ENTREVISTAS NA LATERAL DO CAMPO
Jonas Gabriel foi sempre um grande artilheiro. Tão grande e vencedor que todas as declarações após um título não pareciam fazer sentido. Quando ganhou o campeonato carioca de futebol em 1980, disse para uma rádio:
- O dono da bola aqui se esforça em manter a atividade. Nem usa carro e se locomove de vespa. Recusei muita patifaria na vida... poderia ter aceito. Era só calcular o tamanho do favor e separar a gorjeta, porque toda cordialidade esconde o anseio torto do escanteio bem batido.
Ninguém entendia e apenas sentiam a força triunfante do futebol. No título brasileiro de 1983, Jonas Gabriel foi mais estranho em suas declarações:
- Fico feliz pelo título e pela torcida. Vencer é como descer uma avenida a noite dentro de um carro veloz. É bom, mas observe os faróis, teste a qualidade dos freios. O extraordinário pode fazer você acordar duas horas depois com uma dor de cabeça, por causa da pancada contra o volante, e uma sensação de lonjura.
No título da Libertadores da América de 1985, sua declaração foi mais incoerente querendo ser universal. Gritaram da arquibancada que Gabriel era vitorioso e ele pareceu não aceitar o apetite do povo:
- O termo vitorioso, aliás, nunca poderá ser aplicado. Não para o homem, esta espécie mais frágil. Em milhares de anos sobrevivemos graças a nossa grande capacidade de adaptação. Transmitimos um certo elemento químico, alguma molécula ou proteína chegou até aqui e funcionou hoje dentro do campo. Eu percebi por causa dela, a má formação da barreira e chutei de peito de pé, quase como se reproduzir de maneira sexuada... mas não me sinto vitorioso, ainda mais com o campeonato carioca iniciando na próxima semana.
Na conquista do mundial então Jonas Gabriel, antes da volta olímpica soltou:
- Em homenagem aos nossos torcedores eu posso dizer como tudo é complexo. Primeiro vem a soneira vegetal, depois o instinto animal, depois a inteligência humana, quando então entra a ação do craque com um chute de voleio. O nosso time mudou a cada jogo. Nada escapou do trabalho sério mantido nesta temporada.
Gabriel morreu em uma estrada federal de Minas Gerais em 10 de novembro último. Foi um acidente de carro. Tudo dentro da noite extraordinária.
Em sua lápide foi colocada a frase: “Um jogador deve se manter ativo, mesmo sem a bola do jogo. Como uma abelha”.
A frase da lápide veio de outra entrevista no meio do campeonato carioca do ano de 1986. Ninguém entendeu o porquê da frase. Gabriel afirmou ainda:
- Há nove mil anos o homem consome mel. Por isso os estádios de futebol são uma colmeia.
DO LIVRO:"TOUROS EM COPACABANA"