DAS PROFUNDEZAS DO MAR

Estávamos todos da Comunidade, e também as famílias dos membros da Comunidade, em um casarão que remetia a um hospital e ao mesmo tempo a um hospício dos séc. XVII/XVIII, todo pintado em branco e rosa, num tom que ficava entre o goiaba ou salmão.

Todos, inclusive homens, usavam roupas brancas iguais a vestidos longos, com uma pequena abertura na barra, nas laterais. Eu andava pelos corredores e as “salas” (era o que pareciam para mim) estavam cheias de gente, filas do lado de fora, as pessoas eram atendidas e saiam mais aliviadas por terem um caminho a seguir. Entre elas havia muitas crianças.

Continuei andando, até chegar ao que aparentava ser á frente do local, ao tempo em que era os fundos, também e desembocava numa praia. A areia vinha até o batente onde eu estava, o vento da maresia tocava meu corpo e eu me muito livre como quando estou na praia, num domingo de sol. Toquei minha cabeça e me senti imensamente bem, leve, porque meus cabelos haviam sido raspados. Não estava completamente careca, era como se tivesse cortado na máquina um, creio, porquanto eu ainda sentia os “toquinhos” de cabelo crescendo. Lembro de haver pensado algo a respeito.

______Preciso falar com o Sacerdote, quero e preciso raspar minha cabeça.

Percebia que os irmãos e irmãs da Comunidade estavam organizados em fileiras do lado de fora junto com os irmãos da Comunidade da Sacerdotisa Arasjus, ela em pé, com uma bacia entre as mãos, paramentada e cantando as Canções Sagradas do Curador, ao me ver sorriu e me chamou, pedindo que cantasse as Canções da Senhora do Mar.

Percebi que as ondas do mar se tornaram altas, de um azul muito claro e límpido, que dava para ver os peixes, as algas, tudo nitidamente, fiquei um pouco apreensiva.

______Sacerdotisa Arasjus, a maré está subindo, eu canto, mas preciso que vocês entrem, é perigoso.

Ela me olhou sorrindo.

______Quando você cantar, ela vai nos banhar mas não vai nos levar, nem machucar, só vai levar embora a má energia, vai nos descarregar.

Então me coloquei a frente de todos, de frente pro mar, andei um pouco, até a água molhar meus pés. Comecei a cantar, mas não era apenas uma Canção da Senhora do Mar, era dela e da Senhora do Fogo, juntas, falando das Profundezas do Mar.

Consegui me ver lá dentro, no fundo do mar, mas, na verdade eu permanecia na areia da praia. Os irmãos e irmãs ficaram de joelhos, saudando o mar. A Sacerdotisa Arasjus se juntou a mim, segurou minha mão e pediu para que eu cantasse mais e mais alto.

Assim o fiz.

Após todos terem sido banhados, entrei no mar.

Retornei.

GK Bagoé
Enviado por GK Bagoé em 14/10/2020
Código do texto: T7087474
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