Os Ratos
Foi durante um trabalho de campo, numa fazenda no nordeste de Goiás, onde eu e dois colegas passamos a noite, depois de uma longa viagem a cavalo. O lugar era muito bonito.Tinha uma casa bem construída, cercada de árvores, mostrando um cenário muito agradável. Ao lado da casa, havia um pequeno curral, onde o dono, naquela hora, apartava os bezerros para na manhã seguinte tirar o leite. Quando nos viu, imediatamente, veio ao nosso encontro. Queria saber o porquê da nossa visita. Contamos que estávamos a trabalho e ele nos ofereceu hospedagem. Havia muito tempo que por ali não passava ninguém, disse. Entendemos isso, depois que ele começou a falar e não parou mais. Falou da família, contou estórias e fatos que por lá acontece-ram. Enquanto ele falava, armamos nossas redes de selva nos galhos de uma árvore em frente a sua casa, era ali que pretendiamos passar a noite.
Depois do jantar recolhemo-nos as nossas redes para dormir, na certeza de que teríamos uma noite tranqüila. Já passava da meia noite, quando, de repente, um trovão aterrorizante nos acordou e o ar encheu-se de um cheiro de terra molhada. Por entre as copas das arvores viam-se nuvens correndo levada por um vento enlouquecido. Não houve tempo para nada. Antes que desarmássemos as redes precipitou-se um aguaceiro que nos obrigou a correr e procurar abrigo na casa da fazenda. Com a água até os tornozelos e totalmente ensopados, batemos à porta da casa. Os trovões ribombavam por detrás das serras e o vento soprava cada vez mais forte.
O dono foi quem abriu a porta e ainda nos ajudou a improvisar umas camas na sala entre vários sacos de arroz e milho, sendo que um ou outro nos serviram de travesseiros.
A essa altura, estávamos tão fatigados que, imediatamente, deitamos e apagamos a luz. Lá fora havia poucas luzes, pois a chuva insistia, incrivelmente, forte, e a sala estava muito escura.
De repente, um estranho barulho se espalhou pela sala. Por alguns segundos, permanecemos imóveis, na expectativa de algo pavoroso. Em seguida, uma avalanche de seres estranhos invadiu nossas camas e pularam em cima de nós, sobressaltando-nos. Sem entender o que estava acontecendo, imediatamente, acendemos as lanternas, que tínhamos ao nosso lado para qualquer emergência, e então, vislumbramos apavorados, que uma infinidade de ratos, centenas e talvez milhares deles, assustadoramente grandes, subiam em nossas camas e em nós, num espetáculo medonho. Para nossa sorte, as luzes os incomodaram e antes que se passassem dez segundos, depois que as lanternas foram ligadas, uma massa escura, rapidamente, desapareceu por entre os sacos, deixando-nos, porém, aterrorizados e perplexos. Por um instante pensei até que estivesse sonhando.
Depois que os ratos desapareceram, mantivemos as lanternas ligadas por algum tempo. Um silêncio profundo tomou conta da sala. Ninguém falava nada, tamanho era nosso espanto.
Passado os primeiros efeitos do susto, apagamos as lanternas, não se ouvindo mais nada durante dois minutos, aproximadamente. Em seguida, eles voltaram com a mesma disposição que tinham quando da primeira vez que apareceram. E, novamente, fugiram com a luz das lanternas. Pareciam fantasmas, sumiam ao primeiro sinal de luz. Nunca vi coisa igual. Bastava apagar a luz eles voltavam e, desapareciam quando as lanternas eram acesas.
E assim ficamos até o nascer do sol, incapazes de dormir, tomado por um indizível medo, pois aqueles ratos nos obrigaram a atravessar a noite com o lampião a gás aceso, iluminando toda a sala, nos protegendo deles. Pela manhã, com um sol esplêndido que secou a estradas, pegamos os cavalos e caímos fora daquele lugar.