Um sonho de criança
Após uma cansativa tarde de escola
Reuníamos-nos para contar piadas, prosas e sonhos
Só de minha casa contavam-se cinco irmãos, eu o caçula.
Apesar de ser o menor da turma, e por isso sofrer preconceito,
insistia em estar com eles. Mandavam-me ir para casa com tapas na cabeça, mesmo assim eu relutava. Não, vou ficar!
Na minha ingenuidade contei a eles que havia pegado um inseto estranho e colocado dentro de um saco.
O Aldo arregalou os olhos e perguntou-me como o inseto se parecia.
Eu o descrevi minuciosamente, usando minha imaginação de criança.
De repente ele se aproximou de mim e disse que eu, com certeza, teria sido picado pelo inseto e que não cresceria mais. No outro dia eu estaria menor que um gato.
Tremeram as bases, comecei a me imaginar bem pequeno, uma coisa que não queria era parar de crescer.
Todos confirmaram o diagnóstico de Aldo - o que me deixou mais apavorado - e gritei. Sai correndo desbandeirado e agarrei-me na saia de minha mãe.
Outra vez eu comecei a ouvir estórias sobre tesouros, dinheiro, riqueza etc.
Quando Edson falou sobre o mal do avarento comecei a prestar bem atenção.
Ele falou sobre enterrar dinheiro, e que as almas dos avarentos roubam o dinheiro que é guardado no chão.
Sai de mansinho, pois eu havia enterrado meu cofrinho entre as bananeiras na frente da minha casa e fui lá pegá-lo antes que alguma alma avarenta o roubasse.
O mais engraçado foi quando eu contei um sonho que tive:
"sonhei que o mundo estava sendo dominado por um médico louco que seqüestrava as pessoas e depois os fazia desaparecer. Que ele tinha duas assistentes, uma loura e outra morena, e que seu laboratório ficava dentro de um matagal, na ribanceira de um hospital que dava num dique muito grande. Só que este laboratório tinha uma entrada secreta e que não seria possível alguém entrar sem saber a senha. A esta altura o mundo inteiro já estava dominado por este médico, e que somente algumas pessoas não sumiram por estarem trabalhando para ele, outros se encontravam paralisados nas ruas como uma estátua. Eu e meu irmão éramos os únicos que não tínhamos sido dominados por este médico, e quando algum assistente dele passava por nós, fingíamos que estávamos também paralisados. Depois resolvemos descobrir onde ficava seu laboratório, e conseguimos da seguinte forma: seguimos suas assistentes, a loura e a morena, elas entraram no matagal e foram em direção ao bambuzal. Em frente ao bambuzal falaram as palavras mágicas e entraram no laboratório, e nós sorrateiramente entramos logo depois - antes que a porta se fechasse. Lá ouvimos as conversas sobre seus planos e também vemos a injeção que ele dava nas pessoas para dominá-los. Tomamos coragem e o enfrentamos, conseguimos pegar a injeção e aplicar nele mesmo. O médico ficou paralisado, e de repente as pessoas no mundo começaram a aparecer, a se conhecerem, a perguntarem o que aconteceu e voltarem à vida normal. Neste sonho, eu e meu irmão nos tornamos heróis".
Para minha surpresa, e de todos que ouviram, meu irmão disse que ele teve este mesmo sonho, sem faltar qualquer detalhe. Até hoje, a mais de vinte e cinco anos, brincamos e falamos deste sonho - ele diz que eu roubei o sonho dele.