O que a chuva nos trás
A cor do céu recomendava calçar botinas. Vestiu a capa impermeável sobre o terno marrom, apanhou o guarda-chuvas, e saiu para a rua praticamente deserta naquele início de manhã. No caminho para o trabalho, encontrou Maude Walsh carregando uma cesta coberta por um pano no braço.
- Bom dia, Robert! - Saudou-o com um sorriso.
- Bom dia, Maude - e olhando para o céu cinzento:
- Já viu como amanheceu hoje?
- Está de dar medo. Vou entregar essas tortas no café e depois sigo direto para casa. Da última vez em que vi o céu escuro assim, choveram rãs.
- Rãs? - Repetiu Robert intrigado.
- Você ainda não havia vindo morar na cidade - explicou Maude. - No verão, há muitos anos, que temos todo tipo de chuva estranha por aqui.
- Rãs parece-me algo como uma praga bíblica - observou Robert, fascinado.
- Rãs miudinhas, - minimizou Maude - mas irritantes. Também já tivemos chuva de peixinhos, ninfeias e até mesmo lama negra. A cidade ficou imunda!
- Quando isso começou? E por quê? - Indagou Robert.
- Ninguém sabe - ponderou Maude. - Antes da cidade, aqui era um campo sagrado dos índios. Eles foram removidos para a reserva...
E, dando de ombros:
- Talvez tenha alguma coisa a ver. Se você acredita em maldições indígenas e coisas assim...
Um trovão distante reboou sobre a cidade.
- É melhor irmos andando. Um banho de lama negra não vai favorecer a nossa estética.
Robert tocou na aba do chapéu e despediu-se da jovem. Seguiram seu caminho em direções opostas, apertando o passo.
Do sul, carregado pelo vento, veio um cheiro de rosas recém-cortadas.
- [14-08-2020]