O leitor
Avistei Frederic encostado numa árvore, braços cruzados, num canto deserto do parque; já eram quase 8 da noite, mas no verão acendiam a iluminação pública mais tarde. A luz do crepúsculo ainda era suficiente para que nossa presença ali não despertasse suspeitas, ou ao menos assim eu esperava.
- Fred - acenei, ao me aproximar.
Frederic olhou-me de cima a baixo, como a querer certificar-se de que era mesmo eu quem havia chegado.
- Você é pontual - replicou, descruzando vagarosamente os braços. Usava um abrigo militar, apesar da temperatura amena.
Parei diante dele.
- Você trouxe? - Indaguei.
Ele olhou ao redor cuidadosamente e depois fez um aceno afirmativo de cabeça.
- Claro.
Afastou a aba esquerda do abrigo e dali retirou um livro de bolso, gasto e amarelado. Dei uma rápida olhada na capa antes de escondê-lo dentro dum bolso interno do meu próprio casaco: era mesmo "A Vida de Dominik Panek", numa edição de antes da guerra.
- Quanto tempo posso ficar com ele? - Indaguei.
- Você me devolve aqui em cinco dias, mesma hora - replicou, olhando novamente para todos os lados. Deu um tapinha no meu ombro e comentou:
- Boa leitura!
Saiu a passo rápido por entre as árvores. Quanto a mim, voltei pelo mesmo caminho por onde viera, sem olhar para trás. Seria péssimo se a Polícia de Costumes me pegasse com um livro que não era meu; costumavam ser bastante duros contra aqueles que tentavam burlar o sistema.
- Como você acha que as editoras sobrevivem? - Certamente me perguntariam após confiscar o livro. - Pensa que ainda existem bibliotecas públicas, onde se pode ler de graça?
Não, elas não existiam mais; o que era uma pena...
- [22-07-2021]