290 - O Lançamento do Livro
Sempre fora exuberante. Nascia-lhe uma alegria tão viva que as mais das vezes ostentava o sorriso aberto, alheia ao que o tempo lhe fizera aos dentes, conformada com o pouco dinheiro de que dispunha para ir, vir e estar. Vestia coisas incríveis e sentia-se capaz de enfrentar os ditos menos simpáticos rindo da situação. Hoje está como uma parisiense do começo do século vinte, chapéu sobre o cabelo à garçonne, carmim forte na boca larga, vermelhão aceso nos malares. A saia curta não cobre o fim das meias pretas de malha aberta e os sapatos, de tacão médio, trazem laços de verniz. O todo é, como de costume, insólito mas Magda faz questão de ser o centro das atenções. Se está é porque um evento que lhe interessa vai ter lugar ali. Para chegar a tempo não jantou, para não borrar a boca recusa a comida apetitosa que circula nas bandejas dos empregados do Clube. E, por fim, chega o Poeta. Austero, rosto fechado, fato cinzento, lenço escuro a espreitar de uma camisa de seda branca. Há quem já tenha o livro na mão e quem já não terá lugar para se sentar. Chegou mais gente. A seguir a uns ruídos precursores e depois de três pancadinhas no microfone ouviu-se o Editor, a seguir o crítico literário convidado, o agradecimento formal do autor e, por fim, Gilberto, voz tonitruante, pausada, quente. Saíam-lhe enriquecidos os versos, mudava tudo para melhor na sua voz grossa. Quando já se formava, longa, a fila para os autógrafos e ainda o declamador guardava as folhas manuscritas, ela surgiu sob o foco, riso aberto, pulseiras chocalhantes e anunciou a leitura do poema da página trinta e dois, sem título. Só depois, talvez por causa da fraqueza, desmaiou.