Dadeu e a “Operação Zona”
Da série - " O Delegado Dadeu "
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Dadeu trabalhava num clima , digamos confortável , satisfeito com sua situação em Nova Colônia, onde as ocorrências policiais além de escassas , se limitavam a brigas triviais, no máximo com lesões leves e, vez por outra algum caso de furto simples. Delitos graves não ocorriam e Dadeu orgulhava-se pelo transcurso de um ano inteiro sem nenhum homicídio no município.
Foi em meio à essa tranqüilidade que Dadeu recebeu um telefonema da Delegacia Regional de Passo Fundo, comunicando que o novo Delegado Regional estava convocando agentes de vários municípios vizinhos para servirem de “reforço” durante uma série de “Operações Especiais” que iriam ser implementadas. Tudo dentro daquela máxima de que “vassoura nova varre melhor”, que já vigorava naqueles idos tempos.
O novo Delegado Regional, conhecido como “Doutor Campos” era um sujeito pra lá de vaidoso, sempre trajado a rigor – terno preto - camisa branca e gravata borboleta; completava o figurino do personagem o cabelo “lambido” graças ao uso de uma “gomina” importada da Argentina e um bigode fino , estilo Clark Gable . Gozava , também , de uma fama de galanteador e mulherengo.
Disciplinado e extremamente responsável, Dadeu entregou o comando da Delegacia ao Inspetor Moreira – seu substituto eventual – preparou sua mala e viajou para Passo Fundo para se apresentar ao Delegado Regional.
Chegando lá encontrou diversos colegas, muitos dos quais não via há muito tempo e foram conversando , colocando em dia as novidades, enfim , estavam contentes com o encontro e , ao mesmo tempo apreensivos , pois não conheciam o perfil do novo Delegado Regional e, muito menos os planos do chefe, que não deveriam ser pequenos, afinal reunira um efetivo considerável para os padrões da época.
Todos estavam sentados na sala de reuniões da Delegacia Regional quando adentrou ao recinto a figura imponente do Doutor Campos, o qual depois de se apresentar e saudar os presentes foi fixando papéis num quadro e detalhando a “Operação Carne Seca” , que consistia – em síntese – em combater o contrabando de charque e couro, que estavam sendo introduzidos em grande quantidade por quadrilhas de argentinos e uruguaios, prejudicando pecuaristas de todo o estado do Rio Grande do Sul e do oeste de Santa Catarina.
Foram montadas diversas barreiras nas estradas que cortavam a região de Passo Fundo e divididos os efetivos em vários grupos, cabendo a Dadeu o comando de um deles. Todos os acessos ao município foram bloqueados e no final da operação houve a apreensão de diversas cargas de charque e couro, merecendo o fato destaque no noticiário da capital, inclusive, no “Correio do Povo”, jornal de maior circulação naquele tempo, que sublinhou a operação da Polícia e para delírio do Doutor Campos, rasgou elogios ao planejamento da mesma.
Os policiais voltaram para suas Delegacias com histórias para contar e com bastante orgulho pelo sucesso do trabalho que, enfim, havia merecido destaque e aplausos da comunidade. Mas todos levaram, também, uma impressão “duvidosa” do Delegado Campos, cuja vocação para os holofotes ficou muito evidenciada.
Alguns meses depois voltou a tocar o telefone da Delegacia de Nova Colônia. Era uma nova convocação . Mais uma vez Dadeu não tardou em repetir a mesma conduta da vez anterior, prontamente deslocando-se para Passo Fundo.
Desta feita, o Doutor Campos já conhecendo todos os policiais foi bem menos formal e logo anunciou os motivos dessa renovada convocação, dando detalhes do que seria a “Operação Zona”. Ponderou que o município estava registrando crescente utilização de “Lança-perfume” e que existiam evidências da introdução na região de uma nova droga chamada “maconha ou marijuana” e havia necessidade de combate-la dando “batidas” na zona do meretrício, onde segundo constava, se instalara o núcleo do tráfico.
Houve um clima de desconfiança generalizado entre todos os demais agentes, porque sabiam que aquilo não era verdade, mas ninguém se atreveu a duvidar das palavras do Delegado Regional, afinal ele poderia ter recebido informações ou ordens superiores.
Montadas as equipes todos saíram em direção aos diversos prostíbulos que existiam em Passo Fundo naquele tempo muito freqüentados por jovens e fazendeiros que iam para lá dançar , beber e, evidentemente, em busca de prazer sexual. Dadeu foi sorteado para acompanhar a equipe chefiada por Campos.
Chegando na casa denominada “Chalé Verde” , tida como a mais grã-fina de Passo Fundo, Campos foi logo apresentando credenciais – “Polícia !!” , fazendo com que todos os presentes fossem revistados , porém nada foi encontrado , produzindo-se em seguida numa debandada geral. Num instante a clientela sumiu e ficaram só as putas e os policiais.
Poucos minutos depois, o Doutor Campos estava sacudindo um copo de whisky importado, cortejando a dona da casa, uma mulher atraente , experiente e já acostumada com intervenções daquele tipo, ciente de que deveria “tratar bem” a seu convidado.
Dadeu , que guarnecia uma das portas do meretrício, ficou observando aquilo e quando o Doutor Campos pediu que fosse servida mais uma “dose dupla” , já segurando a mão da Dona, Dadeu não se conteve e determinou aos outros policiais que pegassem uma puta e bebessem o que desejassem , no que foi interpelado por Campos : - “Mas o que é isso Dadeu?!” , ao que ele respondeu : - “Terminou a operação Doutor Campos, pois se o senhor veio beber e namorar, todos bebem e namoram” !!