A vara do Monsenhor
Se as moças admitiam alguma curiosidade, as senhoras então tinham era verdadeiro pavor àquela vara do Monsenhor...Como podia um homem já naquela provecta idade, e sobretudo um homem de Deus, dar-se àqueles gracejos, justamente no tão solene e pungente ato da confissão?
Muita senhora de família, de sólida formação moral e religiosa já pensara em falar com os maridos, filhos crescidos, ou parentes próximos sobre aquela cada vez mais incômoda situação. Mas temiam o pior, uma cena de sangue, uma morte, um rôgo de praga... E se praga de padre pega, a de Monsenhor então, qual Deus que a nega?
O eventual aparecimento de algum padre co-adjutor à cidade, principalmente nos períodos de mais intensa atividade religiosa, como a Páscoa, o Natal, e a Novena à Padroeira, além de lhes aliviar a consciência, soava como a oportunidade para um denúncia, uma exposição daquela severgonhice cada vez mais ameaçadora à integridade da própria Igreja e os seus tão necessários programas comunitários...sem falar, é claro, na manutenção da fé.
E as vindas do senhor Bispo, um prelado investido de visão e autoridade, eram tão espaçadas e breves, que já não se podia considerá-las para aquele alvitre...Demais, aproximação com Sua Eminência era no máximo para lhe oscular o anel. Ou o báculo...
Até o dia em que, para o espanto de toda a população, justamente numa Sexta-Feira da Paixão, sob o ar grave da marcha fúnebre, tão tocante e tão bem executada pela banda de música local, em meio à procissão, surgiu o Monsenhor, em completo despojamento de seus paramentos, ou de qualquer outra peça de roupa, que não fossem as meias roxas, de hirta vara à mão, sem molinete, linha ou anzol, a bradar:
- Seus bobocas, cabeças de minhoca, vou pro rio, só pra ouvir o pio da jeripoca...!
Já na celebração pascal, sob camisa de onze-varas, o Monsenhor recebeu a comunhão em seu leito, no quarto-forte do asilo, pensando e balbuciando aquilo...