O MENINO DO CABELO ROXO

OBS: acabo de ver na rua -- nesta segunda-feira, 6/nov. -- menino branco de cabelos vermelhos, aliás, nem seria vermelho, mas aquela cor de batina dos cardeais -- algo próximo do roxo -- que nas mulheres tachamos de "ruivo". Ía seguido pelo pai, este já cum uns 45 anos e do tipo "quadrado", convencional, vivendo nos trilhos da Tradição. Calculei que o garoto de uns 8 anos seria o "temporão", o "caçula", "raspa de tacho" segundo o povão ! Imaginei o genitor chegando em casa de tardezinha e dando de encontro com um "capetinha", um "pica-pau", um cardeal, este raro passarinho de cabeça vermelha. Não, não é do seu tempo, leitor da "Era dos Games" ! Vamos ao conto, do qual não tenho o final ainda... talvez nem o termine ! (NATOAZEVEDO)

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O MENINO DO CABELO ROXO

O pai entra na cozinha e leva um baita susto:

-- "Quem é esse garoto aí, querida" ?!

A esposa "topa a brincadeira", também ela não gostou nem um pouco da "novidade", porém o petiz nascera num tempo em que os filhos decidem sozinhos o que querem e do que gostam. Quanta diferença da avó dele, sua mãe, comandada, vigiada, impedida, dominada, pressionada, dirigida a cada passo.

-- "Não sei não, entrou aqui em casa, acho que está perdido... se você concordar, podemos adotá-lo" !

-- "Huumm, não sei, não ! Com esse cabelo de maluco, o Rogério e a Suzana podem estranhar" !

O garoto percebeu que falavam dele, entrou na conversa e não deixou por menos, largando o celular por instantes:

-- "Esse cabelo é "da hora", senhores... sou o único na escola com essa cor, ninguém tem" !

-- "E vai ser por muito tempo, jovem, duvido que alguém mais queira imitá-lo" ! (E deu uma risota !)

-- "Aí é que o "tiozinho" se engana... o barbeiro disse que ficou legal e vai pôr a cor "em promoção", otários" !

Aquele "palavrão" desrespeitoso irritou o pai:

-- "Qual é o seu nome, mocinho ? Tens pai, tens mãe ? Moras aonde, por acaso" ?!

-- "LUÍS FELIPE, caso não saibam... e pais de verdade apoiam os filhos em tudo, TUDO mesmo ! Moro aqui no bairro, mas acho que não me querem em casa. Vou morar com o Huguinho, a mãe dele me trata COMO FILHO" !, e olha alternadamente para a mãe e o pai.

-- "Não com esse cabelo, "bêlo-bêlo"... (relembrando o pai propaganda de seus tempos de garoto, lá nos anos 70) quando ela vir, vai te pôr na rua a vassouradas, o Hugo pode querer te imitar" !

-- "Qual é o problema com vocês ?! Se as roupas podem ter várias cores e os batons também, porque não os cabelos ?! O tempo de dominação dos pais ficou lá atrás, não somos marionetes, somos gente como os adultos" !

A mãe enterneceu-se... Felipinho exercia sua liberdade com total plenitude, coisa que as gerações anteriores não tiveram chances de experimentar.

-- "Bom, vamos "adotá-lo", não precisas ir para a casa de ninguém... vou montar um barraco no quintal pra você ensaiar sua futura Banda rock "WOODY E SEUS BATUTAS" !, chisteia o pai com sorriso maroto.

(N.A. - às 16hs precisei sair... retomei o conto só às 21,30hs.)

O menino, ressabiado, sonda o pai com cuidado:

-- "Quem é "Woody" ? O que vem a ser esses... Batutas" ?!

-- "Woody é aquele pica-pau que vocês assistia quando bebê e batuta é todo sujeito bom no que faz, um bamba, um craque" !

-- "ROCK saiu de moda faz tempo, o som da galera é rap, funk e house" !

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Três ou 4 dias depois o pai leva susto maior ainda, ao encontrar o filhinho, agora na sala, a cabeça parecendo um arco-íris ou quadro do Andy Warhol.

-- "O que houve ? Te chamaram de comunista, te tacharam de lulista, de "verme do PT" ?!

-- "Nada disso... metade da escola 'tá de cabelo roxo agora, sou só mais 1 na multidão. Ninguém merece" !

-- "Resolvi homenagear a Kathy Perry, a Taylor Swift, que vai sair em "tournée" mundial. Cabelo EXCLUSIVO, ninguém tem... por enquanto" !

"NATO" AZEVEDO (em 6/nov. 2023, 22hs)