Como matar a escrita?
COMO MATEI A ESCRITA?-O CRIME||
Água-do-chefe sob a garrafa vermelha, duas laminas ao colo, cigarro aceso na ponta dos dedos da mão esquerda e um saco de ráfia com pedras pesando até 32.5Kg, enrolado a um fio de bronze amarrado ao pescoço de um homem careca, tudo indicando um atentado à vida. Sem medo, sem remorsos, somente ele.
Evaristo Jongola via-se sentado sobre a ponte que permite a travessia do rio "Milagre", ninguém por hora sabe dizer o por quê que assim é chamado, mas é qual o dito popular,"onde quer que encontreis uma lenda, se fordes bem ao fundo das coisas, encontrareis também uma história". Porém não era sua obrigação pensar na origem do nome, porquanto a falta de inspiração era tudo que lhe restava. Evaristo é decerto um escritor excepcional, só que há já alguns meses ou talvez anos que ele não vê frutos a nascerem da sua criatividade.
-VOU MORRER!...
Eram as únicas palavras que para ele faziam sentido na hora. Na garrafa vermelha de cachaça sobravam apenas três goles para dar fim a tudo, engolir o medo de ser um fracasso na história, o vento se encarregava de fumar o cigarro, transformando-o em cinza, que se espalhava pelo ar encobrindo o cheiro que das águas espargiam. O horizonte, -Ah!- o horizonte também tem voz, entoa directamente para os olhos, as pequenas janelas da mente,- talvez seja esse o motivo de o Poeta Elias ter dito uma vez"-Olhos dormentes fazem cérebros ainda mais dormentes". COMO MATAR A ESCRITA?!...
A visão do homem careca de barbas endireitadas à Fernando Pessoa, dirigia-se ao seu bloco de anotações pessoais, que na contracapa encontrava-se assinado com tinta a óleo:
-"MARAVILHA-TE__M.E"
As iniciais talvez tivessem um significado, não sei! Mais uns momentos e lagrimas caíam sobre a cabeça de Evaristo, uma delas escorreu da testa aos lábios, o homem pudia sentir o salgar na ponta da língua, acompanhado por braços que de maneira serpenteante envolveram o seu pescoço e uma voz feminina ecoou baixinho aos ouvidos do homem:
- CADA TEMPO É UM TEMPO[...]
Aos 11/01/2022