A arte da sobrevivência

Ela não tinha a menor intenção de escolher um dos lados até ter certeza de quem iria ganhar.

- Entre o meu povo, sobreviver é uma arte - gabava-se aos que a questionavam.

- Não há muita dignidade em apenas sobreviver - respondiam-lhe por vezes.

- Os que pagaram pra ver, não deixaram descendentes - afirmava com convicção.

E assim transcorriam os dias, entre avanços e recuos táticos. Finalmente, um dos líderes das facções em luta requisitou uma audiência.

- Apreciaríamos que estivesse ao nosso lado - declarou sem rodeios. - Com o auxílio do seu povo, poderíamos sobrepujar nossos adversários rapidamente.

- Compreendo - replicou ela. - Mas a outra facção me fez exatamente a mesma proposta.

- E vocês recusaram? - Questionou o líder.

- Assim como estou recusando a sua - retrucou ela.

O líder retirou-se, pensativo.

No dia seguinte, para surpresa de todos, os beligerantes efetuaram um ataque conjunto contra os neutros. A maioria foi morta, mas muitos foram aprisionados como escravos.

- Parece que a neutralidade não é garantia de paz - advertiu o líder à chefe dos neutros quando ela foi trazida à sua presença.

- Paz, talvez não. Mas o que sempre procuramos garantir foi a nossa sobrevivência - replicou ela.

- Sobreviver a qualquer custo? - Minimizou o líder.

- Reinos caem e desaparecem - arguiu ela. - Mas povos sobrevivem.

E assim tem sido, desde que o mundo é mundo.

- [17-08-2020]