Tiririca do Brejo
Hoje, dia de São Sebastião, tive uma grata Felicidade rara. Saindo da Igreja, reencontrei um conhecido na rampa da paróquia de Nossa Senhora da Glória. Nunca havia mais me esquecido seu nome: Vitor. Semanas, meses, antes, já havíamos dividido uma marmita, eu lhe dizia e ele medizia as coisas da vida malvivida.
Voltamos a nos reencontrar, semanas, meses, depois. Quanto tempo tem? Não sei dizer, não Senhor (nos reverenciamos a Deus), lembrava-me de seu semblante, coisa rara, geralmente esqueço.
Hoje reencontramos, estava choroso, queria um banho. Falei-lhe que lhe levaria até a portaria do meu prédio, onde poderia se banhar e se livrar do anseio pelo asseio e por se ver livre. Viemos os três conversando e ele retrucava contra si ditos preconceitusos, vim lhe carregando as mágoas que ganhara em uma sacola de roupas usadas. Falei:
- O preconceito não pode partir de você. Ao próximo, a gente estende a mão; os outros, a gente deixa pra lá.
Ele concordou, mas voltou a repetir insultos preconceituosos contra sua cor. Tivemos que rir e seguir com a estratégia de fingir não ouvir. Chegamos, fui buscar toalha, sabonete e champu em casa, esperei do lado de fora, porque prometi a ele uma cascata. Acho que, dessa vez, ele acreditou e foi cumprir seu ritual.
Saído do banho, ele foi me reencontrar para que eu o levasse até o metrô. Prometi uma Coca Cola e retornei com mais uma garrafa d’água, para que não lhe chegasse a gota, a lágrima de seus olhos chorosos e emocionados, novamente . Ele me segredou uma confissão
- Sabe, meu filho, um dia eu já fui tiririca do brejo.
Pedi para que me explicasse melhor. Eu só entendia do Brejo, não entendo nada de Tiririca, nem quando minha mãe chegava tiririca da vida, do trabalho, sublinha essa metonímia, por favor, e ele repetiu:
- Já fui alguém na vida
Guardei-lhe um segredo, nunca passamos de brejo, Brejo das Almas, pobres almas brejeiras, contribuindo com a formação mútua. Eu sempre me emociono, mas é raro que chore. Queria realmente me confundir com você, meu Irmão, meu Próximo, e chorar mais vezes, todas as vezes em que me estender também a mão