Black Pepeka

     Acordei assustado, o celular trepidando na mesinha de cabeceira. Era Madame Foyú pedindo, pelo amor de Deus, pra eu ir à delegacia: estava detida. Que será que ela aprontou? Tomei uma ducha, vesti-me em dois minutos e logo estava no local da ocorrência. A autoridade coatora me esperava:

     - Doutor, ela está detida por exploração da prostituição, reação à polícia e injúria racial.

     Dois dos ilícitos, sim, eu entenderia. Ela era desse meio, sim, de pavio curto, porém uma boa alma. Já a tinha defendido várias vezes, mas - é raro isso - detenção por injúria racial... No Brasil, injúria racial está atrelada, quase sempre, a ataques contra os negros... Madame Foyú é mulata, rainha de escola de samba, homenageada várias vezes... Como podia atacar, mesmo que verbalmente, os próprios irmãos de cor? Não fazia o menor sentido.

     - Como é, delegado? Injúria racial? Acho que não entendi...

     - Doutor, explico: estamos na Black Friday, época de liquidações no comércio. No início, era pra ser só um dia, a sexta-feira, depois virou Black Week, com o tempo já tem Black November e sei lá o que mais êvem por aí. Agora, até o tradicional cabaré de Madame Foyú entrou na onda. E olhe ali o slogan da campanha: Black Pepeka. Assim como existe Black Friday, Black November e tantas outras...

     - É verdade.

     - Ela quis inovar, foi denunciada, tive de prendê-la em flagrante. Jeitosa, tinha escolhido até uma música para a divulgar o evento. Ressuscitou um tema de novela da Globo: "Prima Compagnia", do cantor e compositor italiano, Sérgio Endrigo, lá do tempo da carochinha. Essa música, muito linda, aliás, mostra o contato de um jovem romântico com o mundo do sexo pago. Madame Foyú não é qualquer coisa, tem tino comercial, merece respeito.

     Tive muito trabalho para convencer o delegado a fixar fiança e deixá-la responder em liberdade. Black Pepeka... Publicitariamente pensando, não é má ideia!