Born Bad
Chovia. Maya transitava pelos cantos imundos daquela cidade escura. Trêmula, vazia, sua roupa vulgar era chamariz para o perigo – alimento de sua existência. Não porque fosse profissão sua, era gosto mesmo. Somente sentia-se viva se dos limites saboreava.
O carro parou. Ofereceu-lhe um passeio ungido a álcool. Fervilhando o espírito sangüíneo de Maya; Aceitou, lacrando a porta da caminhonete.
- Pra onde, gata?
- Não me chame assim!
- Uhull... Arisca! Gostei. Como devo chamá-la?
- Não bebi o suficiente para criar um “apelido carinhoso”.
- Vodka?
- Claro.
Vira a garrafa como se aguardasse que tal néctar atiçasse sua implosão interna. - Calma com isto, garota.
- Acelera! – Manda com seus olhos fumegantes.
Riu-se o tolo motorista, encantado com a beleza angelical escondendo algo tão sombrio e intenso.
- PÁRA!!! – Gritou Maya com seus pulmões.
- O que é que deu, garota?
- Achei um apelido.
- Ta doida, é?! Me parou pra isso? Quer nos matar?
Aproxima-se do ouvido da vítima, cochichando:
- Hera Venenosa.
- Como?! – num suspiro.
- Você pode chamar-me de Hera Venenosa. Dizem que tenho o beijo dela.
Caçadora como é, deliciou-se com os pêlos eriçados da presa. Olhos nos olhos, the driver pergunta:
- E como é o beijo desta tal Hera Venenosa?
Puxa o rosto e beija-o com o fervor peculiar da expectativa. Respondendo:
- Depois do doce, seu veneno mata.
Traz para o pescoço dele sua adaga preferida e aniquila-o, sentindo em prazer de quem por natureza nasceu má. Empurrando o corpo para fora do veículo, liga o radio que torna sua conquista perfeita, ao som de Born Bad. Cantarola: “(…) I guess I was born, naturally born bad (...)”.
Mais alguns metros, abandona o veículo.
Refugia-se na penumbra (seu verdadeiro lar). Voltando para a residência sua, aos poucos sai da indumentária idolatrada. Limpa seu pecado na pia de mármore. Deita-se na desmedida cama cor-de-rosa. E sente que sua insônia fora curada. Sabe ela que pela manhã Maya não mais existirá, retornando ser a doce Cecília, incapaz de ferir um inseto.