A MENINA DO
DEDO ENSANGUENTADO
   É uma noite tempestuosa, de raios e trovões terríveis, e o menino Bernardo encontra-se tapado com a coberta da cama até o nariz para esconder-se da escuridão opressiva do quarto do segundo andar. De repente, dentro de sua cabeça, a invadir os seus pensamentos, surge uma voz sussurrante que lhe diz em tom profético:
   — Eu sou a menina do dedo ensanguentado, e estou na rua onde você mora!
   O garoto assustado joga o cobertor por cima da cabeça a tremer-se de medo. Está apavorado! Como os pais dele puderam deixá-lo em casa sozinho em uma noite como esta? “Eu quero a minha mãe”, geme baixinho.
   A voz misteriosa, então, passa do sussurro macabro para uma inflexão mais alta dentro da cabeça do garoto.
   — Eu sou a menina do dedo ensanguentado, e estou em frente à porta de sua casa!
   Bernardo pula da cama só em olhos esbugalhados de pavor. Está completamente enrolado no cobertor como se o mesmo tivesse força para expulsar o mal que se aproxima. Sente o coração acelerar. A voz invasiva, permeada de grunhidos pavorosos, não lhe dá trégua, intimando-o por telepatia:
   — Eu sou a menina do dedo ensanguentado, e estou dentro de casa, em frente à escada que leva para o segundo andar.
  O moleque quase desmaia. As pernas estão bambas. Flashes luminosos pipocam dentro da escuridão do quarto por causa dos relâmpagos jogados no mundo. A cena é assustadora. O ar começa a lhe faltar! Corre para o banheiro interno do cômodo, renunciando a proteção do cobertor.
   — Eu sou a menina do dedo ensanguentado, e estou em frente à porta do seu quarto! – Informa a voz voltando a sibilar pura maldade.
   O garoto inicia o choro, o coração dói descompassado dentro do peito, leva as unhas à boca e começa a roê-las em desespero. Crava os olhos na fechadura. Vira a chave interna para trancar-se. Ali dentro não tem janelas, não tem por onde fugir.
   — Eu sou a menina do dedo ensanguentado. ESTOU EM FRENTE À PORTA DO BANHEIRO!
  As pernas do moleque não aguentam e ele desaba quase desfalecido. A maçaneta começa a girar. O garoto angustiado berra e se arrasta para o box do chuveiro, fechando-se lá dentro. Inexplicavelmente, a chave cai, retinindo no piso. A porta do banheiro começa a ranger. Bernardo, sentado, recolhe as pernas abraçando os joelhos para junto do peito. Os olhos esbugalhados parecem querer fugir das órbitas ao acompanhar a porta se abrir lentamente, os dentes dele começam a bater, o corpo todo estremece, o coração acelerado lhe sufoca, “eu quero minha mãe”.
   Então, um dedo ensanguentado surge, de súbito, no vão da porta. “Arf, arf, arf”. A boca do garoto se escancara estupidificada de puro terror.
  De trás do dedo ensanguentado aparece uma menininha miúda muito fofa, com o rostinho mais alegre do planeta e endereça a Bernardo, quase morto de medo, um pedido em voz inocente e angelical:
   — Oi, menino. Você tem um Band-Aid para me emprestar!




Esta era uma história que meu tio contava para assustar as crianças em noites de trovoada, especialmente quando faltava energia.
Affonso Luiz Pereira
Enviado por Affonso Luiz Pereira em 31/12/2020
Reeditado em 02/01/2021
Código do texto: T7148349
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