O garoto do morro. (drama)

Na rua ia se formando,

crescendo sem orientação sem educação,

muitas vezes a dormir nas calçadas,

nas ruas, estradas:

andou, andando:

sem carinho, amor,

sem nenhum valor.

Desde pequenino,

ainda menino.

Seus pais sem nenhum ensino,

que destino,

lá no morro viviam;

comida quase não existia

onde a água não ia,

tomavam banho de bacia,

buscavam água num balde na bica,

abaixo do morro perto da padaria,

de dona Chica.

O esgoto era uma valeta,

infesta,

corria a céu aberto,

era difícil ficar por perto,

de noite e de dia,

ali tudo fedia.

O menino todo dia saia,

para onde ninguém sabia,

muito menos o que fazia,

maltratado maltrapilho, mendigava,

pequenos furtos praticava,

para todos pedia.

Nem pra casa o menino ia.

só às vezes quando a saudade batia.

O pequeno não imaginava,

inocente nem ligava,

só não entendia,

por que ninguém o via,

nem mesmo lhe ouvia,

dele todo mundo se escondia;

mesmo assim o menino sempre sorria,

e de nada entendia.

Até parecia,

que esse mundo cão não o queria.

O menino foi crescendo,

e aos poucos entendendo,

com outros moleques vivendo,

e então foi acordando,

notando:

que o povo vivia separados,

os mais abastados lá do outro lado,

e os pobres coitados na periferia.

As diferenças os separavam,

é por isso que não o notavam

só os que o viam,

eram outros meninos que também na pobreza viviam.

Começaram a chamá-lo de sujo,

pobretão vagabundo que ele devia estar recluso,

preso enjaulado para não incomodar aquela gente,

que pareciam tão imponentes,

que se achavam tão importantes,

eles são tão inconstantes.

Esse menino é um abuso,

vive toda vida sujo,

chama a policia,

pra livrar a gente dessa cisca.

que vive na preguiça,

com certeza vive a roubar,

não tem lugar pra morar?

nem pais pra olhar?

Começou a ir mais longe,

as vezes se perdia,

não sabia mais voltar,

para o seu ponto de todo dia,

no lugar onde sempre pedia.

Os seus olhos tão perdidos,

com os novos sentidos,

já desenvolvidos,

começam a desejar,

outras coisas tramar.

Via outros garotos sempre bem vestidos,

com dinheiro no bolso.

Será que eles são os bons moços?

É por isso que nada tenho,

preciso de um grande empenho

para conseguir um café um almoço,

se eu peço às vezes me dão,

jogam um dinheirinho na minha mão.

Parecem que fazem isso com nojo,

Isso me deixa furioso,

O que será? Ele vivia a se perguntar.

A raras vezes que voltava para o seu barraco,

tinha de levar uns trocos, alguns pães dentro de um saco.

Falava com seus pais,

que não suportava mais,

a respeito do desrespeito,

por que todos os maltratavam,

todos os magoavam,

e ele nunca tinha nada,

uma vida tão malvada.

Sua mãe derramava lagrimas,

só choramingava:

é a pobreza que é culpada,

entre soluços chorava;

seu pai nada falava.

Nem sapatos nem tênis,

nem roupas tão bacanas,

muito menos grana,

nem casa bem grande,

pintada com jardim,

nada de bom eu tenho em fim,

só tinha aquela choupana,

para as vezes dormir,

naquela horrível cabana.

Andava descalço de chinelo maltrapilho,

sem estilo.

Dava uma revolta,

sentia e via tudo a sua volta.

Na mente iniciou uma reveria,

uma ira,

ele também queria,

jurou que também conseguia;

queria vingar,

começou de repente a pensar em roubar,

outra maneira não via.

Dinheiro, tênis roupas bonitas,

talvez convidar as moças que de vista conhecia,

passear com ele, ganhar um beijo da menina Anita,

era ela que às vezes lhe olhava,

lhe direcionava, ele a sentia

tinha por ela uma grande simpatia.

Com um lindo sorriso,

cabelos lindos lisos,

mostrando os brancos dos dentes;

achava a menina mais decente,

com um corpo envolvente,

que o deixa com o coração a disparar,

o sangue latejar.

As vezes chegava perto para sentir o perfume,

chegava a sentir ciúme,

dos outros rapazes,

que entre frases,

as vezes beijavam sua linda Anita;

que no coração ele guardava.

ele perseguia a sua imagem a adorava,

ele a queria,

a sentia aquela moça bonita.

Resolveu lá num beco se esconder,

sem ninguém perceber,

o primeiro assalto ele faria,

qual a vitima quem seria?

uma bolsa com sorte nela muito havia.

E assim fez com uma arma de brinquedo,

sem nenhum medo ele agia,

foi se dando bem,

ousava sempre mais, ir além,

e roubava assaltava toda noite todo dia,

muito dinheiro já conseguia,

comprava roupas sapatos, tênis, tudo que sonhava,

tinha bastante, pra rapaziada repartia.

Ele sempre fugia,

fazia que não os via,

os traficantes que o assediava;

na mente ele guardava,

imagens de outros amigos,

que tomavam por castigos,

surras até a morte,

ninguém tinha a sorte,

da absolvição,

cada erro era uma condenação.

com o trafico ele nada queria não.

Um presente para a Anita a menina que amava,

pelo menos era o que pensava.

No outro dia ia procurar para com a moça falar,

se apresentar tão bonito quantos os outros;

tinha certeza que ela ia dele gostar,

bem vestido igual todos outros garotos.

Em frente ao colégio lá estava,

com paciência esperava,

a garota que tanto pensava,

um beijo um abraço de Anita ele sonhava..

A campainha soara.

o momento que sonhara,

lá vinha ela garota charmosa,

cercada por todos linda mimosa.

Ele chegou de mansinho,

devagarzinho,

pedindo licença pra passar;

a ansiedade não deixava quase respirar,

com o coração disparado disse olá..

Anita.....

contigo eu quero conversar:

balbuciava, as palavras, engasgava,

parecia está no ar.

Ela olhou curiosa,

orgulhosa,

com jeito mimada, soltou uma gargalhada,

junto com a rapaziada:

você não é aquele, mendigo esfarrapado,

pedinte esfomeado,

que vive nos semáforos, pedindo esmola?

vê se te olha, qual é a tua?

que aprontasse,

essas roupas roubassem?

com certeza já matasse.

Você menino de rua?

falar comigo? sai pra lá seu pobretão;

contigo não, jamais some e nunca mais apareça,

apodreça, suma por esse mundo seu vagabundo.

Os outros guris os colegas, vendo isso,

entraram na conversa,

zombavam, sai dessa,

seu lixo,

se não vamos te surrar,

vamos te dar uma lição para que se coloque no seu lugar.

Falavam, gritavam

urravam,

ao mesmo tempo davam socos e conta pés,

o garoto sem poder ficar de pé,

sentiu tudo girar,

e veio a desmaiar.

Até que uma hora o soltaram,

quando pensavam que ele estava morto o largaram.

O menino desmaiado fora levado por uma ambulância,

todo quebrado machucado,

ficou dias internado.

Nos dias que ficou hospitalizado,

muita coisa tinha pensado;

uma dela era se vingar daquela cadela,

que o humilhara,

e os seus colegas que quase o matara.

Finalmente sai do hospital, um pouco fraco, abatido,

desnutrido.

Só havia uma intenção,

parecia não ter mais emoção,

só o sentimento do ódio no seu coração.

No outro dia já muito melhor,

ia acontecer o pior,

desceu indo para o caminho,

onde Anita sempre passava;

num lugar escondidinho,

esperava,

ia pega-la e levar Anita lá no morro onde morava

Conseguiu com a arma de brinquedo,

sem nenhum medo,

apontou para Anita:

agora não grita,

nem se agita,

se não te mato, e jogo-te no mato.

Anita apavorada treme, não consegue falar,

estava só naquele itinerário, foi pega de surpresa,

indefesa,

não tinha como escapar.

Ele a agarrara, com a arma empunhada.

Com a alma desfigurada,

mostrava a estrada para Anita seguir,

rumando para o morro sentiu vontade de rir,

quero ver agora se é tão valente,

longe daquela gente,

nada pode fazer.

Chegou ao barraco:

levou Anita logo pro seu quarto;

apavorada, calada.

Sozinhos sem os pais que saíram

ele a possuiria.

Agora eu vou ter,

não adianta tremer,

o que há muito tempo eu desejo,

a começar por um beijo,

e depois você vai me pertencer.

Mais ele não sabia que a policia há muito tempo o seguia,

queriam pega-lo no flagrante,

o marginal que andava aprontando bastante,

e agora finalmente, eles o tinham ao seu alcance.

O garoto que o mundo não queria.

que todos o repelia.

Batem na porta com força,

para salvar a pobre moça;

abram senão vamos arrombar,

não queremos atirar,

você está preso não adianta, não pode fugir.

não tem para onde ir.

A moça quase a desmaiar,

começou a chorar,

a gritar!

cuidado ele está armado ele quer me estuprar.

Ouvindo isso a policia não pode esperar,

sem hesitar,

com arma em punho a porta começou a arrombar,

vendo o guri com uma arma nas mãos,

com aquela situação.

Sem perguntar,

deram tiros, muitos tiros, direto para matar.

E o garoto rejeitado pela sociedade morre sem poder beijar,

sem experimentar, o sonho realizar, de fazer Anita com ele se deitar.

(É a sociedade com suas diferenças, com suas desigualdades sociais, e os preconceitos.)

(E o resultado é a violência.)

Cláudio Domingos Borges.

poeta cláudio
Enviado por poeta cláudio em 25/09/2009
Reeditado em 03/09/2013
Código do texto: T1830521
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