INSTRUMENTO DE DEUS

O bip do Dr.Santiago o despertou naquela madrugada fria. Urgência no hospital. Uma paciente sua, portadora de HIV, estava sofrendo de insuficiência respiratória. Antes, havia vomitado sangue. Em poucos minutos, o médico atravessava apressado os corredores do hospital.

- Como ela está?

Ele pergunta aos enfermeiros assim que entrou na UTI.

- Eu diria que nas mãos de Deus. Ela piorou muito, doutor. Santiago franziu a testa. Era cético. E em tantos anos de medicina nunca havia presenciado algum milagre, portanto, não tinha motivos para acreditar em intervenções divinas.

- Então, eu diria que nós somos deuses. E se ela se salvar, será por nossas mãos.

As horas passaram rapidamente para os médicos, lutando para salvar Ana, a paciente. Por um instante, ela abriu os olhos olhou para o vazio, sorriu e disse: "Oi, você". Em seguida, fechou os olhos. "Delírio", justificou o dr.Santiago. Aos poucos, o quadro se estabilizava. Ana ganharia, pelo menos, mais um dia de vida.

Instantes depois, o dr. Santiago saia da sala. Precisava descansar, tomar um café. Aproveitou para telefonar para a sua esposa e dizer que, em seguida, retornaria para o lar. Antes, daria uma última olhada em sua paciente. Ao entrar na UTI, um homem ao lado de Ana.

- Desculpe, senhor. Mas o hospital não permite visitas nesse setor. Peço que se retire.

O homem, que passava a mão suavemente pelos cabelos de Ana, virou-se para o médico e disse.

- Ela é minha esposa.

Santiago bebe um gole de café e se aproxima.

- Julguei que ela fosse divorciada. Sua filha não mencionou nada sobre o senhor.

O homem sorri.

- Não somos divorciados. Apenas estamos dando um tempo, eu diria. E como ela está?

- A paciente?

- Não. Ela vai se curar. Eu digo a minha filha...

- Bem, creio que esteja...olha, senhor. Não quero ser rude, mas as chances de sua esposa...

- Doutor, ela está nas mãos de Deus...

Santiago sorri, irônicamente.

- Que assim seja...mas, agora eu lhe peço que...

- Certo, eu vou me retirar.

Antes de sair, o homem beija a fronte de Ana e sussurra algo em seu ouvido. Para o médico as palavras haviam soado como "eu te perdôo", algo assim. Em seguida, o homem aperta a mão do dr.Santiago.E se retira.

Três dias depois, Ana abre os olhos e a primeira coisa que vê é o sorriso de sua filha, segurando um buquê de flores e, em seguida, caindo em seus braços.

- Mãe, os médicos ainda estão fazendo alguns exames, mas logo você vai poder ir para casa. É incrível, mas seus sintomas todos sumiram de uma hora para outra. Suas defesas estão normais, tudo está normal.

Ana abraça forte a filha e diz:

- Eu sei disso, minha querida. A doença se foi...

Dr.Santiago entra na sala, cumprimenta a paciente e pede um instante da atenção da filha dela.

- Peço que deixe sua mãe descansar um pouco e vá até a recepção assinar alguns papéis. Creio que ela deva ser liberada em breve...

A garota acompanha o médico, alegremente. Ver sua mãe curada lhe deu novo ânimo.

- Obrigada, doutor. O senhor é uma pessoa iluminada. Tenho certeza de que foi um instrumento de Deus...

- Hum. Bem, eu diria que foi somente após a visita de seu pai que ela teve essa recuperação...milagrosa.

A garota fica em silêncio por um instante.

- Como disse?

- Seu pai. Ele a visitou há cerca de uns três dias. Perguntou de você. Conversou com ela. A partir daí, sua mãe se recuperou...

- Doutor...meu pai morreu há dois anos...

Márcio Brasil
Enviado por Márcio Brasil em 20/10/2007
Reeditado em 20/10/2007
Código do texto: T702261
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