza de me aguardar mais uns instantes – Continuou o médico.
— Claro Doutor. Espero o tempo que for necessário.
Márcia enquanto acompanhava o médico, olhou para trás com um sorriso de gratidão. Paulo sentiu seu coração aquecer.
Minutos depois, Márcia passou pela recepção acompanhada de uma enfermeira e novamente sorriu para Paulo, gesticulando que queria falar com ele depois.
Em seguida, o Médico veio atender Paulo novamente. Em sua sala, Dr. Pedro não conteve as lágrimas ao relatar seu drama familiar. Seu filho, Agnaldo, já há algum tempo era usuário de drogas das mais variadas. A família interveio de todas as formas, mas não conseguiu ajudá-lo e Agnaldo a cada dia se superava através do crime para manter seu vício.
— Veja bem, eu quero que você o siga até saber quem é o traficante que está vendendo essas drogas para meu filho. E depois quero que você dê cabo desse indivíduo. Você é policial e com certeza não vai pegar nada para o seu lado.
Paulo retrucou imediatamente.
— Nada disso Doutor, meu serviço fora da polícia é apenas investigar, nunca matei ninguém como policial. Não seria agora como autônomo que faria.
— Qual é seu preço? Perguntou o Doutor.
— Não é questão de preço. É questão de ética, de dignidade de...
— Chega de blábláblá. Você fala isso porque não está em minha situação - Interrompeu o Médico.
— O que eu posso fazer é cumprir com o meu dever, ou seja, seguir seu filho e prender o traficante.
— Pra ele em breve estar solto de novo?
— É o que posso fazer.
— Então o faça e que seja logo – Ordenou o Médico.
Ao sair da sala do Dr. Pedro, Paulo deu de encontro com Márcia que estava bem próxima da porta, aguardando sua saída. Efusivamente, o abraçou ainda em prantos e disparou a agradecer a ajuda. Paulo perguntou como sua mãe estava e ela respondeu que estava fora de perigo.
Com Paulo em seus braços, Márcia sentiu-se no céu, tamanha a paz que ele lhe proporcionava. Sua voz e seu olhar também lhe faziam bem. Ele segurou a mão de Márcia e pediu para que ela tentasse manter a calma dali para frente e como estava com pressa, deu seu número de telefone para ela ligar e lhe por a par das novidades.
Paulo saiu do hospital obstinado em resolver aquela questão e nem era tanto pelo dinheiro, mas sim pelo fato de Dr. Pedro ter salvado a vida de seu colega de ronda que havia sido alvejado com um tiro à queima roupa.
Paulo estacionou discretamente seu carro, próximo à casa do Dr. Pedro e ali permaneceu atento até que pode avistar o carro de Agnaldo saindo da garagem. Dr. Pedro havia dado todas as informações acerca da rotina de Agnaldo e isso facilitava muito o seu trabalho. Paulo o seguiu até a entrada de uma favela e de dentro do carro pode ver quem atendia Agnaldo, sem nenhum cuidado. Como ele estava só, resolveu que iria vigiar Agnaldo mais alguns dias e aí sim viria com reforços e daria o flagrante.
Em direção a sua casa, não conseguia tirar da cabeça a imagem de Márcia, balançou bruscamente a cabeça afim de não se envolver com esses pensamentos, pois se conhecia bem e sabia que se desse corda a eles, em breve se perderia. Mas ao sentar-se no sofá e ligar a tv, seu celular tocou disparando seu coração.
— Paulo, minha mãe piorou – disse Márcia em prantos.
Rapidamente, Paulo apanhou a chave do carro enquanto a consolava.
— Calma Márcia! Estou indo ao seu encontro. Chego aí em dez minutos.
Realmente, o quadro clínico de Dona Alda havia se agravado. Paulo ouviu isso pessoalmente do Dr. Pedro, que passou a dar mais atenção ao caso da mãe de sua amiga.
Paulo que já era acostumado a presenciar o sofrimento alheio, sentiu que de repente uma revolta passou a dominá-lo naquele instante. A conversa que havia tido com Dr. Pedro, não lhe saía da mente e ele começou a perceber que seu tratamento com os marginais deveria mudar. Ele estava sendo muito correto e a justiça nunca era feita. Decidiu que iria a qualquer custo pegar o autor daquela punhalada e iria fazer justiça com as próprias mãos. Mas sua decisão sem que ele percebesse, tinha uma enorme influência de Márcia, pois naquela altura, já se sentia completamente envolvido por ela.
Dr. Pedro vendo o desespero de Márcia, diluiu um forte calmante em um copo de suco e pediu para que Paulo desse a Márcia. Ela nervosa bebeu sem perceber e em minutos apagou. Paulo a levou a um quarto e a colocou sobre uma maca. Depois foi até a recepção e através da ficha que a Márcia preencheu, pegou seu endereço e foi até lá para colher alguns depoimentos dos vizinhos.
Na rua onde Márcia morava, havia um boteco de esquina e Paulo resolveu tomar um refrigerante enquanto tentava descobrir algo sobre o crime. Para sua surpresa, estava sendo mais fácil do que ele imaginava. O Sr. Antônio, dono do bar, conhecia bem o indivíduo que cometeu a atrocidade e informou que aquele marginal costuma freqüentar o seu bar e que muitas vezes lhe causava problemas. Sr. Antônio até pensava em denunciá-lo, mas tinha medo de retaliação. Ficou combinado entre eles, que quando o marginal entrasse no bar, o Sr. Antônio daria um sinal e Paulo o prenderia, pois ele tinha além de o dono do bar, mais outras três testemunhas que também eram freqüentadores do bar e que presenciaram a tentativa de homicídio.
No fundo, Paulo achava que o marginal não voltaria àquele bairro, ainda mais naquele bar, pois seria muita petulância ou burrice, mas resolveu aguardar. Para uma sexta feira à tarde, o bar até que estava vazio e assim era melhor para agir. Ao anoitecer, surgiu de repente um indivíduo com um boné na cabeça, sem camisa e com os olhos vidrados. Paulo o conheceu de imediato e para seu espanto, o Sr. Antônio se sobressaltou indicando o rapaz. Era Agnaldo que ao perceber a emboscada, sacou de sua cintura um calibre 38, mas que não conseguiu se quer engatilhá-lo, pois Paulo com sua pistola semi-automática, o cravou de balas.
Seis meses se passaram. Dona Alda se recuperou e voltou a trabalhar. Dr. Pedro veio a falecer devido ao desgosto da perda do filho. Márcia casou-se com Paulo. E Paulo além de ótimo policial, ótimo marido e ótimo genro, tornou-se o pé de pato mais temido daquele bairro.