154 - Cento e Cinquenta e Quatro
Seguiu sempre a melodia. Era um som longo, doce, modelado. Seguiu por ser imperioso o chamado. Era como se fosse uma voz, um cantar triste, um arrastar de coisas num mundo submerso. Quando percebeu que só ele ouvia sentiu que andou tudo em solidão. Agora era tarde para voltar e a voz ainda a ouvia. Regressar nem sempre é a casa, pode ser chegar a outra porta do mesmo inferno, ao lado proibido do desenho, ao lugar sem sentido e sem vez onde todos os que não cabem ficam à espera sem saber de quê. E a melodia que só ele ouvia confundia-se com vontade, certeza, claridade, energia. Ia porque queria. Queria por ser por ali o roteiro dos que não esperam, dos que sabem que os lugares onde escreveram o seu nome são para quem não tem asas.