As luzes acesas

A população da vila não era das maiores, e logo os moradores começaram a notar como as coisas haviam melhorado para Corban Adoyo, desde que ele fora admitido no fechado círculo de pessoas próximas à Elisheba Odondi. O problema é que Elisheba, uma forasteira que se tornara em poucos anos uma das mulheres mais poderosas da região, também era tida por muitos como uma bruxa, ligada a conhecimentos arcanos e proibidos; estes, sussurravam, eram a origem da sua fortuna. Corban negava terminantemente que houvesse algo de malévolo nas atividades de Elisheba, e sustentava que se tratava apenas da aplicação de técnicas de autoajuda, que estariam ao alcance de qualquer um.

- Então, porque ela não publica estas técnicas num livro? - Questionavam os céticos.

- Porque ela não faz caridade - replicava altivamente Corban. - Elisheba Odondi só disponibiliza o conhecimento para quem considera ser digno dele.

Coincidência ou não, todos do círculo íntimo da suposta bruxa eram pessoas influentes e afluentes da região. E estes pareciam prosperar muito mais depois de se aproximar dela.

- Dinheiro atrai dinheiro - filosofava Corban. - Os conselhos de Elisheba Odondi certamente ajudam a quem ela quer ajudar, a progredir nos negócios.

E o que ela recebia em troca, era a pergunta recorrente.

- Conhecimento - desconversava Corban. - Elisheba Odondi também é uma investidora, ganha muito dinheiro no mercado de ações. Estar próxima de pessoas bem relacionadas, faz com que ela possa aplicar com segurança e obter grandes rendimentos.

Com base no perfil dos seguidores de Elisheba, a informação de Corban era no mínimo equivocada. Não havia ninguém ali com perfil de agente do mercado financeiro, mesmo dentre os que possuíam capital sobrando para fazer esse tipo de aplicação. Cirurgião, juiz, militar de alta patente, fazendeiros, políticos, comerciantes... em comum, aparentemente só o fato de que todos exerciam algum poder sobre a população da vila. No caso de Corman Adoyo, ele era o dono do principal supermercado, e provavelmente o seguidor de Elisheba com menos posses.

Mas foi uma conversa despretensiosa ouvida num salão de beleza, que despertou a curiosidade de Abihail Aludhe, jornalista do único jornal da vila, o "Gazeti la Kijiji", para um aspecto comum que unia todos os seguidores de Elisheba Odondi:

- Eu faço faxina há muitos anos na casa da doutora Ashriel Lagum, de Apud Resa, e do vereador Lysanias Muga - comentou Kuria Oigo, uma diarista, com a cabeleireira que fazia tranças no cabelo dela. - E posso te dizer que alguma coisa mudou, depois que começaram a visitar a casa de Elisheba Odondi.

Neste ponto da conversa, Abihail, que aguardava sua vez de ser atendida e estava com uma revista aberta nas mãos, aguçou os ouvidos, enquanto fingia estar concentrada na leitura.

- Ouvi gente comentando que fazem rituais misteriosos... - disse a trancista.

- Não, nada de rituais - replicou Kuria. - Pelo menos, não nas casas desses três que citei, e não nos dias em que faço faxina lá.

- Então, o que mudou? - Questionou a trancista.

- As luzes - foi a resposta curta, elaborada em seguida. - Quando chega no final da tarde, antes mesmo do sol se pôr, todas as luzes nessas casas ficam acesas.

A trancista franziu a testa.

- Você quer dizer, as luzes nas varandas, salas...

- Todas as luzes - repetiu Kuria. - Mesmo naqueles lugares em que não tem ninguém. Ou mesmo se só tiver uma pessoa na casa inteira.

- Bem... eles têm dinheiro para pagar a conta e não se importam com desperdício - ponderou a trancista.

- Pode pensar o que quiser - redarguiu Kuria. - Mas essa mania só apareceu depois que viraram amigos de Elisheba Odondi.

A trancista deu de ombros.

- Bem... pelo menos estão com as luzes acesas; imagine se fosse o contrário, e estivessem apagando tudo ao anoitecer? Seria sinistro, não é?

A jornalista não soube explicar o porquê, mas naquele momento sentiu que havia sim, algo de sinistro naquele comportamento atípico.

- [Continua]