Um Sepulcro Redentor
Rochas partindo-se, céus colapsando, a Terra é o próprio declínio.
Um rapaz levanta-se atordoado, segue claudicante rumo à janela quebrada, aquele era o dia, sente na face o vento feroz e o calor dos asteroides, quando lembra da pobre colina. Em frente, a porta entreaberta se destrói num furor. As partículas incandescentes por pouco não lhe atingem direto nos olhos. Caído, perdura estático por alguns instantes, para então se levantar e progredir com os primeiros passos em direção à rua.
No lado de fora, em meio ao transtorno, alguém perde o controle e crava o carro no muro, o rapaz admirado observa perplexo, enquanto permanece caminhando, a passos lentos. Seguindo atônito, depara-se com um enorme barril, de onde se pode ouvir um gemido melancólico, antecedendo uma leve batida na lateral direita do objeto, enquanto na borda, um rosto pálido transparece tímido, em prantos, desesperado, com olhos clamando por ternura: é um menino abandonado! O rapaz, sem hesitar, agarra-lhe pelo braço, tirando-o do barril enferrujado, colocando-o em sua frente, sentado, de forma que pudesse reparar em cada detalhe de seu corpo, abalado pelo cataclismo. Infelizmente não há o que fazer, ajudá-lo é impossível; até que, por sorte ou por azar, o garoto fixa seu olhar espantado, e dispara a correr na direção oposta, abruptamente, como se o rapaz exibisse na face aspectos de um terrível predador, enquanto suas roupas tornavam-se trapos, e revelava mãos ensanguentadas, devido aos fragmentos de sua antiga porta.
Ao redor: paisagem tétrica, revelando ruas frias e molhadas, em parte destruídas, emanando uma singular sinfonia de horror, chamas e destroços, sob o triunfo de vermes e baratas, exaurindo a atmosfera de bueiros pútridos ao longo da caótica avenida. O rapaz persevera, caminhando e observando, quando, enfim, alcança a estrada que liga a cidade ao início do morro. A passos rápidos, pisoteia a relva, tropeça, suja os joelhos numa lama semilíquida, levanta-se, esfrega as palmas das mãos, aspira os químicos tóxicos do ar apocalíptico, enquanto o cansaço toma conta de seu corpo, as pernas doem, os olhos ardem sob tempestades solares. O local está próximo, clarões nas estradas abaixo indicam a queda de detritos cósmicos, erupções e abalos sísmicos. Em tal altitude, torna-se possível visualizar o mirante carbonizado, mas não importa. O rapaz radiante é capaz de sentir os gases vulcânicos, no momento em que os oceanos elevam-se, engolindo a vida terrestre: os seres afogam-se, lutam, mas não há escapatória. No pico, senta-se delicadamente, relaxando na fina garoa, uma garoa ácida, porém revigorante, quando se encontra livre para contemplar o horizonte e proclamar seu veredicto:
— Por fim, a humanidade está salva.