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Lauro Winck

1,2,3, Gravando.

Tenho 29 anos. Sou enfermeira, mas trabalho a muitos anos numa funerária. Sou especialista em maquiagem. Meu nome? O que importa? Sabe? Deixar o defunto bonito. Às vezes dá trabalho. Tem gente muito feia! Tão feia que às vezes fico horas tentando inventar um jeito e tudo o que consigo é apenas torna-las menos feias. Mas, este vídeo não é pra isso. Você não vai querer ser maquiado por mim vai? Bem! Então não adianta fazer propaganda da minha maquiagem. Moro sozinha nesta casa fora da cidade. Herança de minha avó. Gosto de sossego, meus livros, meus gatos. Mas não foi sempre assim. Até já tive três maridos. Não tive sorte com homens, são todos iguais. Meu primeiro relacionamento começou como de hábito, um olhar, a aproximação e o despertar de uma paixão. Era tudo um mar de rosas, ele era carinhoso, educado, repetia toda hora que me amava e que eu era a mulher da vida dele. Isto antes do casamento sabe? Porque depois...

Passava a maior parte do tempo nos botecos com os amigos. Jogava as cuecas sujas pelo chão, não gostava de tomar banho, me maltratava e até me batia. Vivia de biscates, mas só trabalhava quando o dinheiro acabava. O dele, depois o meu. Então ele morreu. Eu fiz uma maquiagem especial, queria que ele ficasse parecido com um porco, que era. Ficou quase parecido, até enfiei umas bolinhas de vidro nas narinas pra ficar com nariz de porco. Eduardo era isso! Um porco! Sabe? Aquele cara do tipo que vai ao sabor do vento? Não planejava nada, se tinha serviço fazia se não tinha, não procurava. Na cama era um fracasso, estava sempre bêbado. Bem! Depois veio o Ernesto. Era empresário do ramo imobiliário. Só pensava em dinheiro. Tinha algum, mas era mão fechada. Pra arrancar uns trocos era como se estivéssemos tirando o fígado do avarento. Não deixava ligar o ar condicionado pra não gastar luz. Me pedia dinheiro emprestado, pra não gastar o dele. Só que não me pagava. Também era ruim de cama. Dava uma ligeirinha e se enfiava na banheira com um charuto fedorento e um copo de uísque vagabundo. Este eu também maquiei. Tive trabalho pra colocar umas guampas. Ele merecia. Pra ter as minhas coisas eu metia uns chifres nele. Tinha que ficar parecido com um boi chifrudo, mas depois ficou mais parecido com o diabo o que vinha a dar no mesmo.

Eu disse que todos os homens são iguais, mas toda regra tem exceção e então eu conheci o velho. Era um cavalheiro. Aos 60 anos, era forte e sabia tudo de sexo. Ele me arrancava 3 ou 4 orgasmos. Eu o conheci no clube dos coroas na cidade. Estava tomando uma cerveja e me convidou pra dançar. Era um verdadeiro pé de valsa. Era aposentado e parecia que minha vida tinha mudado. Me apaixonei pelo velho. Passei a viver momentos inesquecíveis. Ele ganhava bem e eu parei de trabalhar. Bem! Então um dia ele morreu. Morreu em cima de mim, bem naquela hora. Pelo menos morreu fazendo o que gostava e sabia. Este eu maquiei com capricho. Ele até ficou mais bonito, não que fosse feio. Os outros eu enterrei no porão. O velho está no meu quarto de pé, dentro de um esquife caprichado. Todos os dias eu converso horas com ele. Mas, agora as coisas se complicaram. A polícia anda xeretando. Passam lá fora, devagar com os olhos espichados pra cá. Não sei quem é você. Mas eu também já me maquiei, vou ser a primeira defunta a fazer a própria maquiagem. Já me vesti e vou deitar em um caixão especial. Aquele ali, todo branco. Já que não pude casar de branco, morro de branco. Tudo branco, a roupa os calçados, o caixão. Então vou tomar uma dose letal. Não vai doer. Eu vou sentir sono e depois... Bem! Depois eu não sei o que será. Este vídeo é uma confissão. Mas, não vou pra cadeia. Cansei de conviver com dois na consciência e um que não pode me ouvir e nem falar comigo. Ta certo. Como foi? Bem, o Eduardo estava tão bêbado que achou um gostinho especial na cachaça com cianureto. No Ernesto eu enfiei um prego bem no meio da cabeça enquanto ele dormia. Trabalho de profissional. Não aparece nada. O Eduardo deu trabalho. Vomitou os bofes antes de morrer. O velho, apenas caiu pro lado e morreu me deixando na mão e toda lambuzada. Você acha que eu fiz algo errado? Não sei! Bem tem um lado bom. O Eduardo finalmente deixou de beber e o Ernesto não terá mais que gastar seu precioso dinheiro. Bem! Existem pessoas como eu que não tem direito a felicidade. Quando finalmente parecia que eu teria uma vida legal ao lado de um homem bom e carinhoso, puf! Se foi. Ta certo! A diferença de idade era grande, mas pelo menos eu teria uns anos de felicidade. Aqui só aparece o carteiro, o entregador de gás e olhe lá que acho que é só. Xí! Me lembrei que tinha pedido o gás, então você tem chance de ser o entregador. Desculpe. Esqueci que ia morrer! Há! Olhe se a minha maquiagem está bem. Se precisar, tem uns apetrechos ali na penteadeira, por favor retoque. Você já chamou a polícia? Ou você é a polícia? Há! Ia esquecendo. Tem uma garrafa de vinho aberta e um cálice. Só tomei um copo, não quero chegar lá bêbada. Mas, cuidado o vinho está envenenado. Bem! Se você já bebeu, seja bem vindo. Bem, se você é o entregador... Você está ficando com sono? Se você ainda estiver aí e eu deitada no caixão branco, me vela, fica aí um pouco, só pra eu ter um velório. Só não acende vela. Não gosto do cheiro de vela queimando.