Aleph
Contam que o mendigo Iohanan, depois de anos esmolando sobre um velho baú, foi surpreendido por um passante que, severo e amável, exortou-o a parar com tão humilhante prática, já que mendigava possuindo incalculável fortuna. O incrédulo Iohanan mal continha as risadas quando perguntou sobre essas riquezas das quais não vira sequer a sombra em uma vida inteira de privação e miséria. “Estão bem aí”, apontou o passante para o baú, antes de se perder para sempre na multidão. Iohanan, ao abrir a arca, não encontrou moedas, diamantes ou pérolas; na floresta de mofo que se divulgava no fundo da enorme caixa, lá estava o que ele sempre soubera estar: a inevitável, silenciosa e corrosiva ausência, cuja sombra se espalhava muito mais longe do que o contínuo e inconfessado desejo de que alguém, um estranho, por exemplo, antes de se dissolver na multidão que o engendrou, apontasse para o baú e sugerisse que ainda havia uma esperança.
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[Este é o primeiro conto do livro "Histórias do Mendigo Iohanan", disponível integral e gratuitamente na plataforma de leitura Wattpad. Se você gostou, apareça por lá e visite meu perfil: RodrigoP36
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