A Herança Maldita
Sentado num banco de praça, olhando o tempo, o movimento, a chuva que premeditava a cair. Nas mãos o tremor do Parkinson, que o dificulta a tomar seu refresco, a comer sua pipoca e também jogar algumas migalhas aos pombos, que povoam o parque.
A espera é causticante, o mesmo medo que outrora sentia no tempo de sua jovialidade o afugenta. Seu pensamento recorre às lembranças; o dia que ela nasceu e da noite em que ela aprendeu a abrir o seu primeiro cofre. Mas, o seu maior orgulho foi quando ela empunhou uma pistola neve milímetros e atirou certeiro para matar!
A sirene do banco suou alto, mais alto ainda berrou as sirenes das viaturas que passaram aceleradas, a fim de atender o chamado do banco. Ao longe ele ouviu a troca dos tiros, uma ambulância poucos minutos cortava os carros, alguém estava ferido. Ele sorri, com seus dentes amarelos, e novamente relembra quando eles juntos assaltaram o Glamoures Jóias. Uma das maiores joalherias do país.
A chuva caiu em ralos pingos. Os movimentos das pessoas eram em busca de abrigos para não se molharem. Ele levantou-se com a dificuldade de suas artroses, artrites, as mãos trêmulas empunhando uma bengala, as mesmas mãos, que anos atrás manusearam armas de alta precisão.
Seus passos são lentos, a ambulância passa por ele veloz levando um ferido. Outra vez o sorriso amarelado. Olha o relógio, o tempo, o movimento, respira fundo e vai para o apartamento deles. Ao chegar depara com as luzes apagadas, o vazio dos cômodos, o sopro do nada veio ao seu encontro. As horas passam e a solidão o perturba, o abraço do desespero lhe rouba a calma.
O seu telefone toca alguém do outro lado da linha pede para ele ligar o televisor nas noticias locais. Incrédulo ele liga, a certeza o faz desmoronar. A foto de sua filha estampada e o repórter a anunciar.
- Numa troca de tiros ferrenha, a ladra mais conhecida por Jade é morta!
Ele desliga o televisor levanta vai até seu cofre, combina a senha, e retira do seu interior uma pasta intitulada: TESTAMENTO. Em seguida a incinera. Vai para seu quarto, mas antes chora quando passa pelo quarto da filha...
Uma semana depois o corpo de bombeiros é chamado, para arrobarem o apartamento do senhor Jose, mais conhecido como Seu Zé, que era cuidado por uma enfermeira que mais parecia uma filha. Ele foi encontrado morto devido ao mau cheiro que exalava por todo andar. O corpo do Seu Zé foi enterrado ao lado de uma ladra chamada Jade.
Até hoje ninguém sabe o paradeiro da jovem Maria a enfermeira que cuidava dele...