Insanire (INSANIDADE)

- Tirem-me daqui seus filhos da puta! – Gritou Sueli, de quarenta e cinco anos, careca E magra de ver ossos e com olheiras profundas. Ela estava sozinha em uma sala, vestida com um macacão verde musgo e envolvida em uma camisa de força, Sueli era considerada louca. Viúva e mãe de quatro filhos viu o marido morrer de um ataque cardíaco enquanto discutia com um vizinho por causa de uma vidraça quebrada por um de seus filhos. O coração do marido, fraco, não aguentou e ele veio a falecer. A cena foi chocante demais, assistida pelo resto da vizinhança e comentada aos quatro ventos pelas almas desavisadas.

E assim começou o calvário de Sueli, tendo alucinações e conversando solitariamente com as paredes. Diversas foram às vezes em que um dos filhos entrava no quarto e pegava a mãe sentada na beirada da cama, de sorriso no rosto, penteando os cabelos, conversando com alguém que não estava lá. Ela não tinha essa coisa de mediunidade, ou se tinha esse poder, nunca tocará no assunto diante de amigos e familiares.

Meses foram passando e a situação foi só piorando. Sueli começou a ser vista vagando pelas ruas, vestida num pijama azul claro, toda urinada e melada em fezes, ela sorria quando via algum conhecido. Ela parecia não se importar com aquilo. Estava maltratada e judiada. Os filhos tentaram em diversas ocasiões leva-la ao hospital, a princípio para exames, depois para um tratamento psiquiátrico, porém, em todas as oportunidades ela recusava, afirmando estar bem de cabeça e de saúde.

No entanto todos sabiam que Sueli não estava bem. Que perambular por ruas escuras e perigosas, de pijama e suja com suas necessidades, não era normal; muito menos falar sozinha com as paredes em conversas que poderiam durar um dia inteiro, com direito a discussões acaloradas de uma só pessoa.

O jeito seria internar. Os filhos decidiram por um hospício no interior da cidade, localizada a pouco mais de cem quilômetros. Um lugar onde ela seria tratada, recuperada, e poderia voltar ao aconchego do lar, bem, de saúde restabelecida.Eles conversaram bastante buscando compreender as razões para essa mudança tão drástica no comportamento da mãe. Para alguns a morte do pai, tão repentinamente, somado ao stress do trabalho eram os fatores determinantes para tal distúrbio. Já outros garganteavam aos quatro ventos que o problema dela era percebido havia muito tempo, mas com a morte do marido o caso tornou-se de vez preocupante.

Estava chovendo e caindo raios quando a ambulância do hospício estacionou na porta da casa. Quatro homens fortes vestidos de branco desembarcaram do veículo, um deles carregava uma maleta de cor escura, os outros três eram os responsáveis pelo serviço sujo. Sueli almoçava ao lado dos quatro filhos quando a campainha tocou. Suas mãos começaram a tremer e uma fina gota de suor escorreu pelo seu rosto. Um dos filhos levantou-se e dirigiu-se a porta; foi nesse momento que Sueli começou a gritar e a atirar coisas nos homens de branco. Pratos, copos, tudo o que estava ao seu alcance era arremessado.

Depois de muito tempo Sueli foi vencida por uma agulha, uma injeção de calmante foi aplicada a duras penas por um dos enfermeiros. Em seguida ela foi colocada em uma maca, amarrada pelos pés e mãos. A vizinhança em peso assistiu de camarote aquele episódio deprimente, onde uma mulher indefesa, doente mentalmente seria jogada aos leões e provavelmente não voltaria mais para casa; e caso isso acontecesse, ela regressaria pior do que estava.

E não adiantou muito. Na clinica psiquiátrica Sueli tornou-se violenta, atacando e ferindo desde pacientes até funcionários, o jeito seria coloca-la em isolamento e deixa-la por lá até acalmar os nervos.

E assim foi feito. Num inicio de tarde, logo após as refeições, Sueli foi surpreendida pelas costas por um exército de enfermeiros, amarrada e amordaçada foi levada a uma sala minúscula, de paredes brancas e acolchoadas, com uma janelinha pequenina onde um mínimo sopro de esperança pudesse entrar ali. E ali ela permaneceu, metida numa camisa de força, sem querer se alimentar, triste pela vida perdida e magoada com os filhos.

Fernando F Camargo
Enviado por Fernando F Camargo em 03/05/2019
Código do texto: T6638297
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