CONTOS INSÓLITOS E DUVIDOSOS – III
Nini.
Esse misterioso e esquisito homem tinha o lábio leporino, uma fenda horrível e nojenta e era mais feio do que o corcunda (Quasímodo) de Notredame.
Segundo as pessoas mais antigas e em função das suas crendices, diziam também que ele era um horripilante lobisomem assustador.
Eu pessoalmente o vi várias vezes, ele era nojento e catingava mais do que um bode velho, tinha também as unhas das mãos compridas, curvadas e amarelas tipo garras e sujas.
Meu avô sempre nos alertava para que não ficássemos perto dele, dizia o meu pobre avô que ele era um homem “sem-vergonho”.
Mais tarde fomos descobrir que o que o meu avô queria dizer, era que ele era um veado, pois naquela época não se conhecia o termo “gay”.
E todos os homossexuais eram conhecidos assim, ou, com aqueles termos tipicamente açorianos, tais como, paneleiro, barro, invertido, frutinha, maricona, fresco e por aí vai.
Esse “homem” era simplesmente repugnante e por onde passava deixava um cheiro insuportável, eu não sei se era porque não se lavava ou ele fedia mesmo em vida.
Mas o fato é que mesmo com aquela catinga e o beiço rachado sempre revendo uma meleca, o suposto lobisomem mantinha uma irmandade de admiradores e amantes que, para mim, eram todos frescos, vadios, mariconas ou pertenciam a uma irmandade de um demônio gay, se é que isso existe.
À noite, eu e meu irmão e mais os meus primos, expiávamos o Nini para ver quando e como ele se transformava nesse cachorro peludo e feio conhecido como lobisomem.
Para o nosso espanto, ele aparecia na frente da casa e, por um passe de mágica demoníaca, desaparecia por encanto, para uivar logo em seguida em algum canto escuro e desabitado.
Nós morríamos de medo e só não corríamos porque estávamos todos juntos, e não queríamos demonstrar covardia.
Como éramos coroinhas da paróquia, rezávamos uma “Ave-Maria” com tanta devoção e pressa que, com o medo, comíamos a metade da reza.
Todas as sextas-feiras nós nos transformávamos em caçadores de lobisomem, mas mesmo com toda a nossa curiosidade, nunca tivemos a oportunidade de ver a transformação do homem, se era mesmo homem, em cão danado.
Durante o dia era ele que nos seguia, talvez com intenções pedófilas ou para nos amedrontar, pois devia saber que o seguíamos, mas à noite o turno era nosso, com a intenção de feri-lo para desencantá-lo.
As pessoas mais velhas sempre nos alertavam para que não continuássemos a busca pelo lobisomem, pois não sabíamos com quem estávamos nos metendo, e nos diziam com certa empáfia filosófica que, no mundo existem coisas que nunca iríamos compreender.
Quando morreu o suposto lobisomem, eu não me encontrava mais aqui em Imaruí, pois já era interno de um colégio na capital.
Mas dizem ainda algumas pessoas que, do caixão transpirava uma catinga de enxofre (ovo podre), e que quando o Padre aspergiu o caixão encomendando a alma desse demo, evaporava uma fumacinha do dito, os mais exagerados afirmam até hoje que ele muito uivou as sextas-feiras dentro da sepultura.
Acredite se quiser!