Um negócio de probabilidades

- Magia é sobre probabilidade - explicou Francesca Holland para Myles, diante de uma mesa onde o chá da tarde estava servido. - A probabilidade de algo acontecer, mais especificamente; você potencializa essa possibilidade, e a mágica acontece.

- Por exemplo, se eu quiser um dragão... - sugeriu Myles.

- Qual a probabilidade de um dragão que cospe fogo existir neste mundo? - Questionou Francesca. - Extremamente baixa, não é mesmo? Para chegar neste nível de improbabilidade, você precisaria dispor de recursos extremamente poderosos e afrontar umas tantas leis da biologia... e mesmo que os tivesse, a pergunta é: para quê?

- Foi só um exemplo - defendeu-se Myles, recolocando a xícara vazia no pires.

- Mas vamos dizer que você precise de algum dinheiro... - prosseguiu Francesca, enchendo novamente a xícara com chá. - A probabilidade de que consiga, é muito maior do que a de criar algo que não existe no mundo natural.

- Então, você poderia realmente quebrar a economia? - Provocou-a Myles.

- Não me tente - sorriu sardonicamente Francesca. - Eu diria que a possibilidade é maior do que a do dragão que você citou; afinal, ouro, platina e diamantes são coisas que existem aqui. Mas isso, atrairia todo tipo de atenção indesejada, inclusive de alguns antigos parceiros de negócios meus... estes, aliás, já andam bastante irritados com o meu uso daquele velho computador que você tão gentilmente está me ensinando a usar.

- "Ensinar a usar" é gentileza da sua parte; só mostrei como poderia potencializar os... recursos de que dispõe... usando a informática. Mas sobre o comércio que pretende abrir...

- O café - aparteou Francesca.

- Sim, o café. Acho a ideia muito boa, disse isso para Amelia-Rose. Mas qual seria o problema em usar, digamos, dinheiro?

Francesca franziu a testa.

- O que sugere? Que eu encontre dinheiro desaparecido? Criar dinheiro não seria muito inteligente, você sabe...

Myles titubeou.

- Confesso que não pensei em dinheiro desaparecido, embora deva haver muito por aí; principalmente de crimes não esclarecidos...

Tomou um gole de chá, antes de acrescentar:

- Mas também não acho que seria uma boa ideia começar um negócio com uma carga negativa tão grande sobre ele. Talvez seja melhor mesmo recorrer ao bilhete premiado...

- Acertar um prêmio médio na loteria é algo com que podemos trabalhar - ponderou Francesca, cortando uma fatia de bolo inglês e empurrando-a para Myles, que não se fez de rogado. - O dinheiro seria perfeitamente legal, e eu não precisaria forçar as probabilidades para encontrar um tesouro perdido.

Myles, de boca cheia, não respondeu de imediato.

- Mas, me diga... a senhora tem planos de expandir o negócio depois de abrir esse café? Mexer com as probabilidades e se tornar uma rede de costa a costa, por exemplo?

- Não! - Respondeu enfaticamente Francesca. - Nada de redes. Quero apenas um local que possa tocar sozinha e onde possa receber gente simpática; é mais um concentrador de energias positivas do que o primeiro passo rumo a um império comercial.

- Um concentrador de energias positivas - repetiu Myles, admirado. - E quem sabe, essas energias positivas não se espalham? É algo de que andamos urgentemente precisados, a senhora sabe...

Francesca fez um gesto de cabeça.

- Talvez seja exatamente isso o que eu esteja procurando, em última análise.

- [30-08-2022]