300 - O Mundo Mínimo
Quando lavava a alface que havia posto no frigorífico na véspera, ela estava entre as folhas, enregelada, asas molhadas, quase sem se mexer. Era linda, raiada de amarelo, uma vespa adulta que visitava a horta quando a máquina ou a mão colheram a planta e a meteram no saco de papel transparente. Interesso-me sempre pelas vidas que posso melhorar e foi com cuidado extremo que procurei um lugar ao sol para recuperar o insecto. – Mas as vespas ferram, disse a Isilda. Deverias tê-la morto. Foi difícil explicar que, mesmo que possam picar, morder, envenenar, os animais têm direito à vida e ao seu habitat. Muitos, porém, partilham connosco o espaço e, quando nos incomodam, podemos mudar-lhes a casa. Fiz recentemente isso com Susana, uma aranha que, de ínfima e alegre, se tornou impressionante de patas e pelos. Presumo que tenha melhorado a capacidade de se alimentar no exterior da casa correndo, no entanto, alguns riscos. Há sempre pássaros que comem aranhas à sobremesa e osgas como a que vemos agora a cirandar tranquila nas paredes brancas da varanda. Muitas vezes somos nós os intrusos. Alguns animais invadiram as cidades durante o confinamento, algumas abelhas voltaram aos campos sem agro tóxicos, algumas perdizes que não conseguiram, porque sim, eliminar, voltam a repovoar com a sua espécie os campos. - Mas eu tenho medo de répteis! – Sim, se calhar eu também prefiro distanciar-me deles mas, repara, minha querida, que não precisamos conviver de perto com quem não nos faz companhia. Um dia li José Mauro de Vasconcelos e fiquei a gostar da Xititinha, uma lagartixa. Sabes quem mora dentro do muro partido que nunca quis arranjar? Não? A mais linda das lagartixas!