O Homem Sesquicentenário
E ao entrar a cavalo na praça do mercado de Winnington, Shropshire, a caminho de Rhayader, Gales, Sewel Blenerhayset, um fidalgo de Winchester, percebeu que alguma festividade estava para ser realizada no vilarejo. Aproximou-se então de um dos carpinteiros que participavam da montagem de um palanque na praça, e inclinou-se na sela para indagar:
- Diga-me, meu bom homem: toda esta diligência é para comemorar o dia de São Swithun?
- De forma alguma, nobre fidalgo - retrucou o artífice. - São Swithun é homenageado na igreja; este palanque está sendo erguido para comemorar o aniversário do Velho Tom Parr. Ele está completando 150 verões este ano!
E só então Blenerhayset deu-se conta de que estava na terra do homem mais longevo da Inglaterra - quiçá, do mundo inteiro. Decidiu que valia a pena desviar-se um pouco do caminho e ir conhecê-lo pessoalmente; afinal, quanto tempo mais um homem de 150 anos pode ainda durar? Pediu informações de como fazer para chegar à fazenda do extraordinário ancião e para lá dirigiu-se à galope.
Blenerhayset encontrou o Velho Tom Parr sentado à porta de sua cabana, placidamente tomando sol com um cobertor sobre os joelhos, um gorro na cabeça. Ao ouvir o cavalo se aproximando, o sesquicentenário levou a mão em pala aos olhos, parecendo enxergar com grande dificuldade.
- Quem está aí? - Indagou com voz fraca.
Blenerhayset apeou do cavalo e fez uma vênia com o chapéu preto emplumado perante o fazendeiro.
- Sou Sewel Blenerhayset, um cavalheiro de Winchester - identificou-se. - É uma grande honra para mim estar diante do homem mais velho de toda a Inglaterra!
- Desculpe se não me ergo para retribuir a saudação, - lamentou o Velho Tom - mas minhas pernas andam bem fracas ultimamente.
- Longe disso! - Redarguiu Blenerhayset. - Fique à vontade que me sentarei ao seu lado para dois dedos de prosa...
- Em que lhe posso ser útil, cavalheiro? - Indagou o Velho Tom após Blenerhayset ter se aboletado na soleira da porta junto dele.
- Diga-me, Velho Tom... qual o segredo para uma vida tão longeva?
O sesquicentenário deu uma casquinada.
- Ah... é o que todos querem saber, não é mesmo? Como chegar à minha idade... acho que deveria mandar imprimir meus conselhos e entregar para cada um que me procura com esta mesma indagação. Mas, lá vai: mantenha a cabeça fria pela temperança e os pés quentes pelo exercício. Levante-se e durma cedo. Coma e beba frugalmente, principalmente leite e queijo.
- A parte sobre frugalidade talvez seja a mais difícil de seguir, particularmente para alguém que vive em Londres boa parte do tempo - admitiu Blenerhayset, pensativo.
- Então não corro perigo: jamais pus os meus pés em Londres - retrucou o Velho Tom.
- Melhor mesmo que não o faça - advertiu Blenerhayset. - É uma cidade pestilenta.
E erguendo-se para fazer outra vênia de despedida perante o ancião:
- Despeço-me desejando-lhe antecipadamente um feliz aniversário! Por mais 150 anos!
O Velho Tom apertou os olhos e cofiou a barba branca:
- Não pretendo despertar ciúmes em Matusalém, cavalheiro!
* * *
Pouco mais de dois anos depois, o Velho Tom Parr foi levado à Londres, como convidado do próprio rei, Charles I. Durante a visita, ele sentiu-se mal e morreu. Uns, culpam a comida suntuosa da corte pelo ocorrido; outros, o ambiente insalubre da capital do reino.
Se Charles I aprendeu algo sobre prolongamento da existência com o Velho Tom, jamais conseguiu colocar em prática: morreu decapitado, 14 anos depois deste primeiro e último encontro com seu súdito mais longevo.
- [10-01-2019]