A placa, sem aplacar...

Corria o ano de 1989 e o Navio-Escola Brasil elegeu Jacarta, capital da Indonésia, como um dos seus pontos de parada na viagem de circunavegação que faria, no processo de instrução dos nossos guardas-marinha. Lotado naquela Missão Diplomática, no cargo de Conselheiro, o Embaixador designou-me oficial de ligação responsável pelos inúmeros trâmites a serem efetuados, desde a comunicação oficial da viagem às autoridades locais aos preparativos para o abastecimento completo daquela embarcação, bom como disponibilização de serviços até mesmo para eventuais emergências.

O comandante do NEB detinha então o posto de Capitão-de-Mar-e-Guerra, último degrau para chegar ao Almirantado, correspondente, portanto ao cargo de Coronel, no Exército e na Aeronáutica, e então, para efeitos cerimoniais e protocolares, ao meu, no serviço diplomático, de Conselheiro. E assim, nivelados, nosso diálogo iniciou-se e seguiu em frente.

Tudo funcionou conforme as expectativas, até o baile que se promoveu no convés do navio, com convites a autoridades e representantes da sociedade local, além do corpo diplomático. Não chegava a ser uma efeméride, mas era um evento, afinal. Nosso Embaixador participou dessa recepção como convidado de honra, acompanhado de sua esposa.

No dia da partida, após uma permanência de uns 3 ou 4 dias, mui amistosamente, o comandante, convidou o casal ambassadorial e a mim e a Lina para tomarmos café da manhã em sua cabine de trabalho. Seu imediato, um Capital de Fragata, participaria também daquele ato de despedida.

Eu não podia nem ao menos imaginar o que iria acontecer dali pra frente: certamente cioso e observador da estrita hierarquia nas nossas Forças Armadas, o CMG, vendo em mim o seu direto interlocutor, e em semelhante patamar hierárquico, pouco antes de nos assentarmos à mesa para os deliciosos acepipes - o próprio Ministro da Marinha, então, havia cedido seu taifeiro-mor ao CMG para toda aquela viagem, como prêmio a ambos - apresentou-me uma caixa que solicitou abrisse na presença de Suas Excelências que continha, nada menos do que uma placa de metal com a imagem do navio em baixo-relevo e dizeres encomiásticos ao trabalho que "eu" lhe prestara. O mal estar foi instantâneo. E a ojeriza de Suas Excelências, por sinal gente até então afável, hospitaleira, instalou-se para durar à perpetuidade... Gol - contra - de placa…?

Paulo Miranda
Enviado por Paulo Miranda em 17/04/2018
Reeditado em 15/03/2022
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