Enquanto isso na Delegacia de Entre Rios...
Na Delegacia de Polícia de Entre Rios - no interior do oeste bravio - um inquérito está em andamento: Analinda x Delegado Ari Peixoto.
Fatos:
Analinda é cabeleireira. Atendia muitas clientes – mesmo porque era o único salão que tinha na cidade - fazendo cortes, penteados, unha da mão e do pé, depilação e as coisas que as clientes pediam. E conforme a necessidade da pessoa ela cobrava, por exemplo: se ia uma cliente cortar os cabelos bem curtos ela cobrava quatorze reais, se o corte era médio, oito reais estava bom e assim por diante. Analinda estava sendo acusada de enganar as clientes.
Testemunhos:
Dona Lídia da padaria:
- A Linda é uma cobra cascavel. Me enganou direitinho, desde que eu comecei a freqüentar o salão dela, ela me disse que era casada com um fazendeiro plantador de soja lá no Mato Grosso e que ficava por aqui porque tinha alergia ao pozinho da soja. Me disse que já tinha os filhos crescidos e encaminhados e aguardava sempre a visita dos netos. E não é que ela não era nem casada, nem nada? Eu me senti traída pela Analinda, porque eu confiei nela, e ela me contou toda essa história de um falso casamento. Eu quero que o senhor prenda ela, doutor. Para o bem de Entre Rios.
Dona Marinalva Soares ali da esquina:
- Olha doutor Ari, eu achava que a Analinda era uma pessoa, e ela é outra totalmente diferente. Ela me disse estava juntando dinheiro para pagar a faculdade de medicina para uma afilhada que tinha perdido os pais e que esta, “tinha até nome doutor: Sabrina, como nos livros de amor”, ficara sob os cuidados da Linda. Coitada, mal tinha para comer e ainda pagar a educação da menina. Todo santo dia eu fazia almoço para 7 pessoas, para mim, para o meu marido pros quatro filhos e para a Analinda, aquela ingrata, que eu soube ontem que é casada com um fazendeiro podre de rico lá do Mato Grosso. O senhor tem que fazer alguma coisa doutor porque ela não pode ficar solta por aí não, e eu quero que ela me pague todo esse tempo que eu dei de comer para ela.
Senhorita Mariazinha:
- Eu ainda estou tipo assim, assustada sei lá. Acho que a Analinda não podia tipo assim, ficar mentindo pros outros, sabe? Eu jurava que ela era tipo assim, virgem, sabe né, sem homem, tipo assim, solteirona pelo que ela me falava, entendeu? Eu acho que tipo assim, ela devia ir para o convento das freiras já que gosta tanto assim de igreja sabe? Tipo assim, se ela quer ser freira, devia ir pro convento como ela falava pra mim, tá ligado? Só que eu soube que ela teve uma filha tipo assim, de homem casado, e escondeu a mocinha de todo mundo porque parece que tipo assim, ela precisa de um médico porque me parece que eu ouvi a Lurdinha que disse que tipo assim, a filha dela e o homem casado que estava doente. Eu acho que o senhor faz o que quiser porque tipo assim, que culpa tem a filha?
Dona Lurdinha presidenta da feira de Hortifruti:
- Seu delegado do céu, o senhor tem que dar um jeito na Analinda porque ela me disse que tinha o segredo de plantar as sementes que não precisava de por o veneno para matar os bichinhos que estragam tudo. Ela estava quase me contando porque a horta dela – e o senhor bem sabe, porque o vi umas quantas vezes na horta dela – era a mais bonita da cidade. Como é que pode uma pessoa que passa o tempo todo no salão penteando as freguesas e consegue ter uma horta daquelas? Olha doutor, isso é muito estranho e eu quero que o senhor dê um jeito porque uma pessoa dessas não pode ficar a solta por aí. Já imaginou ela fugir?
E o inquérito prosseguiu:
Delegado Ari Peixoto: O que a senhora Dona Analinda tem a dizer ante tantos testemunhos?
Analinda: Não tenho a dizer nada.
D.A.P: Como nada? Eu vou prender a senhora agora mesmo.
Analinda: Sob qual acusação?
D.A.P.: Hummm, na verdade sob nenhuma, mas é que eu tenho que acalmar a turba enfurecida.
Analinda: Turba? Que turba? Aquelas fofoqueiras ali fora?
D.A.P.: Sim, eu não posso simplesmente ignorar tanto Boletim de Ocorrência.
Analinda: Sabe o que é delegado, elas fizeram tudo isso porque estou doente de doença transmissível e aí elas estão com medo e querem me mandar embora.
D.A.P.: Que doença seria essa Dona Analinda?
Analinda: Ah, os médicos não sabem dizer o que é. Não encontraram nada ainda, mas eu tenho uma doença horrível - cof cof cof – ai, me desculpe que cuspi na sua camisa seu delegado.
D.A.P: Virgem Maria! Faz o seguinte Dona Analinda, saia pelos fundos, ta aqui um dinheirinho para a senhora pegar um ônibus e ir lá para o Mato Grosso encontrar o seu suposto marido-amante. Eu digo para a turba enfurecida que prendi a senhora sob séria acusação de engano de clientela. Vá embora, vá.
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E tudo ficou bem de novo em Entre Rios.