A Consulta
Aqui é estranho e diferente. Também eu por dentro sou assim, Igual na diferença estranha de qualquer pessoa neste mundo mundano adentrado aqui ou não. Insanidade sã e absoluta, rarefeita no ato atual da vida. Quem é este eu que vai e volta no absurdo momento imediato da privação intelectual deturpada por sei lá quem. O que é de mim? O que sou de mim, senão aquele outro alguém? Não sou de mim. Eu mesmo não sei o que saberia, sabendo que nada é o que vejo e sinto. As pessoas aqui não são as pessoas que acreditam ser. Ser de estar, estando elas em outras, mas não inteiramente. Na mente mental e mentirosa do outro, o outro que também não é, sendo nada, diferente e estranho na sua igualdade.
Acredito de não acreditar nesta ilusão, iludido estando no sentimento que não sinto e que não tenho. Tudo é, era, será e haverá de ser o que não foi. Tudo é questão de ter. Questão questionável, duvidosa na própria dúvida exata de cálculo incalculável. Eu, mais o que fui, dividido pelo que sou, menos o que serei, vezes o meu oposto. Uma hipotenusa sem catetos. Faz frio aqui. É gelado este caminho caminhado. Escuro de breu, mesmo no claro do dia. Não venho muito pro lado de cá. Vou mais é pra lá. Menos frio. Menos sombra. Sendo que todo lugar tem frieza sombria. Difícil esquentar sem aquecer, andar sem caminhar, rir sem sorrir, chorar sem lágrimas, dormir sem sonhar. Fome sem comer, sede sem água. Ando para aquecer minha risada de choro, sonho que não durmo, como sem sede. Ceder o cedido, algo sólido, palpável de tocar e ser tocado, tocante.
Quando é hoje? Ainda é ontem ou já é amanhã? Hoje não foi ontem? Aquele dia de noite eu não estava aqui. Em qual data então haveria de estar, estando eu longe de mim, não havendo cronologia horária que me situe no tempo localidade? Localizado apenas na consciência psicológica, inverossímil e ficcional de uma realidade irreal cujo personagem é um semblante figurado de uma caricatura rabiscada com mão que não é a mão que se escreve. Escrevente de palavras não falantes, caneta sem tinta, ação não verbalizada, coerência incoerente, pleonasmo metafórico.
Minha verdade não é verdadeira, um fato real não comprovado de comprovação, situação difusa, inerente na iminência do acaso, um caso casual de causalidade, ampliada na diminuição do agora, julgada por julgamento de júri jurado, confessos e confessados, o réu em processo de mudança, mudada em circunstância não autorizada, autoritária e revertida na reversão de pessoa diplomada. Cursado no decurso temporal e decorrente da lógica subjetiva do conceito conceitual, ministrado numa relação relativo analítica, tendo por base o embasamento formatado mediante corpo discente.
Corpo doente, cabeça demente. Dizem isso pra mim quando vou na consulta com eles. É, eles. Os que tratam daqui ó, da mente, mentalidade de pessoa pensante, pensada de coisas que nem sempre consigo lembrar que pensei. Quando foi a última? A última quando é? Não, não tem última. Ela não vem. Sempre dizem “até a próxima”. Quando é a próxima? É depois da que já passou eu acho. É quando tem remédio. Isso. Não. O remédio vem antes da consulta. É quando embaralha tudo, tipo confusão confusa, sono de não ficar acordado. Quando é o antes? Acho que vem depois que a noite clareia. Clara claridade que me faz falta. Faltando não estar tão só e sozinho, solidão solitária.
Estando assim, fico a conversar conversas que não se falam, explicar explicações em que nada é, apenas a fatalidade fatal de não ser, tendo deveras a exatidão inexata de coisa nenhuma, prorrogada sob um não viver de vida não vivida, levada de mim aos poucos, como um pingo que pinga de torneira pingante, caindo um após o outro, e se perde perdendo pelo ralo enferrujado de ferrugem corroída pelo tempo que deixei de contar.
Vem lá eles, levar outro eu de mim para mais uma consulta.