A BONECA DE VODU

Ela era linda, carismática, popular. Era a gata da academia. Os caras a achavam o máximo.

Eu a odiava com todas minhas forças.

Nunca na vida conversei com a cretina. Desde que pus os olhos nela na primeira vez que estive na academia eu pressenti que ali teria problemas. Não, eu não sou uma garota feia. Me acho bonita, até. Mas... Nossa, todos os caras davam em cima dela. Inclusive o carinha que eu era apaixonada. Me sentia uma ninguém perto da Larissa.

Larissa. Depois daquela festa eu decidi que iria matá-la.

Minha academia que tanto eu gostava de frequentar decidiu fazer uma festinha de confraternização. Me empolguei. Era a chance que eu teria de tentar ficar com o Rodrigo. Me arrumei toda, caprichei no batom, no cabelo, na saia. Meu reflexo no espelho dizia que eu estava muito bem. Acreditei que até poderia ser páreo pra Larissa e que o Rodrigo não resistiria ao meu charme.

Mas deu tudo errado. Primeiro porque a Larissa fez uma entrada triunfal no evento, mais linda do que nunca. Tenho certeza que todas as outras garotas ficaram com inveja. Elas disfarçaram. Eu não consegui. Segundo que a Larissa ficou justamente com o Rodrigo. Passaram a noite inteira se beijando. Pensei em encher a cara de trago, mas, definitivamente, aquela não era a solução. Eu precisava era tirar a Larissa da minha vida. Ela era minha tranca rua. Eu estava cansada de ver todo mundo paparicando-a como se Larissa fosse a estrela do universo. Saí decidida daquela festa.

Eu iria bolar um plano para acabar com a raça da Larissa.

*

Sempre gostei de ler sobre magia e encantos. Quando pequena, eu dizia para minhas amiguinhas que um dia encontraria o cálculo certo para fazer a fórmula do amor. Nunca tentei, é verdade, mas adorava meu lado místico. Como matar Larissa sem sujar minhas mãos?

Vodu.

Achei meio besta a princípio, porém comecei a ler com mais atenção sobre o assunto. Quando me convenci que podia dar certo comprei todo o material que precisava. Lã, tecido, algodão, cola, tesoura, glitter, agulha e linha. Quando tive tudo em minhas mãos tranquei-me no quarto para costurar a boneca de vodu. Levei três dias. Longos três dias. Durante este período eu assisti a Larissa desfilar pela academia jogando charme para o Rodrigo, mais bela do que nunca. Desconfiei que eles estavam até namorando. Isto acirrou mais ainda minha raiva e o desejo de vingança. Quando vi meu trabalho pronto até me surpreendi. Minha boneca de vodu era bem parecida com a Larissa. Dava até pena de ter que destruir ela todinha...

Meu projeto de acabar com a Larissa iniciou em uma segunda-feira. Pus a linda bonequinha de vodu dentro da bolsa e fui para a academia. Ela já estava lá com aquele corpo incrível treinando nos aparelhos de musculação. Não vi Rodrigo por perto. Mas não importava. A sessão tortura estava bem perto de começar.

Sentei no chão disfarçando que iria alongar. Abri a sacola, mas a boneca ficou dentro. Com uma agulha bem fininha nas mãos fechei os olhos disfarçadamente e fiz uma prece para que o feitiço desse certo. Lembrei de uma vez que ela passou por mim e me acertou a bolsa nas costas e sequer pediu desculpas. A visão de Larissa com Rodrigo na festa também acirrou meu ódio. E o sorriso arrogante dela foi o gatilho para que eu não hesitasse. Cravei a agulha bem no meio da barriga da boneca e retorci. Percebi a careta de Larissa no mesmo instante. Ela parou com o exercício bem no meio e respirou fundo. Ficou pálida. Depois de alguns segundos recomeçou o treino.

Não esperei muito mais. Cravei a agulha três vezes seguidas. Estocadas rápidas e certeiras. Escutei o gemido dela. Desta vez Larissa acusou mesmo o golpe. Um dos professores se aproximou, preocupado. Não escutei o que eles falavam, mas entendi que o cara recomendou que Larissa desse um tempo e descansasse.

Ela se levantou. Eu raspava devagar a agulha no estômago da boneca, sem cravar. Aquilo causou um desconforto em Larissa que pôs a mão na barriga sem entender nada. O professor – aquele idiota – colocou o braço sobre os ombros dela e começou a levá-la até um sofá um pouco mais adiante na recepção. Deixei a agulha de lado e puxei uma das pernas da boneca para trás. Naquele exato momento Larissa perdeu o equilíbrio e desabou no chão, sem que o professor tivesse tido tempo de segurá-la.

Ela gritou antes mesmo de cair estatelada no piso frio da academia e o berro de dor alertou praticamente todos que estavam lá dentro. Fiquei no mesmo lugar, sentada no colchonete, sem poder enxergar o que acontecia. Todos cercaram a princesinha, eu escutava os gemidos dela e ria por dentro. Me achei poderosa, invencível. Eu criara uma boneca de vodu e ali descarregara toda minha força e ódio. Larissa estava no chão, literalmente, graças a mim.

Só que eu ainda não havia acabado.

Levantei calmamente e me aproximei do círculo de pessoas. Por uma brecha visualizei a Larissa com a mão na boca ensanguentada. Escutei alguém dizer que ela havia quebrado um ou dois dentes. Todo mundo estava chocado. Menos eu. Imaginei o que o Rodrigo diria quando visse sua musa banguela. Quase dei uma gargalhada. Bem, para onde Larissa iria não precisaria de dentes.

Saí da academia e deixei todo aquele tumulto para trás. Caminhei alguns passos e vi que um caminhão grande se aproximava pesado pela rua. Tirei a boneca de dentro da bolsa. Quando ele passou por mim, potente e vigoroso, joguei a boneca nos pneus traseiros. Assisti o momento em que o caminhão esmagou a cabeça, espalhando uma nuvem de glitter vermelho pelo ar.

Foi meu momento de glória. Adeus, Larissa. Seu reinado agora é meu.

Maria Caterinna
Enviado por Maria Caterinna em 28/04/2018
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