Dadeu prende o sobrinho
* Leia também "O Delegado Dadeu"
Os leitores que já foram apresentados ao nosso Delegado Dadeu conhecem a história sofrida que nasceu , aliás , nas dificuldades enfrentadas na família pobre. Eram imigrantes italianos que haviam sido assentados em verdadeiras grotas, cerros de pedra e mata, terras que não valiam nada e que o governo tinha dificuldade de desenvolver na primeira metade do século XX. Lá,na então “Colônia Vêneto”, nasceram todos os irmãos – dez homens e quatro mulheres.
Calixto, o mais moço, foi o que menos dificuldades encontrou na vida, sobretudo porque os pais já haviam criado os filhos mais velhos – e diga-se por justiça bem educados – de modo que até mesmo estes ajudaram para que nada faltasse aos mais novos . Calixto criou-se, pois, com facilidades e farturas incomuns e tornou-se um moço garboso e galanteador – um verdadeiro sedutor na roça.
Mesmo depois de casado, Calixto dava suas fugidas e foi numa dessas escapadas que acabou engravidando a empregada doméstica de uns ricaços da cidade, a qual ele havia conhecido quando ia fazer a entrega de leite. A pobre moça deu à luz a um menino e fugiu da cidade, ficando o rebento sendo criado pelos avós, já que a esposa de Calixto não aceitava o menino .
O pirralho foi crescendo e pareceu herdar os dons do pai, já que não demonstrava muito gosto pelo trabalho , porém dedicava-se de corpo e alma aos bailes e aos amores. Logo obteve o apelido de “Rastapé” , devido à fama obtida como dançarino nos bailões do interior e nos “fandangos” dos CTGs ( Centros de Tradição Gaúcha) .
Preocupado diante da mais absoluta ausência de perspectivas para o filho, Calixto enviou um fonograma ao irmão Dadeu, pois este havia comprado uma pequena chácara e estava à procura de um caseiro , de modo que implorada a “vaga” para o sobrinho .
Poucos dias depois à bordo de um DKW , largando uma nuvem de fumaça branca pela descarga, “Rastapé” desembarcou na chácara onde foi descarregado por Calixto que já estava sendo aguardado pelo Delegado Dadeu . Comeram um arroz com galinha acompanhado de polenta - salada de rúcula e vinho tinto da colônia.
Coversaram muito e antes do sol baixar Calixto despediu-se do filho, contente porque além de ter se livrado daquele peso, pensava que o “bambino” se ajustaria e seria temeroso diante do tio – policial já conhecido por suas façanhas.
Nas primeiras semanas, não obstante a escassa temporada no local , Rastapé já lograra explorar todos os recantos possíveis para uma farra , desde os “bolichos de campanha” até as “canchas” de bocha ou de pencas . Trabalho que é bom, muito pouco, mas Dadeu ia tolerando e “engolindo” aquilo em homenagem ao irmão e a seus pais.
Em certa ocasião um campo de propriedade vizinha foi assaltado e foram furtados um Rádio , algumas roupas e um revólver Smith calibre 38 , sendo que a Polícia Civil realizou diversas diligências mas não localizou nada – nenhuma pista – nem dos bens furtados e , muito menos do ladrão.
Algumas semanas depois desse acontecimento, quanto ninguém falava mais no assunto, Rastapé falou ao tio que desejava visitar a família, pois estava com saudades dos avós e de Calixto. O Delegado Dadeu não apenas concedeu-lhe a folga, como ofereceu um adiantamento para que ele viajasse com mais dinheiro e mesmo porquê , teria de viajar cinqüenta quilômetros até Passo Fundo, pois só lá existia linha de ônibus direto para “Colônia Vêneto”.
Rastapé chegou na rodoviária de Passo Fundo , comprou a passagem , carregou sua mochila e mala de garupa e foi para o box de embarque , nem imaginando a surpresa que estaria para ocorrer. Ao se aproximar do bagageiro para “despachar” a bagagem foi abordado por dois homens fortes e de óculos escuros que se identificaram como sendo da Polícia.
Rastapé logo invocou o nome do tio , aduzindo ser sobrinho do Delegado Dadeu da cidade vizinha . – “ Isso não nos interessa, disse um dos policiais” . Logo em seguida ouviu-se a voz do outro - “ Abre logo a bagagem que vamos fazer uma revista” .
Mudo, petrificado, Rastapé suava frio e ostentava uma cor vermelha no rosto branco, e na medida em que um dos policiais retirava da mala o revólver e o rádio furtados, o outro já lançava mão das algemas e dava voz de prisão a Rastapé . Na Delegacia, enquanto era lavrado o auto de prisão em flagrante, em outra sala e a portas fechadas era feita uma ligação telefônica pelo Delegado de Passo Fundo , com o seguinte teor : “Você estava certo Dadeu , sua intuição não o traiu , pegamos o elemento com a mão na massa” ...