ONZE E QUINZE EM COPACABANA

ONZE E QUINZE EM COPACABANA

Seriam exatamente onze horas e quinze minutos de mais um daqueles belos domingos de sol.

Seriam onze horas e quinze minutos...

Seriam...

Se houvesse um único e persistente relógio a impulsionar seus ponteiros. Ou se, pelo menos, houvesse, ainda, o próprio tempo. Seriam...

Uma hora e quinze minutos depois que a última coisa que compunha o Tudo, entregou-se, sem resistência, ao Nada.

Sem pânico, sem estrondos, sem gritos, sem correria; sem ranger de dentes.

Quem estava, esteve até não estar mais.

Jonas e Julieta amavam-se no terceiro andar, com paciência e suavidade, como faziam há muitos anos nas manhãs dominicais. Dois andares abaixo, Elisa entregava-se, despudorada, à volúpia de Romeu. Encontraram-se na noite anterior. Sequer sabiam o nome um do outro. Talvez não fosse, mesmo, necessário. Pareciam satisfeitos daquele jeito.

Tanto Jonas e Julieta quanto Elisa e Romeu poderiam observar, de suas janelas, o movimento costumeiro das primeiras horas da manhã. As prostitutas e travestis encerrando mais um expediente, os carros de um lado para o outro da Avenida Atlântica, as pessoas caminhando pelas calçadas ou nas areias, os banhistas ocupando a arrebentação. Mas, não... Entretinham-se na luxúria, ou, quem sabe, no amor.

Assim como os amantes, todos permaneceram alheios aos sincrônicos movimentos das coisas. Sem pânico, sem estrondos, sem gritos, sem correria; sem ranger de dentes.

Primeiro foram os artefatos humanos. Os prédios e monumentos. Silenciosa e ordeiramente submergiram na ausência total. Em seguida as ruas e avenidas, feito serpentes engolindo a si mesmas, desapareceram, num incrível bailado, deixando apenas o rastro do Nada.

Pelo roteiro estabelecido, depois das coisas foram os bichos e as gentes. Não nessa ordem. As pessoas foram antes. Não foram chamadas ou conduzidas. Apenas foram. De onde estavam e do jeito que estavam. Jonas, Julieta, Elisa e Romeu foram nus.

Após a transcendência do último cão, a natureza crua despediu-se de si. O vento parou. Matos, águas e montanhas se deixaram abduzir pela coisa alguma.

Seriam, mais ou menos, onze e quinze... Se houvesse um mísero relógio velho a empurrar seus ponteiros... Se ainda fosse possível medir o tempo. Mas não há tempo. Não há luz ou escuridão. Não há barulho. Não há silêncio. Não há cheiro nem cor e nem sabor. Só há Nada.

Tom Lira

Tom Lira
Enviado por Tom Lira em 23/02/2018
Código do texto: T6262146
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